Raios ultravioleta podem destruir vírus, mas efeito não é imediato
Rodrigo Lara
Colaboração para Tilt
15/05/2020 04h00Atualizada em 15/05/2020 18h34
Sem tempo, irmão
- Raios UV causam mutações e inutilizam diversos bactérias e vírus, como SARS-CoV 2
- Efeito só ocorre com um tipo de radiação, UV-C, e tempo para acabar com vírus pode variar
- Exposição excessiva à radiação também pode causar problemas para humanos
Nós já mostramos aqui algumas iniciativas tanto no Brasil quanto no exterior que usam raios ultravioleta (UV) para desinfetar superfícies e ambientes. A ideia, claro, é combater a presença do SARS-CoV 2, o novo coronavírus, em locais como hospitais.
Mas como esse tipo de radiação age sobre o vírus? Ao contrário da água e sabão, do álcool e da água sanitária, os raios ultravioleta não destroem a camada externa feita do coronavírus, que é feita de gordura.
"A radiação ultravioleta atua sobre os ácidos nucleicos, o DNA e o RNA, no caso, dos organismos, promovendo mutações. Quando um organismo é exposto a uma dose alta dessa radiação, muitas mutações desse tipo irão ocorrer, o que o leva à morte", explica Beny Spira, professor associado do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICMBio-USP).
Mas, vírus não podem ser considerados necessariamente seres vivos, daí não podem ser "mortos". Neste caso, a "bagunça" que a radiação UV causa no DNA e/ou no RNA dos vírus, impedindo que eles façam aquilo que sabem fazer de melhor: se reproduzir. Ou seja: eles são inativados.
Além de causar mutações degenerativas, a devida intensidade de radiação UV pode causar outro efeito nos vírus: destruir a proteção de seu material genético.
"O capsídeo protéico dos vírus [uma espécie de camada de proteção que envolve o DNA e/ou o RNA dos vírus] também pode sofrer alterações químicas quando a radiação UV é maior do que 1000 mW.s/cm2, causando a ruptura do capsídeo e degradação do material genético", explica Clarice W. Arns, professora titular do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB-Unicamp).
Nem toda radiação UV serve
É importante salientar que não existe só um "tipo" de raio ultravioleta. Há três tipos semelhantes, mas variam na capacidade de penetração e comprimento de onda.
"Dessas, o UV-C é considerado germicida, ou seja, capaz de inativar bactérias, fungos e vírus em superfícies, ar e ambientes", explica Cecília Benazzato, biomédica e doutoranda em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP).
Além do UV-C, que tem um comprimento de onda de 100 a 280 nanômetros, há ainda:
- UV-A (onda entre 320 e 400 nm): correspondente a 95% da luz ultravioleta existente na Terra e capaz de penetrar na camada mais profunda da pele humana, causando envelhecimento precoce
- UV-B (onda entre 280 e 320 nm), que causa queimaduras na pele diante de uma exposição longa e pode causar mutações genéticas que resultam em câncer de pele
Isso explica por que a luz solar —que contém todas as variações da radiação UV— tem propriedades germicidas.
Mas não vá pensando que simplesmente deixar objetos expostos ao Sol é garantia de que eles estarão livres de vírus e bactérias. Aqui, a eficiência da luz solar depende de vários fatores, como horário do dia, localização geográfica e época do ano.
"Como a camada de ozônio da atmosfera bloqueia parte dos raios UV, podemos não obter a total destruição de bactérias, fungos e vírus em roupas, superfícies, ar etc. Se as roupas estiverem úmidas pelo suor e forem expostas ao Sol, o efeito pode ser o contrário: aumentar a proliferação de bactérias, porque a umidade impede que os raios penetrem no interior das fibras do tecido", explica Benazzato.
Na prática
Outro fator a ser considerado é que, mesmo quando bombardeados por radiação UV-C emitida por dispositivos especializados, os vírus não são inativados instantaneamente.
Em testes realizados na Unicamp, três aparelhos —dois para uso localizado (dois tipos de câmara de raios UV-C) e um para uso em área (uma torre com lâmpadas que emitem raios UV-C)— foram avaliados.
Todos eles foram capazes de inativar os vírus, mas o tempo para isso acontecer variou entre um minuto, no caso dos aparelhos de uso localizado, e 15 minutos, no caso da torre com lâmpadas.
A ideia é que eles possam ser usados de maneira mais abrangente, sem que haja a necessidade da aquisição de equipamentos especializados e caros que usam os raios para fins germicidas.
"O grande problema nesse momento de pandemia é que tudo é urgente. Então estamos fazendo equipamentos com ex-alunos que se mostrem alternativas pequenas, mas muito eficientes, para desinfetar máscaras e ambientes. A ideia é que sejam coisas simples e efetivas que qualquer lugar possa ter", explica Arns.