"Não acessamos dados, nem Pequim pediu isso", diz presidente da Huawei
A gigante chinesa é líder mundial em tecnologia 5G, mas tida como ameaça à segurança de dados. Em exclusiva à DW, seu presidente, Liang Hua, assegura que Pequim nunca exigiu fornecimento de dados.
O campus da gigante chinesa de tecnologia Huawei, na cidade de Shenzhen, está repleto de árvores, pequenos lagos e edifícios elegantes. Jovens funcionários andam pelo lugar vestidos casualmente de jeans e tênis, os paletós são raros. Na hora do almoço, tiram-se sonecas sobre colchonetes especialmente disponibilizados. A atmosfera é calma, ninguém diria que a Huawei está envolvida numa competição global pelo futuro das redes de dados do mundo.
A empresa é líder global em tecnologia de internet de quinta geração (5G), criada para alimentar tudo, de carros e fábricas automatizadas a cidades inteligentes e a "internet das coisas" (IoT). A empresa também é a maior fornecedora mundial de infraestrutura para essas redes.
Lutando pela sobrevivência
No entanto, a Huawei está na defensiva desde que os Estados Unidos, sob o presidente Donald Trump, a acusaram de representar uma ameaça à sua segurança nacional. Washington afirma que a Huawei pode ser usada para facilitar a espionagem pelo Partido Comunista da China. Em maio de 2019, os EUA impediram as empresas americanas de fazerem negócios com a Huawei sem uma licença especial.
Em conversa com a editora-chefe da DW, Ines Pohl, em Shenzhen, o presidente da Huawei, Liang Hua, explicou como a empresa está lidando com seus desafios atuais.
"Depois que a Huawei entrou na lista de boicite dos EUA, ficamos como um avião cheio de buracos, mas continuamos voando e voltamos para casa. Temos que resolver muitos problemas e consertar esses buracos um por um, como redesenhar alguns de nossos produtos e garantir a continuidade do fornecimento. Apesar de toda a pressão, nossa prioridade máxima é assegurar a sobrevivência."
Num evento em junho, o fundador da Huawei, Ren Zhengfei, disse esperar que as receitas da empresa caiam em US$ 30 bilhões nos próximos dois anos. Segundo Liang, a empresa agora está focada na expansão em lugares onde é bem-vinda: "A Huawei se concentra mais nos países e regiões onde opera, e nos esforçamos para expandir nossos negócios nesses lugares."
Para fazer smartphones que funcionem, a Huawei ainda precisa de software e semicondutores fabricados por produtores de chips dos EUA, como Intel e Qualcomm. Especialistas afirmam que a inclusão na lista negra não afeta apenas a empresa chinesa, mas também prejudica empresas americanas.
Além disso, algumas redes rurais nos EUA ainda usam hardware da Huawei. Para minimizar a interrupção, o Departamento de Comércio dos EUA emitiu uma suspensão temporária da sanção. O órgão permite a exportação "limitada" de itens fabricados nos EUA para a Huawei, e a empresa atende a redes existentes em áreas rurais americanas que dependem da Huawei para funcionar.
Essa suspensão "temporária" foi prorrogada pela terceira vez em novembro.
Tecnologia chinesa
Poucas empresas globais podem produzir a infraestrutura e o hardware necessários a construir redes 5G de maneira tão barata e confiável quanto a Huawei.
De acordo com a plataforma de análise de tecnologia Iplytics, sediada em Berlim, a Huawei atualmente possui mais patentes 5G do que qualquer outra empresa em todo o mundo, e também é líder em contribuições para as especificações técnicas dos padrões 5G.
Críticos ocidentais temem que o futuro da tecnologia 5G seja definido pela Huawei e controlado por Pequim. Mas Liang rejeita esses temores, ressaltando que sua empresa busca cooperação global para criar a tecnologia que impulsionará o futuro digital de alta velocidade.
"Não queremos ser de mente estreita e seguir um caminho em que criamos tudo sozinhos. Estaríamos isolados se usássemos apenas produtos desenvolvidos por nós mesmos", sublinha Liang. "Se você olha a cadeia de suprimentos da Huawei, fica claro que continuamos confiando na globalização."
Mas as ações do governo dos EUA estariam forçando a Huawei a projetar e desenvolver ela mesma muitos componentes que integram seus produtos: "Ficamos sem outra opção, a não ser tomar as rédeas em nossas próprias mãos para garantir nossa sobrevivência. Se o governo americano permitir suas empresas voltarem a fornecer para a Huawei, continuaremos comprando componentes dos EUA para construir nossa cadeia de suprimento", afirmou.
Ameaça?
As autoridades americanas temem que o papel pioneiro da Huawei na 5G possa ser explorado pelas autoridades chinesas para espionagem global, exigindo acesso a dados ou interferindo em servidores. Os temores são agravados por a China desenvolver tecnologia de vigilância maciça, sistemas de censura e controle rígido sobre todos os aspectos da vida pública.
Trump alega que a Huawei é "muito perigosa". Mas Liang discorda, garantindo que as redes de sua firma são confiáveis. "Nunca no passado a Huawei recebeu pedidos para fornecer informações ao Estado. E mesmo que recebêssemos esses pedidos no futuro, não concordaríamos com eles. Sem solicitações legais, não faremos nada", assegurou, acrescentando que os temores sobre a possibilidade de ela vir a acessar dados de usuários são infundados. "A Huawei apenas fornece equipamentos e não participa de operações de rede; portanto, não temos acesso aos dados do usuário."
A Alemanha está trabalhando num pacote de leis que regulamentará a futura rede de dados do país. Berlim não excluiu a Huawei, desde que a empresa cumpra os requisitos de segurança e privacidade de dados necessários. "A Alemanha propôs que se estabeleçam padrões mais altos, e eles devem ser aplicados a todos os participantes de todo o setor, para garantir a segurança cibernética. A Alemanha está indo muito bem nesse sentido", elogiou Liang.
Operadoras do pais, como Deutsche Telekom, Vodafone e Telefónica, estão adotando uma estratégia de "vários fornecedores" para a construção de redes 5G. Até o momento, apenas a Telefónica nomeou publicamente a Huawei como parceira 5G. Segundo Liang, sua empresa quer "fazer sua parte" na implantação do 5G na Alemanha.
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