Você não terá celular quântico tão cedo; e por que isso não é um problema?
Resumo da notícia
- Uma revolução, a computação quântica resolve problemas grandes como o Universo
- Smartphones, por sua vez, levaram a informática ao bolso das pessoas
- Peculiaridades da física quântica fazem com que um celular quântico não seja viável
- Um computação quântico, por exemplo, só funciona com baixíssimas temperaturas
A computação quântica é a nova fronteira da informática, uma revolução que promete um processamento de dados tão alto que problemas do tamanho do Universo serão solucionados a uma velocidade assustadoramente rápida. Já os smartphones são os aparelhos que liberaram os computadores de suas mesas e os levaram para os bolsos de qualquer um.
Dada a velocidade com que as inovações se mesclam, é de se esperar que, em algum momento, as duas tendências irão se unir e resultar em um aparelho móvel quântico, certo?
Bom, você pode até esperar. Mas, definitivamente, não vai ter um smartphone quântico tão cedo. Isso, pelo menos, é o que diz Bob Sutor, vice-presidente responsável pela estratégia em computação quântica da IBM. A empresa começou recentemente a comercializar processamento quântico na nuvem.
Você não terá um celular quântico durante a sua vida. Isso realmente não vai acontecer. Talvez em 2.000 anos. A computação quântica será a maior revolução na computação, mas vocês terão de ser pacientes. Não haverá quebras de paradigmas na próxima semana
Bob Sutor
Eu sei, você já estava economizando um dinheirinho para comprar o seu celular quântico. Entender por que isso não vai acontecer, exige uma compreensão das limitações físicas enfrentadas por quem quer tirar o máximo da computação quântica. Antes disso, porém, é bom repassar o que essa nova tecnologia tem de novo - afinal, você deve estar doido para saber o que vai deixar de ter no bolso do seu celular.
O que é computação quântica?
Atualmente, tudo que circula no mundo da computação é fruto de uma sequência de 0 e 1.
É assim que a informação é codificada e circula em meios eletrônicos -- inclusive nos transistores, os componentes básicos dos computadores. A menor quantidade de informação enviada por um computador é 1 bit, que pode ser ou um 0 ou um 1.
Só que isso é uma adaptação para a computação da física clássica, que explica bem o funcionamento do mundo quando o objetivo é analisar corpos relativamente grandes. Não dá muito certo, porém, quando se tenta avaliar partículas muito pequenas. A interação de moléculas, átomos e partículas subatômicas, como elétrons e fótons, é algo do domínio da física quântica.
Ao transportar esse conhecimento para a computação, os cientistas perceberam que a transmissão de informação poderia ser agilizada - e muito - ao criar bits quânticos, os bits quânticos ou qubits. Para isso, basta aproveitar traços do mundo quântico.
As partículas quânticas são especiais: existem em diversos estados físicos. Se o bit pode ser 0 ou 1, um bit quântico pode ser 0 e 1 ao mesmo tempo. Isso ocorre porque pode haver uma sobreposição ou superposição dos dois estados, o que gera um terceiro estado diferente.
Um bit quântico se comporta como um átomo artificial
Bob Sutor
Outra característica da física quântica é a capacidade dessas partículas se entrelaçarem ou se emaranharem de tal modo que uma passa a responder às mudanças das outras. Dá para saber características de uma partícula só observando as outras às quais ela está entrelaçada.
Com todas essas características combinadas, esses qubits conseguem processar muito mais informação do que um bit habitual. Sutor gosta de descrever o problemão que seria para um computador guardar os detalhes de uma partícula simples.
"De quanta memória eu precisaria para armazenar uma molécula de cafeína no computador? A resposta é: uma capacidade ridiculamente enorme. Aproximadamente 10 seguido de 46 zeros bits. E isso é bastante grande já que os cientistas estimam que o número de átomos no nosso planeta é entre 10 seguido de 49 zeros e 10 seguido de 50 zeros. Ou seja, a quantidade de informação que você precisaria para armazenar uma molécula de cafeína é equivalente a 1% ou 10% das partículas que temos no planeta!"
O executivo diz que seria praticamente impossível construir uma máquina capaz de guardar tanta informação seguindo a lógica da computação clássica. "Mas a mesma quantidade de informação seria armazenada em 160 qubits", pondera.
Durante a conversa, Sutor mostrou um dispositivo de 4 qubits. E ele cabia na palma da mão.
