Sem alerta, post pago no Instagram pode render multa e abalar credibilidade
Uma busca pelo termo “publipost” no Instagram poderia mostrar, principalmente, conteúdos patrocinados na rede social de fotos. Mas não é bem o que vemos: boa parte do que aparece ali são supostas denúncias de publicidade velada. Proibida por lei, a prática pode resultar em multa à empresa que pagou pelo post. Porém, o dano maior a quem publica esse conteúdo, alertam especialistas, é a perda tanto da credibilidade como a de anunciantes.
Um caso recente que ganhou notoriedade nas redes sociais envolve o perfil no Instagram de Gabriela Pugliesi, autora do blog Tips4Life, sobre vida saudável. Usuários criaram a hashtag #explicapugli para questionar se os posts sobre produtos recomendados por ela são pagos. Eles alegam que não há indicação de #publipost no conteúdo e denunciaram a prática ao Conar (Conselho Nacional Autorregulamentação Publicitária). O órgão aceitou a denúncia e analisa a situação – por isso, ainda não pode comentar esse caso específico.
As suspeitas deram origem a perfis no Instagram, que exibem supostas propagandas veladas feitas por blogueiras defensoras de um estilo de vida saudável. No recém-criado @apenasumadica, também há alertas de possíveis propagandas feitas sem sinalização por uma nutricionista, uma atriz e uma socialite.
Publipost: sinalização obrigatória
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) ordena: “A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”. |
O código de ética do Conar recomenda: “O anúncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua forma ou meio de veiculação.” |
Posts patrocinados em blogs devem vir sinalizados como publicidade logo no início do texto, de preferência antes do título. |
No Instagram, posts patrocinados devem vir sinalizados também logo no início, ou seja, com a indicação de publicidade no alto da própria imagem. |
No Instagram, apenas o uso de hashtags como #publipost, #postpatrocinado ou similares é insuficiente para atender à lei exposta no CDC. Isso porque a hashtag, em geral, é visualizada apenas no fim do post. |
No Facebook e Twitter, a sinalização de publicidade deve ocorrer no início da mensagem do post patrocinado. |
Denúncias sobre publicidade velada podem ser feitas ao Procon de sua cidade e ao Conar. |
No entanto, o principal alvo é mesmo Gabriela – talvez pelo grande número de seguidoras no Instagram, que passa dos 540 mil. Ao UOL, em entrevista por e-mail, Gabriela admitiu publicar conteúdo patrocinado no perfil no Instagram, mas alega que seu trabalho é "honesto, normal e deixou de ser novidade faz tempo". Além disso, ela afirma que comenta apenas produtos que "realmente gosta, usa e consome". Com a repercussão do caso na internet, ela afirma que já está dando mais ênfase ao indicar o conteúdo patrocinado. Nesta semana, a blogueira usou as hashtags #parceiro e #publipost no Instagram.
Segundo Paulo Arthur Góes, diretor-executivo do Procon-SP, três princípios básicos do CDC (Código de Defesa do Consumidor) orientam como deve ser feita a publicidade em qualquer mídia. “A relação com o consumidor deve ser pautada pela honestidade, lealdade e cooperação. Portanto, a publicidade tem de ser ‘identificada fácil e imediatamente pela pessoa’”, explica Góes, citando trecho do artigo 36 do CDC.
Não importa, prossegue Góes, se a pessoa que publicou o post pago é conhecida (caso de uma celebridade) ou não. “Se o produto patrocinado está em um espaço que desfruta de importância diante do público, não sinalizar a publicidade é enganar o consumidor.” Isso porque o público forma um juízo diferente daquele conteúdo quando sabe de antemão que é patrocinado, detalha o representante do Procon.
Usuário questiona um post no Instagram de Gabriela Pugliesi, do blog Tips4Life
A responsabilidade pelo dano ao consumidor, caso não haja aviso sobre a publicidade, é da empresa que pagou pelo post. “Se a companhia tem uma relação profissional e comercial com quem escreve aquele conteúdo, essa pessoa é uma representante da organização.”
Se constatada a propaganda velada após denúncia, a empresa pode ser multada pelo Procon. Em situações específicas, em que a publipost possa ter causado danos morais ou à integridade física do consumidor, cabe ainda uma ação cível contra a empresa e autor do post.
Denúncias ao Conar
Em seu código de ética, o Conar estabelece no artigo 28 que o anúncio “deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua forma ou meio de veiculação”.
