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Superfria e superrápida: veja 5 coisas para entender a computação quântica

Chip quântico Sycamore, de 53 qubits, criado pelo Google - Divulgação
Chip quântico Sycamore, de 53 qubits, criado pelo Google Imagem: Divulgação

Marcella Duarte

Colaboração para Tilt

23/10/2019 15h11Atualizada em 23/10/2019 18h00

Sem tempo, irmão

  • Google atingiu supremacia quântica, indo além do que máquina binária é capaz
  • Qubit extrapola o bit, pois pode ser informação 0 e 1 ao mesmo tempo
  • 230 qubits são o equivalente a todos os átomos do Universo visível
  • Para existirem, qubits trabalham a temperaturas próximas do zero absoluto (-273ºC)

O Google acaba de anunciar que atingiu a supremacia quântica, inaugurando um novo capítulo na história da computação. O chip Sycamore, de 53 qubits, conseguiu desvendar em 200 segundos o segredo por trás de um gerador de números aleatórios, algo que o mais potente computador do mundo até então (o Summit, da IBM) levaria 10 mil anos para fazer.

Apesar de instáveis, os computadores quânticos são considerados a aposta mais promissora do mundo da tecnologia. Além de resolver problemas de segurança, criptografia e inteligência artificial, entre as missões quânticas estão a redução do aquecimento global, a criação de materiais resistentes como supercondutores, a reprodução da fertilização biológica de solos e o desenvolvimento de novos medicamentos.

Os detalhes da pesquisa do Google, publicados na revista científica "Nature", foram anunciados nesta quarta-feira (23), em Santa Bárbara, na Califórnia (EUA).

Relembrando os fundamentos

A física e a mecânica quânticas são estudadas por cientistas como Albert Einstein há anos. A física clássica explica bem o comportamento de corpos relativamente grandes, mas não é capaz de reger as partículas microscópicas. A física quântica surgiu para desvendar a interação de moléculas, átomos e partículas subatômicas, como elétrons e fótons.

Computação quântica quer dizer aplicar a lógica ou os princípios da física quântica para a ciência da computação, com o objetivo de processar grandes quantidades ou volumes de informação. Um computador quântico resolve rapidamente enormes problemas, antes impossíveis.

Quer mais uma prova do tamanho da mudança? Hoje, o padrão de criptografia que protege seu cartão de crédito demoraria 1 bilhão de anos para ser quebrado. Para um computador quântico, a tarefa poderia levar 100 segundos. Estamos falando do início da era da supremacia quântica.

De bits a qubits

A primeira coisa a se entender quando falamos em computação quântica é o termo "qubit".

Na computação clássica, que rege nossos computadores e smartphones, a informação é guardada ou processada na forma de "bit" — a unidade mínima de transmissão de dados, que pode ser 0 ou 1, isto é, passagem ou ausência de energia. É o sistema binário, uma adaptação da física clássica. Tudo que aparece nesta tela que você lê agora é fruto de combinações imensas de 0s e 1s.

Ao levar o conhecimento quântico para a computação, cientistas viram que não precisariam limitar a transferência de informação a 0 e 1; poderiam agilizar a circulação de dados ao usar as características quânticas de partículas pequenas. Na computação quântica, as unidades de informação são chamadas de "qubits", ou bits quânticos.

Um qubit pode representar os dígitos 0 ou 1 e pode ser 0 e 1 ao mesmo tempo, alcançando estados de sobreposição e emaranhamento. É fluido como um átomo.

Adeus à dualidade de estados

Como dissemos acima, um qubit pode ser 0 e 1 simultaneamente. Isso ocorre porque pode haver uma sobreposição dos dois estados, o que gera um terceiro estado diferente, de acordo com os princípios estabelecidos na mecânica quântica.

A sobreposição é extremamente útil porque permite que mais de uma computação seja executada ao mesmo tempo, oferecendo a possibilidade de realizar cálculos complexos em um curto período de tempo.