Mas, tudo o que os qubits têm de poderosos eles têm de instáveis. Como essas características "mágicas" são conferidas por partículas muito pequenas, qualquer perturbação no ambiente pode fazer a informação que carregam se perder e aumentar as taxas de erro. Esses "ruídos" podem ser variações mínimas de temperatura ou vibrações imperceptíveis.
Por que você não terá um celular quântico?
A partir daqui, já é possível entender os motivos que explicam por que a próxima geração do iPhone ou do Galaxy S não será quântica -- nem a próxima ou muitas dezenas depois dela.
Empresas que desenvolvem computadores quânticos hoje em dia resolvem o problema da instabilidade dos qubits de um jeito bastante único: resfriam todo o ambiente até bem próximo do zero absoluto, o 0 Kelvin ou -273°C.
Quando está funcionando, com toda refrigeração, aquele lugar é um dos mais gelado do universo
Bob Sutor
Pode até parecer exagero, mas não é, já que as temperaturas registradas em um computador quântico são menores do que no espaço.
Uma refrigeração tão potente requer um aparato eletrônico de ponta, que inclui, por exemplo, câmaras criogênicas conectadas por cabos supercondutores. O computador da IBM fica pendurado para evitar as vibrações vindas do solo. Tudo isso é guardado dentro de uma estrutura em forma de cilindro que é selada a vácuo.
Ainda assim, isso não é suficiente para manter o computador a salvo dos "ruídos". Ele fica dentro de uma gaiola de vidro que barra som e outras vibrações. Cada uma das paredes tem 3 m de altura por 3 m de largura e sua espessura é tão grossa que seu peso chega a 318 kg. Fazer todo esse sistema caber em um celular quântico seria impraticável. Talvez você seja um cético e ache que essa fortaleza fria seja dispensável, afinal, o que ela está tentando impedir de acontecer? Sutor responde:
Um simples fóton poderia estragar todo um cálculo, porque um só fóton já é muito quente
Ele está falando da partícula elementar responsável pela radiação eletromagnética que, de tão pequena, tem massa zero enquanto está em repouso.
Além de desestabilizar o computador quântico, um fóton poderia se enrabichar com outra partícula do processador e produzir resultados imprestáveis.
O mundo é quântico e os qubits podem querer se emaranhar com outras partículas, como aquelas do seu ombro
Se uma coisa microscópica como o fóton é capaz de produzir tanto estrago, imagine o caos que não seria um celular quântico guardado no bolso de trás da sua calça.
Ainda que um smartphone com qubits esteja fora de cogitação, já é possível usar computadores quânticos. Pela internet. A IBM criou uma rede quântica na nuvem que pode ser acessada por qualquer pessoa. Você escreve os códigos no seu notebook e o computador quântico da IBM faz os cálculos para você. E tudo isso de graça.
No começo deste ano, a empresa deu um passo importante para transformar a computação quântica em um negócio: lançou uma operação comercial na nuvem. Enquanto os processadores da versão gratuita possuem entre 5 qubits e 16 qubits, o computador oferecido às empresas possui 20 qubits. "Esse tipo de cliente sempre quer a melhor máquina possível", diz Sutor, que não comenta sobre os valores pagos por serem sigilosos.
Sincero, o executivo reduz as expectativas de quem espera maravilhas imediatas da capacidade de processamento atual desses aparelhos. "Os computadores quânticos que temos são pequenos. E por "pequenos", eu quero dizer que nada do que você faz hoje em um computador clássico não pode ser feito em um computador quântico."
Isso poderia soar como um balde de fóton quente jogado no qubit. Mas não é assim que as cerca de 40 empresas e centros de pesquisa que já viraram clientes encaram a coisa. Entre elas estão gigantes como a petroleira Exxon Mobil, a montadora Mercedes-Benz e o banco JP Morgan. "Eu sou um dos muitos entusiastas da nossa equipe", diz Ben Boser, diretor de inovação da Mercedes-Benz.
Ainda que a empresa não revele ao certo o que está fazendo no mundo quântico, Sutor diz que uma montadora se interessaria por computadores assim porque muitos dos avanços em seus produtos dependem de saltos evolutivos em física e química. E simulações com moléculas e partículas complexas só podem ser feitas com precisão usando computadores quânticos.
"Alguns países estão dizendo que por volta de 2030 só carros elétricos poderão ser usados, e serão precisas baterias que durem bem mais do que hoje. E muita gente acredita que a computação quântica pode ajudar a fazer toda a parte química [digitalmente] antes de fazer fisicamente", diz. "É muito mais barato do que gastar com reações químicas de verdade."
*o jornalista viajou a convite da IBM
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