Consultado pelo UOL, o Conar informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que estabelece boas práticas, e não proibições para o setor. O ideal é que qualquer pessoa tenha noção de que aquele conteúdo online foi remunerado. A entidade aceita denúncias de publicidade velada pelo seu site, mas não aplica multas nem proíbe a veiculação da publicidade infratora.
O Conselho de Ética pode aceitar ou não a denúncia. Em caso positivo, um conselheiro é nomeado para avaliar a questão, recebe a defesa do denunciado e dá um parecer, validado ou não pelos demais conselheiros. O resultado então é comunicado ao infrator.
Aos infratores são aplicadas advertências, recomendações de alteração/correção do conteúdo ou a sugestão de interrupção da sua veiculação.
Perda de credibilidade
As penalidades aplicadas pelo Conar, no entanto, podem ter impacto em relação à credibilidade dos infratores. Sem confiabilidade, os perfis podem perder anunciantes, além dos próprios seguidores. Nesses casos, o ganho com a publicidade velada acaba virando um grande prejuízo.
Para Pedro Waengertner, coordenador de marketing digital na ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), o autor do post que não sinaliza publicidade trai a confiança do seu seguidor na rede social. “Pior do que ser multada, é a empresa perder a credibilidade. Isso é algo que se demora a conquistar, mas se perde muito rápido. É um bem que vai custar muito mais caro para ser recuperado”, afirma.
O publicitário resume a questão em uma frase: “Além de ter bom senso, não podemos subestimar o consumidor. Essas marcas precisam tratá-lo como alguém muito inteligente, não o contrário”.
Exemplo de boa prática: indicação mostra que a resenha no post foi feita com produto recebido via assessoria de imprensa da marca
Sanção moral
A farmacêutica Priscilla Rezende, 38, conhecida pelo pseudônimo “Blogueira Shame”, também acredita nesse efeito de “sanção moral” que as denúncias podem ter. No blog “Shame on you, blogueira” ela costuma apontar, em tom bem-humorado, posts encontrados em redes sociais suspeitos de serem publicidades veladas.
Em 2012, leitoras do blog, diz ela, chegaram a encaminhar denúncias ao Conar a partir de um post do “Shame” sobre as blogueiras de moda Thássia Naves, Lala Rudge e Mariah Bernardes. Havia conteúdo muito similar nos posts publicados sobre a inauguração da loja de cosméticos Sephora no Brasil e sem indicação se aqueles textos eram pagos.
Elas foram advertidas pelo Conar por publicidade velada, mas não tiveram de retirar o material do ar. “A advertência serviu para, pelo menos, elas passarem vergonha em público”, considera Priscilla.
Exemplo de boa prática: post com resenha de produto comprado pela própria blogueira vem com o aviso
Na ocasião, Lala defendeu-se em um post. “Nunca fizemos 'propaganda' de nada que fuja da nossa realidade, do nosso perfil, justamente para não perdermos a nossa credibilidade." Thássia, também usando um post em seu blog, afirmou que usa todos os produtos antes de recomendá-los. “Nessa deliciosa troca não há nada 'fake', tudo que veem por aqui é indicação pessoal.” Segundo a Folha de S. Paulo, Mariah teria afirmado por meio de um post que cometeu um equívoco ao não colocar a palavra “publipost” no final de seu comentário.
Priscilla, a blogueira Shame, diz ter se engajado contra a publicidade velada nos blogs de moda porque muitas das leitoras deles são adolescentes, que até se endividam para comprar os produtos recomendados. “Recebo muitos e-mails de meninas me agradecendo por ter desmascarado esse tipo de post, porque elas acreditavam que as blogueiras realmente gostavam e usavam os produtos.”
Leandro Batista, professor de Ética e Legislação Publicitária na ECA (Escola de Comunicações e Artes) da Universidade de São Paulo, acredita que a sociedade dá a maior punição aos autores da publicidade, embora considere que falta rigor na aplicação do código do Conar à internet, “onde qualquer um pode criar um site ou perfil”.
“Essa é a ideia básica da autorregulamentação, que a sociedade aprenda com aquele caso apontado pelo Conar, deixando de comprar o produto ou acessar aquele conteúdo.” Batista defende que seja criada uma regulamentação específica para publicidade na internet, para inibir efetivamente más práticas, tal como ocorre em outras mídias, como rádio e TV.
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