Outra particularidade é o emaranhamento ou entrelaçamento, que liga duas ou mais partículas de tal maneira que uma passa a responder às mudanças das outras, mesmo que estejam separadas por enormes distâncias. Dá para saber características de uma partícula só observando as outras às quais está entrelaçada.

Achou estranho? Albert Einstein também, por isso chamou essa propriedade de "ação fantasmagórica à distância". Mas não é assombração, é pura física.

Graças a tudo isso, os qubits traduzem um escopo maior de processamento de informações e analisam diversas hipóteses ao mesmo tempo, chegando a um resultado muito mais rápido que um bit convencional. Enquanto dois bits avaliam uma combinação de cada vez (0 e 0, por exemplo), um par de qubits analisa quatro pares de informação simultaneamente (0 e 0, 0 e 1, 1 e 0, 1 e 1).

Nova lógica = supercálculos

Em um computador clássico, os chips são compostos por módulos, que contêm portas lógicas onde funcionam os transistores. O transistor é a maneira mais simples de processar dados em computadores e funciona como um interruptor, que controla a entrada de informações.

Uma porta lógica normal atinge um conjunto de entradas simples e produz uma saída definida. Se fosse um labirinto, um chip clássico teria de percorrer cada caminho até o final para ver se é o certo; se não fosse, voltaria ao início para trilhar o seguinte até achar o correto.

Em um circuito quântico, a informação passa adiante sem precisar das funções lógicas presentes em circuitos clássicos, mas de qubit em qubit. Essa forma diferente de transmissão é responsável pelas altas velocidades da computação quântica. No mesmo labirinto, um chip quântico percorreria todos os caminhos de uma vez e acharia a saída quase que instantaneamente.

Imagine quatro bits ao lado de quatro bits quânticos. Ambos podem chegar a 16 combinações diferentes de quatro 0s ou 1s. Só que, enquanto o bit faz uma combinação de cada vez, o qubit faz todas as 16 de uma vez. Com isso, se você estiver atrás da resposta 1111 e ela for a última combinação possível, o bit terá de fazer 15 outras até chegar a ela. Já o qubit a atinge instantaneamente.

Para se ter ideia do tamanho das questões que podem ser resolvidas, vamos analisar a capacidade de armazenar informação de um circuito quântico: ela aumenta exponencialmente a cada novo qubit adicionado.

Se 30 qubits guardam o equivalente a 16 gigabyte, ao acrescentar mais 10 qubits, a capacidade aumenta mil vezes e vai a 16 terabyte. Ao subir para 50 qubits, chega a 16 petabyte. A partir de 230 qubits, estamos falando de uma quantidade equivalente a todos os átomos do Universo visível.

Delicado equilíbrio

Tudo que os processadores quânticos têm de poderosos, eles têm de instáveis. Quanto mais qubits juntos, mais imprevisíveis são. Como suas características especiais são conferidas por partículas muito pequenas, qualquer perturbação no ambiente pode fazer a informação que carregam se perder, mesmo variações mínimas de temperatura ou vibrações imperceptíveis.

O principal desafio da construção de um computador quântico funcional não é uma questão de empilhar a maior quantidade possível de qubits. É evitar que esses ruídos perturbem o frágil equilíbrio das partículas.

Por isso, são utilizados supercondutores que operam a baixíssimas temperaturas. Os componentes dos computadores quânticos são armazenados dentro de um refrigerador que mantém os qubits bem calminhos, a temperaturas próximas do zero absoluto (-273ºC). É mais gelado do que no espaço sideral.

Como alguns elementos eletrônicos não funcionam quando estão resfriados a esse ponto, parte dos circuitos fica fora do refrigerador, enviando sinais por meio de cabos. Mas esse processo gera calor, que pode deixar os qubits agitados e atrapalhar a inclusão de novos qubits. Como não há receita para solucionar esses problemas, cada empresa dessa corrida quântica adotou uma estratégia diferente. Será que o Google cruzou mesmo a linha de chegada?

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Tradutor: Qubit extrapola o bit, pois pode ser informação 0 e 1 ao mesmo tempo