Até quando as redes sociais vão censurar os mamilos femininos?
Uma das polêmicas da semana envolveu a exclusão de uma foto da atriz Leticia Colin publicada no Instagram e no Facebook. As redes sociais censuraram a imagem, porque ela estava com o mamilo à mostra.
A foto faz parte de um ensaio produzido para a revista "Marie Claire", que traz a atriz na capa com um dos seios de fora --e o objetivo da atriz era exatamente questionar o tabu da nudez feminina.
"Diante do avanço do conservadorismo, posar com os seios à mostra é um jeito de lutar pelas liberdades", disse Colin em entrevista à revista.
Pouco depois de publicá-la no Instagram, no entanto, a foto foi excluída pela rede por violar regras de publicação, como a nudez. O resultado foi uma enxurrada de críticas à empresa e a republicação da imagem por várias artistas.
Em nota, o Instagram disse que "nem sempre é fácil encontrar o equilíbrio entre possibilitar que as pessoas se expressem e manter uma experiência confortável para toda nossa comunidade global, cultural e etariamente diversa, mas nos esforçamos muito para chegar lá".
E acrescentou: "Existem situações em que fotos de seios nus são permitidas, como durante a amamentação, parto e os momentos após o nascimento da criança, mostrando os seios com cicatrizes pós-mastectomia, em outras circunstâncias relacionadas à saúde ou onde o contexto social é claro".
Vale lembrar que demorou e muita pressão foi necessária para que a rede social liberasse esse tipo de imagem. Antes, o Instagram apagava qualquer imagem de mamilo e, muitas vezes, errava ao avaliar automaticamente a foto -- já exclui foto de mulher em banheira por confundir cotovelo com seios, por exemplo.
Em março deste ano, o Facebook também teve de pedir desculpas depois de censurar a imagem da Vênus de Willendorf, uma estátua pré-histórica considerada obra-prima da era paleolítica.
Mamilos são polêmicos
Mas até quando o Instagram e o Facebook vão continuar censurando mamilos femininos?
Questionada pela reportagem, a empresa mais uma vez se esquivou e não respondeu. Também não disse se há qualquer esforço para melhorar o algoritmo.
Em abril deste ano, o chefão do Facebook, Mark Zuckerberg, tentou se defender: "É muito mais fácil construir um sistema de IA [inteligência artificial] para detectar um mamilo do que identificar um discurso de ódio", disse ele durante a divulgação dos lucros do primeiro trimestre deste ano em uma teleconferência com analistas.
Pode ser muito mais fácil, mas nem assim funciona, porque se tem uma coisa que máquinas ainda não conseguem fazer perfeitamente é entender contextos e sutilezas.
Segundo a professora Mariangela de Oliveira Gomes Setti, da UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná), tecnicamente isso acontece porque uma imagem específica tem um padrão bem definido, o que torna mais fácil a sua identificação.
"Então, do ponto de vista computacional, é muito mais fácil implementar um algoritmo desses do que outro para identificar padrões que permitam uma classificação de mensagens de texto", diz.
"A questão poderia ser: por que temos um biquíni e os homens têm uma sunga? Os seios femininos sempre foram vistos como uma parte sensual do corpo feminino, ninguém está preocupado ou interessado nos mamilos masculinos", diz Mariangela Setti.
O problema é que algoritmos não são neutros, e o alvo acaba sendo sempre as mulheres topless, e não homens de sunga, por exemplo.
Isso acontece por causa do machismo, porque o mamilo feminino significa sexo e o masculino não significa nada. Essa diferença não deveria existir
Raphaela Filippetto, do @mamiloslivres
A publicitária fundou em 2015 o perfil no Instagram, ao lado da colega Fernanda Rios. A ideia era encontrar uma forma de burlar o algoritmo da rede para promover o autoexame que previne o câncer de mama.
Para isso, elas criaram adesivos de mamilos, que são enviados para usuários que colam, fotografam e divulgam a imagem em seus perfis com a hashtag #polemicoehissoaindadartabu.
É um traço da sociedade que vemos replicado nas redes sociais, mas essas empresas não poderiam dar um passo para mudar isso?
Enquanto o Instagram não muda a sua política, ativistas tentam burlar o algoritmo, como o perfil @genderless_nipples (ou "mamilos sem gênero", em português). "Os homens podem mostrar os seus mamilos, as mulheres são banidas. Apoie TODOS os gêneros! Vamos mudar essa política!", diz a descrição da página.
Em 2016, uma ONG argentina usou ironia para criticar a censura de mamilos femininos no Instagram e no Facebook. Na campanha 'Tetas x tetas', o corpo de um homem foi usado em um vídeo para ensinar como as mulheres podem fazer o autoexame para prevenir o câncer de mama.
Como liberar todo e qualquer mamilo tornaria mais fácil a vida dos algoritmos, podemos dizer que é só uma questão de censura interna de empresas como o Facebook, que é dona das principais redes sociais do mundo.
A discussão já está nas ruas, nas redes e conseguiu algumas mudanças. Mas, por enquanto, a empresa de Zuckerberg não pretende mudar seus critérios para evitar censura dos mamilos femininos.
"Eu acho que as coisas melhoram sempre que tem burburinho como esse. Essa questão [do Facebook censurar mamilos femininos] não vai melhorar do dia para a noite, por isso é importante se manifestar, fazer campanhas e projetos para manter assunto vivo, mostrar relevância dele", diz Filippetto.
Em 2016, logo depois do Instagram excluir uma das fotos, o Genderless Nipples publicou uma nova foto de mamilo em close e disse: "Instagram! Você nem mesmo consegue diferenciar um mamilo feminino de um masculino. Quem poderia? Então por que banir os delas se eles são tão parecidos?".
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