Mulheres, influenciadoras e digitais: mas ainda com estereótipos e machismo
Resumo da notícia
- Modelos virtuais "da diversidade" têm 1,6 milhão de seguidores
- Mas seus criadores são homens brancos
- E é para eles que vai o dinheiro gerado pelas modelos
A gente já contou para você leitor do UOL Tecnologia sobre as uber influencers digitais do momento: Shudu Gram, mulher negra com 170 mil seguidores no Instagram, e Lil Miquela, fenômeno latino com 1,5 milhão de fãs. Elas são mulheres feitas em 3D que aparecem em campanhas para grandes marcas e recebem fortunas para marcar presença em eventos.
Mas mesmo o que parece diruptivo no mundo da moda serve para reforçar os estereótipos relacionados a minorias e padrões de beleza. É o que apontou Thais Fabris, consultora especialista em comunicação e que estuda mudanças no comportamento das mulheres, em uma sequência de tuítes. Segue o fio.
A influencer Shudu foi criada em 2017 pelo fotógrafo de moda Cameron-James Wilson. Sua ideia era criar uma Barbie Princesa da África do Sul. Na página de sua agência, ela é descrida como alguém com vida própria que busca lutar por diversidade no mundo da moda e colaborar com criadores de economias emergentes.
Já Miquela, uma personagem brasileira, é defensora de causas LGBTQ+ e de movimentos como Black Lives Matter. Há quase um ano, Miquela esteve envolvida em uma grande polêmica envolvendo chantagem e intrigas.
"As modelos virtuais mais famosas são uma mulher latina e uma negra. Convenientemente, elas não se pronunciam sobre questões raciais", escreveu Fabris.
Segundo a especialista, as reflexões surgiram de uma conversa com a amiga Clariza Rosa, sócia da agência de modelos Jacaré Moda, que atua na periferia do Rio.
Negra e latina, pero no mucho
"No Brasil falamos demais sobre colorismo e a Miquela é menos pigmentada, então não pensaria nela como embaixadora de movimentos como 'Black Lives Matter'", diz Rosa ao UOL Tecnologia. "Já a Shudu é bem complexa, seu criador é branco. E aí a gente reproduz na tecnologia todas as opressões da vida real", diz.
Rosa lembra que, embora as modelos estejam ligadas a boas causas, quem lucra com a militância são seus criadores.
Esse fluxo é mais fácil que de fato incluir pessoas com seus pensamentos críticos. E, no fim, quem lucra, no geral, continuam sendo homens brancos
Clariza Rosa, sócia da agência de modelos Jacaré Moda
As modelos, segundo ela, reforçam padrões porque, mesmo sendo "diversas", são assim de acordo com a visão do criador.
Fabris avalia que a questão de falar de representatividade, no caso das modelos virtuais, esbarra no "como", já que as pessoas (especialmente mulheres, negras e latinas) não são sujeitos contando suas próprias histórias e sim objetos dos quais se fala. Ela também se queixa de que não é para essas pessoas que vai o dinheiro.
Fabris lembra que os homens virtuais têm menos seguidores e, quando brancos, são andrógenos ao ponto de parecerem aliens; já o homem negro virtual "é uma chuva de estereótipo e objetificação".
Objetificação da mulher virtual
"Tirando a Miquela, eles não chegam a ser personagens, são meros objetos", define. Não raro, as fotos nos perfis mostram as modelos em poses sensuais e glamourosas.
Fabris questiona: "quão diferentes esses personagens são das influenciadoras digitais, com seus corpos tornados ainda mais plásticos com edição de fotos e suas vidas milimetricamente inventadas para parecerem perfeitas?".
A conclusão, segundo ela, é que o mundo caminha simultaneamente por caminhos opostos: "se por um lado crescem os perfis que mostram corpos e vidas reais, por outro há espaço para um ideal tão ideal que nem precisa ser real, pode ser completamente plástico".
Como ela mesmo resumiu, dava para fazer um TCC sobre o assunto.
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