Como os sites de fake news ganham dinheiro? Entenda esquema de publicidade
No início desse mês, um relatório produzido a pedido da CPI das Fake News identificou que a Secretaria de Comunicação Social (SECOM) investiu mais de R$ 2 milhões em anúncios veiculados em sites de notícias falsas, infantis ou até mesmo de pornografia. O secretário de comunicação social, Fábio Wajngarten, creditou o erro ao Google AdSense. "Todos os erros que forem detectados na Secom, a Secom vai ao Google pedir o ressarcimento ou pedir a equiparação futura numa campanha futura", explicou. Wajgarten se referia, na verdade, à publicidade programática.
Essa é uma das maneiras mais utilizadas para anunciar em sites da internet. Funciona assim: a partir de informações sobre o tipo de público que o anunciante deseja alcançar, um algoritmo identifica as páginas na internet que costumam ser acessadas por essa mesma audiência. E, então, a ferramenta cuida sozinha de fazer a programação da distribuição das propagandas. Por exemplo: se você é dono de uma empresa que vende chimarrão, pode direcionar seus anúncios apenas a indivíduos adultos que residem na região Sul do país. Além do Google Ads, há outras, como o UOL Ads, Facebook Ads, a MediaMath e a Criteo. Algumas são mais restritivas em sua rede de sites parceiros; outras, como Google e Facebook, são mais abertas —a partir de critérios mínimos, é possível registrar-se.
O processo é vantajoso tanto para quem anuncia, já que a distribuição é bem ampla e diversa, mas também para quem quer bancar o seu próprio website: em outros tempos, pequenos veículos de comunicação, que exercem cobertura local, por exemplo, dificilmente estariam entre as opções dos grandes anunciantes. Henrique Matos, diretor de Parcerias de Mídia no Google Brasil, explica que o modelo permite que um anunciante apareça em veículos do Brasil inteiro, o que também abre um canal de monetização muito maior para a sobrevivência dos veículos de comunicação especializados. "O investimento de publicidade sempre esteve concentrado em veículos do eixo Rio-São Paulo", diz ele.
Os filtros de controle estão à disposição de ambos os lados desse negócio. Assim como o dono de uma página direcionada a crianças pode bloquear anúncios de bebidas alcoólicas, por exemplo, o anunciante pode escolher não aparecer em sites em que o tema principal é a política. Ou até mesmo em sites específicos.
O anunciante recebe das plataformas um relatório completo que permite saber como determinada propaganda está sendo recebida pelo público. "É possível saber em quais sites os anúncios estão sendo veiculados, que tipo de serviço esse site oferece, quantos cliques e visualizações receberam, quanto você pagou. A empresa tem um relatório com 100% das informações", explica o especialista em marketing digital Hilário Júnior.
No caso do Google, o anunciante paga conforme o acordo realizado —por impressões, isto é, quando um anúncio foi baixado e exibido no celular ou computador, ou por cliques, quando o usuário clica neste anúncio. As plataformas de mídia programática também podem permitir que os editores sejam pagos por métricas personalizadas. Uma delas é a taxa de cliques (CTR, ou click-through rate em inglês), que equivale ao número de cliques no anúncio dividido pelo número de visualizações do site —quanto maior essa porcentagem, maior o pagamento ao editor.
E é aqui que está parte do problema. Para inflar essa porcentagem e receberem remuneração significativa, sites menores precisam obter mais audiência —e, assim, muitos deles apelam para sensacionalismo, cópia de conteúdo e notícias falsas ou difamatórias.
Como barrar?
Está nas mãos do anunciante a iniciativa de definir quais sites mostrarão os anúncios, criando segmentações de perfil. Mas, no caso do Google, citado por Wajgarten, a ampla rede de sites cadastrados ainda não é capaz de impedir que sites de fake news ou com conteúdo gráfico continuem a ser oferecidos no pacote de publicidade.
Na prática, é quase impossível para o anunciante conhecer o perfil e o histórico de todos os sites que usam a plataforma e saber se são corretos ou adequados ao perfil do anúncio, especialmente daqueles que se passam por veículos sérios de notícias —como uma máquina vai ser capaz de detectar esse tipo de conteúdo?
De acordo com o diretor do Google, para um cadastro bem-sucedido, o site precisa cumprir todas as políticas da empresa para que possam ser qualificados para a monetização. Depois disso, a moderação acontece por inteligência artificial. Eles reconhecem que as ferramentas ainda não atingiram a excelência desejada. A empresa diz que em 2019 removeu 2,7 bilhões de anúncios ruins e encerrou 1,2 milhão de contas de editores. Mas muitos problemas ainda passam pela peneira da inteligência artificial da gigante tecnológica. Para um ambiente seguro, Matos incentiva que o público denuncie essas páginas por meio de uma conta Google - se for constatada a violação das diretrizes, os editores perdem o direito à monetização.
Segundo Hilário Júnior, sabendo disso, as empresas de marketing digital já possuem uma lista de sites maliciosos e de palavras negativas que usam para evitar que os anúncios dos clientes acabem em páginas problemáticas.
"Os anunciantes que não têm essas listas não estão fazendo o mínimo para a publicidade programática. Mesmo com o filtro de discurso de ódio ligado, meu cliente apareceu no Jornal da Cidade Online [reconhecido por veicular fake news] em matérias que deflagraram ódio, por exemplo", diz Júnior.
Esse é o motor por trás do tão comentando perfil no Twitter Sleeping Giants Brasil, que expõe os anúncios dos grandes anunciantes em sites que veiculam fake news. Depois de esvaziar a rede de anunciantes do Jornal da Cidade, agora a campanha tem como alvo o site Brasil Sem Medo.
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