Aprovada, diretiva de direitos autorais deve mudar conteúdo da internet
Resumo da notícia
- Diretiva da União Europeia deve atualizar regras de direitos autorais do continente
- Artigo 15 possibilita a criação de taxas para quem divulgar links de notícias
- Já o Artigo 17 dá margem para a criação de filtros para proteger conteúdo
- Editoras e artistas comemoram, enquanto empresas de tec e ativistas criticam
O Google terá que pagar a editores por trechos de notícias e o Facebook terá que filtrar conteúdo protegido por direito autoral. Essa pode ser a nova realidade essas empresas na Europa, pois nesta segunda-feira (15), os governos da União Europeia deu luz verde à iniciativa lançada pela Comissão Europeia há dois anos para proteger as indústrias criativas do continente.
O que é isso?
A reforma --chamada formalmente de Diretiva da União Europeia sobre Direitos Autorais no Mercado Único Digital-- adaptará as regras de direitos autorais da Europa ao mundo atual, onde os serviços de streaming de música, plataformas de vídeo sob demanda, agregadores de notícias e plataformas de conteúdo carregado por usuários se tornaram os principais "portões" para acessar trabalhos criativos e artigos de imprensa.
Com o objetivo de proteger as indústrias criativas da Europa, que empregam 11,7 milhões de pessoas, a nova diretiva foi proposta pela Comissão Europeia em setembro de 2016 e foi aprovada em votação pelo Parlamento Europeu no mês passado.
Com o acordo de hoje, estamos fazendo regras de direito autoral adequadas para a era digital. A Europa terá agora regras claras que garantem uma remuneração justa para os criadores, direitos fortes para os usuários e responsabilidade pelas plataformas. Quando se trata de completar o mercado único digital da Europa, a reforma dos direitos de autor é a peça que faltava no quebra-cabeça
Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia
Qual é a polêmica?
Dois pontos da diretiva que preocuparam empresas e ativistas da internet são o Artigo 11 e o Artigo 13. Ambos tiveram mudanças de numeração: o Artigo 11 agora é chamado de Artigo 15. Já o Artigo 13 agora está integrado ao Artigo 17 da proposta. Ainda assim, os números 11 e 13 continuam sendo usados por parte do público por conveniência.
O Artigo 15 (ex-11) determina que plataformas online paguem uma espécie de taxa para divulgar links para notícias com pequenos trechos destas notícias.
Já o Artigo 17 (ex-13) exige mais responsabilidade das plataformas para garantirem a proteção a conteúdo de direito autoral na internet. Assim, o Google, o Facebook e outras plataformas online terão que assinar contratos de licenciamento com músicos, artistas, autores, editores de notícias e jornalistas para usar seu trabalho.
Sob o novo regime de propriedade, serviços de conteúdo audiovisual como o YouTube, do Google, e o Instagram, do Facebook, provavelmente terão que instalar filtros para impedir que os usuários façam 'upload' de materiais protegidos por direitos autorais.
O texto original passou por mudanças e limita a tese do "imposto de link" do Artigo 15. O projeto agora diz que a garantia de pagamento aos veículos de mídia "não se aplica a atos de hiperlink" e em casos de "uso de palavras individuais ou extratos muito curtos de uma publicação de imprensa".
Além disso, a diretiva não se destina a usuários individuais, mas publicações de imprensa de grandes plataformas e serviços online.
Durante um tempo, discutiu-se que o artigo 17 dava margem para que memes só poderiam ser criados se usuários pagassem aos donos dos direitos autorais do conteúdo original que deu origem ao meme.
A União Europeia negou essa possibilidade. "A diretiva protege a liberdade de expressão. Ele deixa claro que, em toda a Europa, o uso de obras existentes para fins de citação, crítica, revisão, caricatura e paródia são explicitamente permitidos. Isso significa que memes e criações de paródia semelhantes podem ser usadas livremente".
A redação final da diretiva ainda exclui de sua aplicação as enciclopédias online gratuitas (como a Wikipedia), repositórios educacionais e científicos sem fins lucrativos, plataformas para o desenvolvimento e compartilhamento de softwares com código aberto, marketplaces e serviços de nuvem B2B.
De qualquer forma, ainda precisamos ver como tudo isso funcionaria na prática para saber quem será afetado e como, além da fiscalização envolvida.
Os argumentos da Europa
Pesquisas da Comissão Europeia mostraram em 2016 que 57% dos usuários da internet acessam artigos de imprensa por meio de redes sociais, agregadores de informações ou mecanismos de busca. E 47% desses usuários leem extratos compilados por esses sites sem clicar.
A mesma tendência foi observada para a indústria musical e cinematográfica: 49% dos usuários de internet na UE acessam música ou conteúdos audiovisuais online, 40% dos que têm entre 15 e 24 anos assistiram à televisão online pelo menos uma vez por semana. Esta tendência disparou desde então.
