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Frances Haugen: a ex-funcionária que denunciou Facebook ao Senado dos EUA

James Clayton - Repórter de tecnologia

05/10/2021 14h30

Ex-gerente de produto da rede social diz que a empresa prioriza 'o crescimento em detrimento da segurança' do usuário.

Uma ex-funcionária do Facebook, responsável por uma série de vazamentos bombásticos da empresa, prestou depoimento na terça-feira (05/10) ao Senado americano.

Como era esperado, ela fez um apelo aos parlamentares pela regulamentação da rede social.

Frances Haugen, de 37 anos, revelou sua identidade no último domingo (03/10), quando foi entrevistada pela rede americana CBS.

Ela afirma que os documentos vazados ? publicados pelo Wall Street Journal ? provam que o Facebook priorizou repetidamente o "crescimento em detrimento da segurança" dos usuários.

"O Facebook percebeu que se mudar o algoritmo para ser mais seguro, as pessoas vão passar menos tempo no site, vão clicar em menos anúncios, e eles vão ganhar menos dinheiro."

O Facebook afirma, por sua vez, que os documentos vazados são enganosos e camuflam pesquisas positivas conduzidas pela empresa.

Quem é Frances Haugen

Natural de Iowa, nos EUA, Haugen é formada em engenharia elétrica e de computação pelo Olin College em Massachusetts.

Com um MBA pela Universidade de Harvard, ela diz em seu site pessoal ser "especialista em gerenciamento algorítmico de produtos".

Em 15 anos de carreira, ela teve passagem por grandes empresas de tecnologia e rede social, como Pinterest e Google, onde trabalhou por quatro anos como engenheira de software e gerente de produto.

Em 2019, foi contratada pelo Facebook, segundo seu site pessoal, para ser "gerente de produto líder da equipe de desinformação cívica, que lidava com questões relacionadas à democracia e desinformação, e mais tarde também trabalhou em contraespionagem".

Mas com o passar do tempo, foi ficando "cada vez mais alarmada com as escolhas da empresa".

Na entrevista ao programa 60 Minutes da CBS, ela contou que decidiu deixar o Facebook em maio deste ano depois de se irritar com a companhia.

Antes de partir, ela copiou uma série de memorandos e documentos internos. E compartilhou esses documentos com o Wall Street Journal, que publicou o material ao longo das últimas três semanas.

Entre as revelações, estão documentos que mostram que celebridades, políticos e usuários de grande visibilidade da rede social eram tratados de forma diferente pela empresa.

De acordo com os dados vazados, as políticas de moderação eram aplicadas de maneira distinta, ou nem sequer eram aplicadas a essas contas ? um sistema conhecido como XCheck (ou cross-check, que significa verificação cruzada).

Outro vazamento mostrou que o Facebook também enfrentava um processo judicial complexo por parte de um grupo de seus próprios acionistas.

O grupo alega, entre outras coisas, que o valor de US$ 5 bilhões que o Facebook pagou à Comissão Federal de Comércio dos EUA para resolver o escândalo de dados da Cambridge Analytica foi tão alto porque foi destinado a proteger Mark Zuckerberg de responsabilidades pessoais.

Mas são as acusações sobre o Instagram que têm sido particularmente preocupantes para os parlamentares americanos.

Uma pesquisa interna do Facebook (dono do Instagram) mostrou que o Instagram estava impactando a saúde mental dos adolescentes, mas a empresa não compartilhou essas descobertas quando sugeriram que a plataforma era um lugar "tóxico" para muitos jovens.

De acordo com slides de apresentação publicados pelo Wall Street Journal, 32% das adolescentes entrevistadas disseram que quando se sentiam mal com seus corpos, o Instagram as fazia se sentir pior.

Depoimento ao Senado

É sobre este tema que Haugen depôs na terça-feira a um subcomitê do Senado americano em uma audiência intitulada "Protegendo Crianças Online".

Haugen pediu aos parlamentares uma regulamentação do Facebook, que ela compara às empresas de tabaco que por décadas negaram que fumar faz mal à saúde.

"Quando percebemos que as empresas de tabaco estavam escondendo os danos que causavam, o governo tomou uma atitude. Quando descobrimos que os carros eram mais seguros com cintos de segurança, o governo tomou uma atitude", diz um trecho do depoimento preparado.

"Eu imploro que vocês façam o mesmo aqui."

Haugen destacou ainda que os executivos do Facebook costumam optar pelo lucro em detrimento da segurança do usuário.

"A liderança da empresa conhece maneiras de tornar o Facebook e o Instagram mais seguros, e não fará as mudanças necessárias porque colocou seus lucros imensos antes das pessoas. É necessária uma ação do Congresso."

"Enquanto o Facebook estiver operando no escuro, não prestará contas a ninguém. E continuará a fazer escolhas que vão contra o bem comum."

Na semana passada, um executivo do Facebook afirmou em depoimento aos senadores que os vazamentos não destacavam o impacto positivo que a plataforma tinha sobre os adolescentes.

Mas Haugen tem sido contundente na avaliação de seu antigo empregador.

"Havia conflitos de interesse entre o que era bom para o público e o que era bom para o Facebook", disse ela.

"O Facebook repetidamente escolheu otimizar a favor de seus próprios interesses, como ganhar mais dinheiro."

Já o Facebook nega veementemente a acusação, dizendo que gastou quantias significativas de dinheiro em segurança.

"Dizer que fechamos os olhos ao feedback ignora esses investimentos, incluindo as 40 mil pessoas que trabalham na área de segurança e proteção no Facebook e nosso investimento de US$ 13 bilhões desde 2016", afirmou Lena Pietsch, diretora de políticas de comunicação do Facebook.

Haugen também mencionou em entrevista à CBS a invasão do Capitólio por uma multidão de apoiadores do ex-presidente Donald Trump em janeiro deste ano, que acabou com cinco mortos ? alegando que o Facebook ajudou a fomentar a violência.

Segunda ela, a rede social ativou os sistemas de segurança para reduzir a desinformação durante as eleições nos Estados Unidos ? mas apenas temporariamente.

"Assim que a eleição acabou, eles desativaram ou mudaram as configurações para o que era antes, para priorizar o crescimento em vez da segurança, e isso realmente parece uma traição à democracia."

À rede americana CNN, o vice-presidente de Assuntos Globais do Facebook, Nick Clegg, disse que era ridículo sugerir que a empresa era responsável pelo motim.

"Acho que dá um falso conforto às pessoas supor que deve haver uma explicação tecnológica ou técnica para as questões de polarização política nos Estados Unidos", afirmou ele.

A senadora democrata Amy Klobuchar, que faz parte do subcomitê que vai ouvir Haugen nesta terça-feira, adiantou, no entanto, que perguntaria a Haugen sobre a invasão do Capitólio.

"Estou particularmente interessada em ouvir dela se ela acha que o Facebook fez o suficiente para alertar a polícia e o público sobre 6 de janeiro, e se o Facebook removeu as salvaguardas eleitorais de desinformação porque estava sendo um custo financeiramente à empresa", disse Klobuchar em comentário à Reuters por e-mail.

A senadora também acrescentou que gostaria de discutir os algoritmos do Facebook ? e se eles "promovem conteúdo prejudicial e divisivo".


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