Por que buscar por 'idiota' no Google mostra Jair Bolsonaro como resultado?
Se você acessou o Google para pesquisar pela palavra "idiota" na manhã desta segunda-feira (17), provavelmente se deparou com links sobre o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL).
Apesar de ser um prato cheio para a oposição do vencedor da eleição presidencial deste ano não tem, esse resultado específico da busca não tem, porém, nada de partidário nem se trata de uma campanha de difamação promovida pela empresa norte-americana.
A situação guarda semelhanças com a que ocorreu nos Estados Unidos com o presidente Donald Trump e com o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad.
Idiota de Ouro
Tudo começou com a premiação do programa de TV Je t'aime, da emissora francesa France 2. O nome do troféu "Le cons d'or 2018" pode ser traduzido como "Os idiotas de ouro" ou "Os babacas de ouro".
Os apresentadores do programa julgaram que Bolsonaro foi campeão de duas categorias, a de misógino do ano e a de racista do ano. Ele ainda concorria como ignorante do ano, mas perdeu para o rapper Kanye West.
Veículos brasileiros de imprensa passaram a noticiar a homenagem recebida por Bolsonaro, com títulos que resumiam a situação como "TV francesa elege Jair Bolsonaro como racista e misógino do ano", caso do site "Notícias da TV", parceiro do UOL.
Outros, porém, deram os seguintes títulos: "Bolsonaro recebe prêmio 'Idiota do Ano' (Jornal Opção) e "Bolsonaro ganha 'Idiota do Ano' na França e Brasil já é campeão no seu governo" (Sensacionalista).
A forma como a premiação foi noticiada interferiu no jeito como o Google respondeu a buscas por "idiota". Antes de entregar resultados para uma pesquisa, o motor de buscas do Google faz muitos cálculos. Ele tenta, antes de tudo, definir o que o internauta está procurando. Para isso, analisa, entre outros dados, informações como a localização da pessoa, tipo de aparelho usado e até pesquisas anteriores. Combina isso com os resultados que estão sendo clicados por outros indivíduos que fizeram buscas similares.
Tudo isso é levado em conta antes de um link ser exibido no topo da página de resultados. Vão parar na parte de cima os links considerados relevantes, ou seja, aqueles que os algoritmos do Google julgam que podem atender melhor à demanda dos internautas.
O líder do centro de engenharia do Google na América Latina, Berthier Ribeiro-Neto, costuma explicar que os engenheiros estão preocupados com o que chama de "qualidade da busca", ou seja, se os links exibidos estão diretamente relacionados com as consultas. Para ajudar a entender como os complicados cálculos feitos pelo algoritmo de buscas funcionam, ele usa uma analogia.
"Suponha que o usuário busque por 'banco do Brasil'. O que você acha que ele quer? Um banco de praça no Brasil ou a instituição financeira? Possivelmente, ele está querendo ter acesso ao site do Banco do Brasil para fazer uma transação qualquer", explicou ao UOL Tecnologia em outubro deste ano.
"E se a consulta mudar e ficar assim, 'transferência de dinheiro para o Banco do Brasil'? Continua aparecendo [o site do BB] em primeiro lugar? É com isso que o engenheiro está preocupado."
Ou seja, de alguma forma, os links de notícias relatando o fato de Bolsonaro ter sido um dos premiados no "Idiotas de Ouro" passaram a ser os resultados mais relevantes entregues pelo Google a quem fazia consultas pela palavra "idiota".
Atrás da cortina
Se você continua achando que isso é bobagem e que tudo não passa de uma conspiração contra Bolsonaro, saiba que você não está sozinho -- ainda que não esteja certo. Aconteceu o mesmo nos Estados Unidos. Só que, por lá, a busca do Google relacionava "idiota" não a Bolsonaro e, sim, ao presidente Donald Trump.
A questão incomodou tanto que chegou a ser um dos assuntos abordados durante a sabatina do chefão do Google, o indiano Sundar Pichai, promovida pelo Congresso norte-americano. A dúvida foi levantada pela deputada democrata Zoe Lofgren, da Califórnia:
Agora mesmo, se você 'googlar' a palavra idiota na parte das imagens, a figura de Donald Trump vai aparecer. Eu acabei de fazer. Como isso acontece?
Pichai respondeu:
Sempre que você digita uma palavra-chave, no Google nós rastreamos e armazenamos cópias de bilhões de páginas [de websites] em nosso índice. E nós pegamos a palavra-chave e a combinamos com suas páginas e as classificamos com base em mais de 200 sinais -- coisas como relevância, frescor, popularidade, como outras pessoas estão usando. E, com base nisso, a qualquer momento, tentamos classificar e encontrar os melhores resultados de pesquisa para essa consulta.
De forma bastante sarcástica, Lofgren rebateu:
Então não são homenzinhos sentados atrás da cortina decidindo o que vai ser mostrado ao usuário?
O CEO do Google rebateu sério:
Isso está funcionando em escala, e nós não interferimos manualmente em um resultado de busca em particular
Bomba do Google
Trump e Bolsonaro não foram os primeiros presidentes a serem associados a termos nada lisonjeiros na busca do Google. Já havia ocorrido com George W. Bush nos anos 2000.
A mesma técnica que levou os dois a serem relacionados a "idiota" fez Fernando Haddad ser ligado a buscas no Google pela expressão "pior prefeito", durante a corrida eleitoral.
O UOL Tecnologia não conseguiu contato com a assessoria de Bolsonaro. Procurou o Google, que não havia respondido até a publicação deste texto.
A tática de enganar o motor de busca do Google de modo que ele exiba resultados estranhos ou irrelevantes para algumas consultas não é sequer incomum. Já até ganhou um termo chique: "Google bomb" ou "Googlewashing".
Isso é diferente das técnicas do chamado SEO (otimização para motores de busca), que aplicam certas melhorias a conteúdos relevantes para que sejam ranqueados no topo de ferramentas de busca.
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