Os celulares cresceram, mas os nossos bolsos continuam os mesmos

Você lembra a época em que os celulares cabiam no seu bolso? Os smartphones cresceram bastante de tamanho nos últimos anos, mas a indústria da moda pouco fez para acompanhar essa tendência.

Hoje, se você decide sair de casa com o celular e sem bolsas, você provavelmente terá alguns problemas. Se usar uma calça jeans, o aparelho mal cabe no bolso da frente e pode cair do de trás, que é maior.

Além de ficar feio, o celular fica exposto a quebras --principalmente no bolso de trás -- e a assaltos. Os bolsos de homens são maiores, mas levante a mão aquele que nunca deixou o celular cair ao sentar.

Na era pré-smartphone, a vida era mais fácil. Um modelo popular nos anos 2000 no Brasil foi o Nokia 1100, aquele celular com uma lanterninha no topo do aparelho. Suas dimensões eram 106 x 46 x 20 milímetros, o equivalente a metade de uma esponja de lavar pratos.

Hoje o Galaxy Note 9 e o iPhone XS Max já superam os 15 centímetros de altura e chegam perto dos oito de comprimento. E como isso fica nos bolsos?

Mulheres sofrem mais

Um estudo feito pelo site de infográficos "Pudding" neste ano avaliou o tamanho e formato dos bolsos em calças jeans fabricadas pelas 20 marcas mais populares nos EUA em 2018.

Segundo o estudo, as mulheres no geral acabam contando com bolsos frontais 48% mais rasos e 6,5% mais estreitos na comparação com os dos homens. Um Google Pixel 2 XL só cabe completamente em 5% dos bolsos das mulheres, enquanto cabe em 85% dos bolsos dos homens.

Já quanto aos bolsos traseiros, a diferença entre gêneros era um pouco menor. Os bolsos das mulheres ainda eram menores, mas não muito: na categoria "skinny", um tipo de calça mais colada, eram 5% mais curtos e 2% mais estreitos em relação aos dos homens.

No corte convencional, os bolsos femininos eram 7% a menos de comprimento e 2% a menos de largura que os masculinos. Em resumo, os bolsos traseiros dos homens eram um pouco mais profundos, mas quase da mesma largura que os das mulheres. No Brasil, seguimos a mesma tendência.

Estética, conforto e sexismo

Camilla Olson, diretora criativa de uma empresa de moda de alta tecnologia, disse ao site "The Atlantic " que o machismo inerente na moda tem muito a ver com isso.

A indústria da moda não está ajudando as mulheres a avançar. Nós [mulheres] sabemos claramente que precisamos de bolsos para carregar tecnologia e acho que é esperado que levemos uma bolsa. Quando estamos trabalhando, não carregamos bolsas ao redor. Um bolso é uma coisa razoável

Jan Diehm e Amber Thomas, autores do estudo de bolsos do "Pudding" citado no começo deste texto, atentam que essa tendência é bem antiga na moda.

"Nos tempos medievais, tanto homens quanto mulheres tinham bolsos amarrados na cintura, escondidos embaixo de roupas, e mais parecidos com pochetes. (...) No final do século 18, a moda feminina mudou: as cinturas subiram, as silhuetas diminuíram e os bolsos encolheram, às vezes tornando-se inexistentes. (..) O famoso estilista Christian Dior cimentou ainda mais o patriarcado dos bolsos em 1954, dizendo: 'Os homens têm bolsos para manter as coisas, as mulheres para a decoração'."

A dupla diz que bolsos menores ou inexistentes são restrições que geram desigualdade e insegurança. "Ao restringir o espaço em que as mulheres podem manter as coisas seguras e manter a mobilidade de ambas as mãos, estamos também restringindo sua capacidade de navegar em espaços públicos ou viajar desacompanhadas. Pense na última vez que uma mulher perguntou ao seu namorado / amigo / qualquer homem de calças masculinas para levar seu telefone / carteira / chaves em um passeio".

A professora Agda Carvalho, do curso de Design do Instituto Mauá de Tecnologia, acredita que a questão também vem do comportamento do público, pois o mercado já apresenta distintas soluções de bolsos. E este item não costuma ser um dos pontos mais relevantes na escolha.

"A questão estética e o conforto, além da preocupação em compor uma atitude, valem mais na hora da escolha da peça de roupa", argumenta.

Opções para celular grande

Thiago Leão, coordenador de produto da Levi's, admite que a indústria da moda dormiu no ponto com a questão dos bolsos.

Nesse quesito, a tecnologia foi mais rápida, e agora corremos atrás de uma maneira geral para nos atualizarmos em como carregarmos nossos gadgets"

Ultimamente, sites de financiamento coletivo têm recebido projetos de "wearables", roupas inteligentes com bolsos especiais para nossos gadgets --como esta jaqueta da Baubax-- ou trazem funções eletrônicas dentro da costura.

A jaqueta Commuter x Jacquard, parceria da Levi's com a Google, traz um controle na região do pulso da jaqueta, com o qual é possível mudar de música, definir rotas para destinos via GPS, atender ligações, e até mesmo ouvir uma mensagem de texto enviada para você.

Mas a maioria dessas invenções ainda não chegaram ao Brasil. A mais próxima delas é a calça da empresa PRS, de São Paulo, que bolou uma calça com bolso especial para celular na lateral da perna.

"Além de mais apertado, o celular ficava feio e quadrado na nossa coxa, e às vezes com uma parte fora da roupa. Pensamos em criar algo que ficasse invisível. Como a lateral da coxa é mais plana, é onde mais disfarça, então evita roubo também", diz o fundador da marca, Frederico Perusin.

A marca também vende bermudas e entrega em todo o Brasil com preços a partir de R$ 99 (bermudas) e R$ 129 (calças). "Antes do bolso, 95% das nossas vendas eram masculinas, e 5% femininas. Hoje está em 40% feminina e 60% masculina", comemora Perusin.

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