OnlyFans: adolescentes vendem vídeos íntimos em rede que permite comércio de 'nudes'
Apesar do sucesso, o site de conteúdo adulto tem problemas em seus mecanismos de controle para impedir que menores de idade compartilhem vídeos e fotos explícitos na plataforma, conforme constatou a BBC.
Aviso: esta reportagem contém temas adultos.
O site adulto OnlyFans não tem controles eficazes para evitar que menores apareçam em vídeos explícitos, de acordo com uma investigação da BBC.
Os adolescentes têm usado identidades falsas para configurar suas contas. A polícia britânica até detectou o caso de uma menina de 14 anos que usou o passaporte da avó para isso.
Uma autoridade da unidade de proteção à criança do Reino Unido disse que menores estão sendo "explorados" por meio da plataforma.
O OnlyFans afirma que seus sistemas de verificação de idade são melhores do que os exigidos por lei.
A plataforma conta com mais de um milhão de "criadores" que compartilham vídeos, fotos e mensagens diretamente com os assinantes por uma taxa mensal.
Existe uma variedade de conteúdo no site, mas sua popularidade é baseada em conteúdo sexual. Portanto, os usuários precisam ter mais de 18 anos de idade.
Tudo começou com fotos de pés
O OnlyFans se tornou ainda mais popular durante a pandemia, com as restrições de circulação em todo o mundo. O número de usuários quase se multiplicou por 10 desde 2019 e agora o site tem mais de 120 milhões de assinantes.
Alguns criadores de conteúdo ficaram ricos com suas contas. Outros têm usado a plataforma como uma tábua de salvação financeira durante a pandemia.
Leah, de 17 anos, conseguiu abrir uma conta com uma carteira de motorista falsa e vender vídeos explícitos.
Ela disse a sua mãe, Caitlyn, que entrou no OnlyFans em janeiro. Em uma semana, a conta bancária de Leah foi congelada depois de receber um pagamento de mais de US$ 7 mil (mais de R$ 35 mil) pela venda de vídeos explícitos no site, diz Caitlyn.
A mãe ficou surpresa: "Não entendo por que as pessoas estão pagando tanto dinheiro por isso."
Leah teve "grandes problemas" quando criança, diz a mãe. Fotos dela nua já foram compartilhadas na escola sem seu consentimento.
Ela disse à mãe que originalmente pretendia apenas postar fotos de seus pés, já que ganhava dinheiro fazendo isso no Snapchat.
Mas isso logo se transformou em vídeos explícitos dela se masturbando e usando brinquedos sexuais.
Um 'descuido' do OnlyFans
Em um comunicado, o OnlyFans disse que o acesso de Leah ao site foi um "descuido" e que sua carteira de motorista falsa não gerou um bloqueio, como deveria.
O site diz que a conta foi aprovada durante uma transição "de um sistema eficaz de identificação e verificação de idade para um novo que é excepcionalmente eficaz".
A idade de Leah foi informada diretamente ao OnlyFans através de uma conta anônima na rede social no final de janeiro. A empresa diz que isso levou um moderador a revisar a conta e verificar sua identificação. Como a conta parecia legítima, nenhuma ação foi tomada.
Leah parou de publicar na plataforma, mas sua conta permaneceu ativa no site por mais quatro meses, com mais de 50 fotos e vídeos arquivados. Ela havia se conectado à conta ainda no final de abril.
Depois de ser contatado pela BBC, o OnlyFans fechou essa conta. Mas as imagens dela já estavam na internet.
Leah agora tem medo de sair de casa e de ser reconhecida, diz sua mãe. Seus planos de ir para a faculdade foram adiados.
"Ela não está saindo de jeito nenhum", diz Caitlyn. "Ela não quer ser vista."
Passaporte da avó
A BBC também soube de outros casos de menores obtendo acesso ao OnlyFans.
A polícia em Hertfordshire, na Inglaterra, disse que uma adolescente de 14 anos usou o passaporte da avó e dados bancários para vender imagens explícitas. Em seguida, ela transferiu o dinheiro ganho online para sua própria conta.
O OnlyFans diz que a conta constituía em "fraude" e envolvia a ajuda de outras pessoas.
O site diz que está cooperando com a polícia e que atualizou seu sistema de verificação de idade para "reduzir ainda mais a chance" de isso acontecer novamente.
