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Vídeos que criam 'orgasmo mental' viram sensação na internet

Buscas no Youtube por vídeos do tipo mostram mais de 1,5 milhão de resultados - Thinkstock
Buscas no Youtube por vídeos do tipo mostram mais de 1,5 milhão de resultados Imagem: Thinkstock

16/12/2014 18h15

Vídeos que pretendem gerar uma sensação de formigamento em quem está assistindo, conhecidos como ASMR ou "orgasmo mental", silenciosamente se tornaram um fenômeno da internet.

Algumas pessoas, ainda crianças, experimentam uma sensação física agradável no couro cabeludo quando têm um interesse especial ou ficam fascinados por algo, ou quando estão sendo tocados ou acariciados de determinadas maneiras.

A sensação é compartilhada por muitas pessoas e têm um nome - ASMR. Além disso, há milhares de vídeos dedicados a provocar essa sensação.

Uma pesquisa pelas iniciais em buscas do Google resultam em 1,5 milhão de resultados. A maioria mostra o trabalho de "artistas de ASMR", fazendo vídeos em seus quartos, jardins e cozinhas. E alguns deles são incrivelmente populares.

À primeira vista, é difícil perceber o motivo. Por que alguém assistiris a 18 minutos de uma mulher demonstrando formas de dobrar toalhas e guardanapos? No entanto, em dois anos, este vídeo teve 770 mil visualizações.

Há vídeos de ASMR que mostram mãos de mulheres com unhas feitas batucando em uma superfício de plástico, ou de alguém tocando embalagens de plástico, pessoas recebendo massagens, ou sussurando para as câmeras. Há pessoas que fingem ser médicos fazendo um exame do nervo do crânio, outras fingem cortar cabelos, fazer uma entrevista de emprego ou ser recepcionista de hotel no check-in (este vídeo dura 41 minutos e teve 460 mil vizualizações).

O termo de pesquisa ASMR também traz vídeos de séries de televisão americanas dos anos 1980 em que o artista Bob Ross ensina ao espectador como pintar, correndo o pincel sobre a tela enquanto explica calmamente o que está fazendo, com sua voz tranquila e aveludada.

O que todos esses vídeos têm em comum é que assisti-los desencadeia - em algumas pessoas, pelo menos - uma sensação especial em seu couro cabeludo, melhor descrito como um zumbido ou formigamento. É uma sensação relaxante e extremamente agradável.

Sussurros gentis

As iniciais em inglês significam Resposta Meridional Sensorial Autônoma. Soa como um termo científico, embora não haja nenhuma ciência por trás disso e não esteja claro quem inventou a denominação. Parece com os arrepios ou o frio na barriga que algumas pessoas sentem ao ouvir certos tipos de música, mas as causas e a sensação são diferentes.

A decana dos videomakers desse tipo de trabalho é, sem dúvida, uma mulher loira com um sotaque do leste europeu que se identifica como Maria GentleWhispering.

Emma experimentou a sensação de formigamento em diferentes situações - BBC - BBC
Emma experimentou a sensação de formigamento em diferentes situações
Imagem: BBC

Seu vídeo "Oh such a good 3D-sound ASMR video", que dura 16 minutos e apresenta vários efeitos sonoros diferentes, concebidos para desencadear a resposta, é o mais popular na rede, com 7,6 milhões de visualizações em pouco mais de dois anos, apesar de sua baixa qualidade de som.

Não está claro onde ela mora, embora seja provável que seja nos EUA, onde há uma subcultura florescente de ASMR.

No Reino Unido, outra estrela do ASMR, Emma, que se autodenomina WhispersRed ASMR no YouTube, tem mais de 40 mil assinantes.

Ela vive no entorno de Londres, onde faz vídeos em uma pequena casinha no final de seu jardim. Neles, ela fala para a câmera devagar e hipnoticamente, com uma voz muito suave, enquanto faz sons suaves com utensílios que incluem até livros de velcro, ou fingindo limpar os ouvidos do espectador.

A qualidade do som de seu vídeo é muito melhor do que a de Maria GentleWhispering, especialmente se você ouvir com fones de ouvido. Emma usa microfones binaurais, que gravam da perspectiva do ouvido de uma pessoa, e dão ao ouvinte uma experiência especialmente envolvente.

