Plástico moldado sob pressão: entenda a tecnologia por trás do Lego
Em 1949, o carpinteiro dinamarquês Ole Kirk Christiansen resolveu largar mão dos brinquedos de madeira e passou para o plástico. Ao se inspirar na Kiddicraft, uma marca de tijolos de plástico inglesa, ele criou os Blocos de Ligação Automática, um nome chato que não pegou. O mundo preferiu chamar essa invenção de Lego, nome da empresa de Christiansen.
O resto é história. A Lego revolucionou a indústria de brinquedos com seus kits de blocos de encaixe, um brinquedo criativo, versátil e resistente como poucos. Estima-se que seis peças de oito pinos, do tipo 2 x 4, permitem exatamente 915.103.765 combinações diferentes.
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No início, os blocos tinham problemas de encaixe, porque eram ocos, e faltava firmeza nos pinos para o encaixe. Em 1958, o design atual foi desenvolvido, com os tubos por baixo das peças. O material passou do acetato de celulose para um polímero chamado ABS, um material termoplástico rígido e leve.
Os tubos foram tão importantes para a Lego que foram patenteados, e essa exclusividade tornou a empresa uma das maiores fabricantes de brinquedos do mundo. A patente caiu em 1978, permitindo a ascensão de clones da Lego, mas a empresa permaneceu na liderança do mercado que ela mesma criou.
Feitos de matemática
Antes de falarmos da fabricação, vamos colocar uma régua em cima de uma pecinha 2 x 4 da Lego para entender que um dos seus parâmetros de qualidade é manter-se fiel à matemática.
O sistema da Lego criou uma unidade própria de medida, que consiste de 1,6 milímetros. Essa é a altura de um pino de encaixe. As medidas dos principais tijolos seguem múltiplos dessa "Unidade Lego".
- Altura do pino: 1,6 mm (uma unidade Lego)
- Diâmetro do pino e do tubo interno: 4,8 mm (três unidades Lego)
- Altura do tijolo, fora o pino: 9,6 mm (seis unidades Lego)
- Espessura da parede interna do tijolo: 1,6 mm (uma unidade Lego)
- Comprimento e profundidade de uma peça 1 x 1 pino: 8 mm (cinco unidades Lego)
Logo, uma peça de oito pinos 2 x 4 tem comprimento e profundidade multiplicados por cinco unidades Lego (8 mm). Ou seja, além dos 9,6 mm de altura, traz 16 mm (8 x 2) de profundidade e 32 mm (8 x 4) de comprimento --na prática dá 31,8 mm neste último, com 0,2 mm a menos para ajudar no encaixe.
Seguindo essas medidas à risca, a Lego faz com que as peças encaixem muito bem entre si, e com vida longa. A Lego garante que uma peça fabricada no final dos anos 50 pode encaixar bem em outra forjada em 2018.
Fabricando
Cada peça Lego é planejada inicialmente no NX CAD, um programa da Siemens de modelagem 3D que também testa a qualidade e o comportamento da peça em ambientes virtuais que simulam as leis da física reais. Assim, dá para saber quanto peso a peça aguentaria até deformar ou rachar. Essa etapa evita desperdícios com peças defeituosas.
A primeira etapa da fabricação propriamente dita é a chegada da matéria-prima: grânulos de ABS adquiridos com fornecedores externos. Eles já chegam pintados às fábricas da Lego em Billund, na Dinamarca; Nyíregyháza, na Hungria; Monterrey, no México; e em Jiaxing, China.
O material é puxado por mangueiras gigantes, despejado em altos silos de metal de três andares, e levados por tubos até as máquinas de moldagem. São 14 silos e cada um pode armazenar até 33 toneladas de grânulos.
No processo de moldagem, totalmente automatizado, os grânulos são superaquecidos a uma temperatura de cerca de 230°C. O plástico derretido é despejado em moldes --pequenos recipientes de metal, em forma de blocos ocos-- como se fosse a água que vira cubo de gelo no seu freezer. Daí saem 1,7 milhão de peças por hora, ou mais de 15 bilhões por ano.
A máquina põe centenas de toneladas de pressão para assegurar a precisão e resistência dos blocos. Em seguida, eles são esfriados e soltos. Isso leva apenas cerca de dez segundos.
Na fase de qualidade, uma equipe pega amostras das peças prontas e as submetem a testes para assegurar que estão de acordo com os padrões (medidas, resistência etc.). Segundo a Lego, a máquina de moldes lida com uma tolerância de só 0,01 mm nas peças, e só 18 peças por milhão saem com problemas.
As peças finalizadas são levadas por esteiras transportadoras até as caixas. Quando uma caixa está cheia, um sinal de rádio é enviado a um caminhão-robô. Vários deles fazem o trajeto correto seguindo sulcos no chão da fábrica e despejam as caixas em outra esteira.
As peças mais complexas passam pela etapa de decoração, quando os detalhes são impressos e as peças de múltiplas partes são juntadas.
Nesta etapa, uma câmera especial fica de olho se uma peça está na posição errada -- por exemplo, se a roupa do boneco está virada para as costas. As fábricas na Dinamarca, Hungria, México, além de Kladno, na República Checa, cuidam dessa parte.
Na etapa final, de embalagem, máquinas selecionam e contam as peças que serão empacotadas, formando conjuntos Lego completos.
Operadores humanos colocam os manuais de instrução e peças maiores, como aqueles grandes retângulos que simulam o chão, e verificam quaisquer erros cometidos pelas máquinas. Por fim, mais máquinas fecham e selam as caixas, que ficam prontas para irem às lojas.
Em paralelo, designers têm a função de pensar em futuras sugestões de kits, ao coletar peças diferentes e pensar que tipo de coisa pode brotar dali para enfeitar a caixa. Um novo veículo? Uma estação espacial? Uma cidade inteira?
Ao longo dessas décadas, aproximadamente 485 bilhões de peças Lego foram fabricadas. É certamente muito plástico na natureza e nos pés descalços dos pais. Mas a empresa impôs a si mesma um prazo de até 2030 trocar o polímero ABS usado em suas peças por uma solução mais ecológica.
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