Mas a BBC testou o "novo sistema excepcionalmente eficaz" do site em abril.
Embora uma identidade falsa não funcionasse, foi possível abrir uma conta no OnlyFans para uma garota de 17 anos usando o passaporte de sua irmã de 26 anos. A menor não teve acesso à conta.
O site exige que os candidatos posem ao lado de uma carteira de identidade e, em seguida, enviem uma fotografia segurando-a diante do rosto. Mas o sistema de verificação de idade não foi capaz de distinguir entre as irmãs em qualquer fase do processo, apesar da diferença de idade.
Depois de configurar uma conta, os criadores devem fornecer os dados bancários para receber o pagamento por OnlyFans. No entanto, isso não os impede de postar imagens e vídeos.
A BBC descobriu que os criadores podem compartilhar conteúdo e, em seguida, organizar pagamentos por meios alternativos, violando as diretrizes da empresa.
Um dos meios mais populares é o aplicativo Cash, que permite aos usuários transferir dinheiro pelo celular. A reportagem encontrou dezenas de contas promovendo isso.
Foi possível verificar que isto é possível através de uma mensagem direta a um assinante. Na mensagem, o dono da conta no OnlyFans usava letras e símbolos como "Ca $ happ" para pedir que o pagamento fosse feito pelo aplicativo Cash.
O OnlyFans diz que sua lista de palavras proibidas no site já inclui uma série de variações para o termo "aplicativos de dinheiro". O site diz que essa lista agora foi expandida.
'Ele foi pego'
O OnlyFans exige que os criadores que fazem material "em coautoria" tenham documentação que mostre que todos os participantes têm 18 anos ou mais. Todos devem ser criadores registrados.
Mas a BBC descobriu que menores de 18 anos também aparecem em vídeos explícitos em contas administradas por adultos.
Aaron tinha 17 anos quando começou a fazer vídeos no site com a namorada, em Nevada, nos Estados Unidos.
De acordo com seu amigo Jordan, Aaron não tinha sua própria conta, mas "foi pego" por aparecer em vídeos explícitos postados por sua namorada, Cody, que era um ano mais velha que ele.
Aaron logo começou a se gabar de quanto dinheiro estava ganhando. "Ele estava realmente muito orgulhoso de fazer isso", diz Jordan.
O conteúdo incluía encontros sexuais em um de seus quartos. Eles ganharam US$ 5 mil (mais de R$ 25 mil) por um único vídeo, dizem amigos.
Seu amigo, ele explica, teve uma infância difícil e era "muito vulnerável à exploração". Cody o cobriu de presentes em seu aniversário de 16 anos.
Ele garante que Aaron o incentivou a fazer vídeos no OnlyFans, embora ele também fosse menor: "Ele costumava dizer: 'Irmão, você consegue, ganhamos muito dinheiro por semana, é fácil, você nunca precisa trabalhar.'"
A conta foi denunciada à polícia nos EUA em outubro de 2020, mas não havia sido removida até que a BBC contatasse o OnlyFans neste mês.
Em sua resposta, o site afirma que está em contato com a polícia, mas que não recebeu denúncias anteriores sobre esse caso.
Escolas
Como parte da investigação da BBC, algumas escolas, forças policiais e especialistas em proteção infantil disseram ter ouvido falar de crianças menores de 18 anos cujas experiências tiveram consequências terríveis.
Uma escola em Londres diz que uma estudante de 16 anos estava se gabando abertamente sobre quanto dinheiro ela estava ganhando.
Mais tarde, a menor revelou que estava postando imagens "altamente sensuais e pornográficas". E outra menina de 12 anos disse que usou o site para entrar em contato com criadores adultos e propor uma parceria.
O vice-diretor da escola pediu anonimato para proteger a identidade dos menores.
Os conselheiros da Childline, uma linha de apoio para menores no Reino Unido, encontraram vários casos em que menores de 18 anos referem-se ao uso de OnlyFans.
Trechos de mensagens anônimas trazem relatos detalhados de menores de 18 anos vulneráveis usando o site.
Algumas mensagens falam de menores que já haviam sido vítimas de abuso sexual no passado; outras falam de jovens com "problemas de saúde mental como raiva, baixa autoestima, automutilação e ideias suicidas".
Uma menor disse a um conselheiro que estava no OnlyFans desde os 13 anos de idade.