Ela sentiu pela primeira vez a sensação (que ela chama de "enrugamento na cabeça") quando era criança, e lista as situações: "Um teste de visão, um corte de cabelo ... na escola quando a professora lia uma história ou escrevia no quadro negro... quando uma das outras crianças lia uma história... fazendo nosso planejamento, ficar ao lado da professora quando ela estava olhando meu trabalho ... crianças brincando com o meu cabelo."

"Nós sentávamos em círculo, brincávamos com o cabelo do outro e fazíamos cosquinha nas costas uns dos outros - todos aquelas coisas boas coisas que costumamos fazer quandos somos crianças desencadeavam minha ASMR."

Ela começou a assistir a vídeos quando estava tendo problemas para dormir e procurava algo no YouTube para ajudá-la a se acalmar. Descobriu o que chama de "comunidade ASMR", entrou em um grupo online chamado ASMR Reino Unido e começou a fazer vídeos de si mesma para que os outros membros do grupo soubessem quem ela era.

Seu público-alvo são adultos, mas ela recentemente começou a fazer vídeos especificamente destinados às crianças, em resposta a pedidos dos telespectadores. Seus vídeos, como os de muitos outros profissionais, veiculam publicidade que gera uma renda modesta.Laura Stone também começou a assistir vídeos quando ela estava tendo problemas para dormir. Ela tinha pesadelos e ataques de pânico após uma morte na família. Para ela, assistir vídeos também gerou interesse em fazê-los. "Eu queria ajudar as pessoas como elas me ajudaram", diz ela.

Elas faz seus vídeos - às vezes, três por dia- em sua casa em Essex. A sala da frente está cheio de adereços que ela planeja usar - uma boneca com cabelo comprido, uma peruca loira, algumas joias ruidosas, um coçador de costas e uma folha de papel de embrulho. A maioria de seus vídeos envolvem "role-plays", com ela e seu namorado engajados em um 'faz de conta'.

O feedback, diz ela, tem sido muito positivo. "As pessoas dizem que eu as ajudo a dormir. Pessoas solitárias, que não têm muitos amigos ou não saem, sentem que eu sou sua amiga."

Laura admite a possibilidade de ser viciada nos vídeos, mas diz que usar remédios seria pior - BBC - BBC
Laura admite a possibilidade de ser viciada nos vídeos, mas diz que usar remédios seria pior
Imagem: BBC

E ela ainda acha útil assistir a vídeos de outras pessoas: "O sono é 100% melhor quando eu assisto a vídeos; se eu não assistir a um vídeo não durmo bem."


É um vício então? Ela admite esta possibilidade. "Sou um pouco viciada, mas é um bom vício, um vício saudável, há muitos piores. Definitivamente me acalma. Se estou sofrendo um ataque de pânico, sei que em cinco minutos assistindo a um vídeo todos os sintomas de ansiedade desaparecem e em 10 minutos estou mais calma." E assistir a vídeos, diz ela, é preferível a usar medicação.

O mecanismo

Isso preocupa Frances McGlone, professor de neurociência da Universidade John Moores, de Liverpool.

Ele diz que não é possível explicar o mecanismo que produz a reação física que dá origem aos estímulos porque ninguém tem pesquisado a questão. "Em uma olhada rápida nos buscadores mais respeitados para pesquisas científicas publicadas, eu não consegui encontrar nada que explicasse, com uma base neurobiológica, por que essas experiências sensoriais são provocadas pela observação desses vídeos ASMR", diz.

Mas ele é profundamente cético em relação a seu uso como uma espécie de terapia alternativa caseira: "O que me preocupa é ter indivíduos suscetíveis que querem acreditar nesse tipo de coisa, porque eles realmente têm problemas e precisam de algum tipo de ajuda psicológica - que é onde eu fico um pouco irritado, porque as pessoas podem se submeter a técnicas que não oferecem qualquer benefício a longo prazo para uma condição subjacente."

Ele também aponta que a maioria destes vídeos são apresentados por mulheres atraentes, o que significa que pode haver um elemento erótico em seu apelo. E, de fato, alguns têm tentado promover o termo "braingasm" - mistura de brain, cérebro em inglês, com orgasmo - como um nome alternativo para ASMR.

Muitos dizem, no entanto, que a sensação não se parece com a do sexo. Por enquanto, o ASMR segue sendo um mistério.