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Vigilância? Metrô de Pequim quer usar rosto para cobrar passagens

Metrô em Pequim vai adotar reconhecimento facial, levantando debate sobre privacidade - Xinhua/Mao Siqian
Metrô em Pequim vai adotar reconhecimento facial, levantando debate sobre privacidade Imagem: Xinhua/Mao Siqian

Rodrigo Lara

Colaboração para o UOL Tecnologia

28/06/2018 04h00

Se depender do governo da cidade de Pequim, quem quiser usar o sistema de metrô local poderá pagar sua passagem sem fazer nada. Isso porque está em andamento um plano para usar o rosto dos passageiros ou a palma de suas mãos como autenticação para um novo sistema de catracas.

Funcionaria assim: ao invés de usar um tíquete, cartão ou aparelho de celular, o seu rosto seria identificado na hora de cruzar a catraca - ainda haveria a possibilidade de um scanner ler a palma da mão da pessoa para liberar a passagem. Dessa forma, o valor da passagem seria descontado de uma conta digital.

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Segundo os responsáveis pelo sistema de transporte da capital chinesa, o procedimento evitaria lentidão no embarque de passageiros e também melhoraria o fluxo de pessoas durante as horas mais movimentadas das estações.

É um desafio e tanto, considerando que Pequim tem 22 linhas de transporte sobre trilhos, que transportam 10 milhões de pessoas por dia.

Apesar de ser novidade na capital chinesa, o uso de sistemas de leitura biométrica em transportes públicos não é inédito no país. O metrô de Xangai usa leitores de mão para o mesmo fim, podendo ler a palma de uma mão e comparar com uma base de dados em segundos.

Facilidade ou invasão de privacidade?

Ainda que o discurso oficial seja o de facilitar e agilizar o embarque, há a preocupação de que esse seja mais um passo do governo chinês no sentido de vigiar e monitorar os passos dos seus cidadãos.

Vale lembrar que policiais chineses têm à disposição óculos especiais capazes de reconhecer faces, assim é comum a existência de sistemas de câmeras de vigilância nas cidades do país. Por meio desses sistemas, é possível cruzar informações com um banco de dados que tem informações como os hábitos das pessoas, o famigerado crédito social e também quais são os seus amigos.

Ainda na China, algumas escolas testam sistemas de reconhecimento facial para analisar a performance de estudantes. Por outro lado, empresas usam formas de monitorar as emoções dos seus funcionários, usando sensores em bonés e chapéus para determinar quando eles precisam de descanso ou podem assumir novas tarefas.

Conforme relatou o jornal South China Morning Post, em ao menos um caso essa tecnologia se mostrou eficiente: a State Grid Zhejiang  Electric Power, empresa que cuida da energia elétrica da cidade de Hangzhou, melhorou seu lucro em US$ 315 milhões desde que adotou esse tipo de monitoramento em 2014.

Além da China, a tecnologia de reconhecimento facial também ganhou espaço nos Estados Unidos como forma de aprimorar a segurança em algumas escolas face aos recentes casos de ataques a tiros nesses locais. A iniciativa gerou polêmica, com grupos de direitos civis argumentando que a tecnologia seria invasiva e inútil, uma vez que esses ataques frequentemente são promovidos por alunos dessas instituições.

O Brasil também não ficou de fora de polêmicas envolvendo reconhecimento facial. A ViaQuatro, empresa que opera a Linha 4 - Amarela do metrô de São Paulo, planejou instalar anúncios nas estações que utilizariam reconhecimento facial para medir a reação do público. O sistema entrou em funcionamento em três estações no mês de abril deste ano, diante de críticas devido à ausência de transparência sobre o possível armazenamento de dados dos usuários.

Ao menos no Brasil, não há meios, por ora, de exigir transparência sobre como os dados obtidos são usados. Isso porque não há uma legislação no país que trate sobre o tema.

A única movimentação nesse sentido é o Projeto de Lei 4060/12, recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados e que aguarda apreciação do Senado. Esse projeto estipula regras sobre o tratamento e cruzamento de dados pessoais, como nome, endereço, email, idade, estado civil e também dados coletados por sistemas de vigilância de vídeo.

De acordo com a proposta, o uso de dados do tipo só seria possível em situações específicas, que podem envolver o consentimento do dono das informações, o cumprimento de decisões judiciais, para o uso de políticas públicas, entre outros. A íntegra da proposta pode ser vista no site da Câmara.

Em todo o mundo há iniciativas para aumentar a proteção aos dados pessoais. Uma das mais famosas é o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR, da sigla em inglês), aprovado recentemente na Europa e que impactou todo o mundo. Entre os pontos da regulamentação, estão a garantia de transparência sobre o uso dos dados pessoais e a possibilidade de acessar, alterar ou excluir dados fornecidos às empresas.

São questões que colocam o desenvolvimento de tecnologias que utilizam a coleta de dados biométricos em rota de colisão com a legislação em si. Ao menos por ora, não parece haver uma solução que concilie ambas as iniciativas - e isso deverá render muita discussão nos próximos anos.

Todos esses debates, no entanto, não deverão afetar o plano do metrô de Pequim: com ou sem leis de proteção aos dados pessoais, o sistema de reconhecimento biométrico deverá estrear no sistema de transporte local no final deste ano.