"Não quero falar sobre os tipos de imagens que posto lá e sei que não é apropriado para alguém da minha idade fazer isso, mas é uma maneira fácil de ganhar dinheiro", disse ela, segundo as notas.
Os relatórios foram fornecidos à BBC sem quaisquer dados de identificação dos menores ou das contas OnlyFans em questão. Por isso não foi possível fornecer à plataforma os nomes das contas.
A plataforma informou que analisa manualmente cada cadastro para impedir que menores acessem o site e que aumentou o número de funcionários, em linha com o crescimento do site.
Menores desaparecidos
Simon Bailey, Chefe de Proteção Nacional da Polícia do Reino Unido, diz que está "cada vez mais claro" que os menores usam o OnlyFans.
Embora seja ilegal postar ou compartilhar imagens explícitas de alguém com menos de 18 anos, Bailey diz que a polícia está extremamente relutante em criminalizar menores por tais atos.
Sua preocupação, diz ele, centra-se nos riscos aos quais as crianças estão expostas.
"A empresa não está fazendo o suficiente para implementar salvaguardas que impeçam as crianças de explorar a oportunidade de ganhar dinheiro, mas também de menores serem explorados", diz Bailey.
Uma jovem de 17 anos do País de Gales relatou à polícia que foi chantageada para continuar a postar "nudes" no OnlyFans, ou então eles compartilhariam fotos com sua família.
Três menores também reclamaram que suas imagens foram enviadas para o site sem consentimento, incluindo as de uma jovem de 17 anos de Surrey, na Inglaterra, que disse que seu rosto foi editado no corpo de outra pessoa.
O OnlyFans afirma que não pode responder a esses casos sem receber os dados da conta, que a polícia não compartilha, e que possui vários sistemas para impedir que menores acessem o site.
Mas também há preocupação com o bem-estar dos jovens vulneráveis fora do Reino Unido.
Crianças desaparecidas estão cada vez mais associadas aos vídeos do OnlyFans, afirma o Centro Nacional para Crianças Desaparecidas e Exploradas (NCMEC) dos EUA.
"Em 2019, cerca de uma dezena de menores desapareceram por serem vinculados a conteúdos do OnlyFans", diz seu vice-presidente, Staca Shehan. "No ano passado, o número de casos como esses triplicou."
Embora muito do conteúdo do OnlyFans com menores envolva adolescentes enviando seu próprio conteúdo, o NCMEC diz que também está encontrando evidências de exploração sexual e tráfico de menores.
Em janeiro, um jovem casal da Flórida foi acusado de tráfico de pessoas após supostamente vender uma foto de uma garota de 16 anos no OnlyFans.
O OnlyFans diz que trabalha com agências de exploração online como NCMEC para resolver quaisquer problemas potenciais com as autoridades relevantes.
'Coquetel tóxico de riscos'
Histórias sobre OnlyFans se tornaram recorrentes na imprensa. Os tabloides ficam fascinados com as fortunas feitas no site por profissionais como enfermeiras ou professoras.
Outros jornais destacam o modelo de negócios da plataforma e seu impacto no cenário digital.
O Financial Times recentemente a chamou de "a plataforma de mídia social mais popular do mundo". O jornal informou que a receita do OnlyFans cresceu 553% até novembro de 2020, e os usuários gastaram US$ 2,4 bilhões (mais de R$ 12 bilhões) no site.
Em resposta à nossa investigação, o governo britânico foi crítico sobre o OnlyFans. O site "não protegeu adequadamente os menores e isso é totalmente inaceitável", disse um porta-voz.
"Nossas novas leis vão garantir que isso não aconteça mais."
O OnlyFans recusou o pedido de entrevista da BBC. Em um comunicado, o site disse:
"Usamos uma combinação de tecnologia de ponta junto com monitoramento humano e revisão para evitar que menores de 18 anos compartilhem conteúdo no OnlyFans.
"Isso é algo que levamos muito a sério. Revisamos constantemente nossos sistemas para garantir que sejam o mais robustos possível."
O site diz que seus sistemas continuam a evoluir à medida que novas tecnologias estão disponíveis para "reduzir a incidência de menores de 18 anos se tornando usuários do OnlyFans".
Todos os nomes de menores e de adultos ligados aos menores foram alterados nesta reportagem para proteger suas identidades.
Chris Bell contribuiu para esta reportagem
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