Segundo a Reuters, as novas regras de direitos autorais estão destinadas a garantir uma compensação de US$ 1 trilhão para as indústrias criativas da União Europeia.
Quais são as críticas e elogios?
Empresas de tecnologia, ativistas da internet e grupos de consumidores se manifestaram de imediato contra a diretiva, por acharem que em seu formato atual burocratizaria a internet, criaria novos custos e tolheria a criação coletiva.
Em janeiro, o Google disse que pode ter que retirar completamente seu serviço de notícias da Europa se a diretiva passar em seu estado atual. Como exemplo, mostrou capturas de tela de exemplo se a diretiva fosse realidade hoje. Elas mostram links, mas não há cópias ou imagens, títulos de matérias incompletos e títulos de sites sem contexto, parecendo-se com páginas que não conseguiram carregar completamente.
A Wikipedia apagou vários sites europeus em protesto no mês passado, mesmo que em tese suas atividades estejam asseguradas pela nova diretiva. Segundo a Wikimedia, organização sem fins lucrativos que administra a Wikipedia, as novas regras seriam uma "perda líquida de conhecimento livre".
O Google disse que as novas regras prejudicariam as economias criativa e digital da Europa, enquanto os críticos disseram que isso afetaria as empresas menores que não possuíam caixa e não os gigantes da tecnologia.
A Polônia disse que a revisão foi um passo para trás, já que a exigência do filtro pode lançar as bases para a censura.
Julia Reda, parlamentar da UE que havia feito campanha contra as reformas, disse que os críticos podem levar o caso à Justiça, mas isso seria lento e difícil, e que o melhor seria monitorar a implementação justa.
A European Magazine Media Association, a Associação Europeia de Editores de Jornais, o Conselho Europeu de Editoras, a News Media Europe e o grupo de lobby de gravadoras independentes Impala saudaram a decisão.
Entre os artistas que defendem das mudanças propostas estão os produtores de filmes Pedro Almodóvar e Michel Hazanavicius, Benny Andersson, da banda Abba, e o autor Ali Smith, além de músicos como Paul McCartney e Debbie Harry e gravadoras independentes.
Os pró-diretiva argumentam que ela oferece uma oportunidade para desenvolver novos serviços de notícias de qualidade e permite competir de forma mais justa com gigantes da tecnologia.
Quais os próximos passos?
A Diretiva foi aprovada no Parlamento Europeu, com 348 votos a favor, 274 contrários e 26 abstenções, no dia 26 de março. Faltava ainda receber o aval do Conselho da União Europeia, que ocorreu nesta semana.
Nesta segunda-feira (15), 19 países, incluindo França e Alemanha, endossaram a revisão, enquanto a mudança foi contestada pela Finlândia, Itália, Luxemburgo, Holanda, Polônia e Suécia. A Bélgica, a Estônia e a Eslovênia se abstiveram.
A diretiva em si não é uma lei, mas um texto para orientar as leis dos países que compõem a União Europeia. Quando for publicado no Jornal Oficial do órgão, os Estados-Membros terão 24 meses para transpor as novas regras para a sua legislação nacional.
As novas regras sobre o direito de autor serão formalmente assinadas na quarta-feira (17), no Parlamento Europeu, em Estrasburgo.
Como tudo isso pode afetar o Brasil?
Como vimos no exemplo da GDPR, lei de privacidade europeia que reverberou no Brasil e levou à aprovação da nossa Lei Geral de Proteção de Dados, no ano passado, mudanças legislativas em grandes mercados como o da Europa e o dos Estados Unidos, onde estão muitas das empresas de tecnologia afetadas pelas mudanças, tendem a repercutir no mundo todo.
Logo, não estranhe se em breve o governo brasileiro queira criar sua própria nova lei de direito autoral na internet, com muito do que foi afirmado na diretiva da UE, mas respeitando (ou não) as características da realidade brasileira.
Além disso, se houver algum grande impacto financeiro das operações do Google, Facebook, Amazon e cia. na Europa por conta disso, é possível que isso traga redução da atuação dessas empresas em outros continentes e países, como o Brasil.
No artigo 31 do Marco Civil da Internet, diz que infrações a direitos de autor são disciplinadas pela "legislação autoral vigente aplicável" --no caso, a lei 9.610, de 1998 (quando a internet ainda engatinhava no país), que foi atualizada pela lei 12.853/2013. Esta, por sua vez, basicamente foi criada para que o Ministério da Cultura passasse a fiscalizar, regular e supervisionar o trabalho do Escritório Central de Arrecadação (Ecad) e das demais associações de cobrança de direitos autorais.
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