Rastreio de mensagens no WhatsApp não resolve fake news, diz associação
Diante das polêmicas envolvendo as regras propostas pelo "PL das Fake News", aprovado pelo Senado no mês passado, a associação Data Privacy Brasil divulgou nesta segunda-feira (27) uma nota técnica com as suas preocupações quanto ao atual texto do projeto de lei 2630/20 que será votado (ainda sem data definida) pela Câmara dos Deputados.
Para a organização, a proposta de rastrear o encaminhamento de mensagens em aplicativos como WhatsApp, Telegram e Signal apresenta falsa solução para o problema da desinformação e fere a presunção de inocência do usuário. Além disso, ela não apresenta garantias de que a regra não possa ser burlada, por exemplo, por plataformas de disparo de mensagens em massa.
"Supondo que fosse tecnicamente e juridicamente possível o rastreamento, não existe comprovação, estudo, ou caso em nenhuma parte do mundo em que o método se demonstrou eficaz no combate à desinformação", explicou a Associação em seu documento, que traz um olhar jurídico sobre a questão.
O que o PL diz hoje sobre a rastreabilidade
O "PL das Fake News" define hoje que, se uma mensagem for compartilhada para mais de cinco pessoas ou grupos e atingir mais de mil pessoas, as empresas responsáveis devem coletar dados como:
- Data e hora de envio
- Endereço IP (Internet Protocol)
- Identificação das pessoas que a transmitiram
- Quantas pessoas foram impactadas pela mensagem
As empresas também devem armazenar essas informações por até três meses. Caso exista uma investigação, os dados devem ser fornecidos mediante a decisão judicial.
As regras acima valem para serviços de mensagens com mais de 2 milhões de usuários.
E por que a proposta é questionada?
Segundo a avaliação jurídica da Data Privacy Brasil, alguns dos problemas seriam:
- Guardar os metadados dos usuários "flexibiliza garantias constitucionais" ao considerar todos eles como suspeitos, indo contra o princípio da presunção de inocência das pessoas;
- O metadado engloba vários tipos de dados, como dados sobre o usuário que realiza a comunicação, localização, tipo de mensagem, a rede utilizada, horário, duração. Assim, a preocupação da organização é de que, quando essas informações forem agregadas e analisadas, existe o risco de permitir "perfilhamento comportamental do indivíduo bastante intrusivo". Ou seja, os donos desses sites saberiam bastante sobre nós.
- A identificação do autor de um conteúdo considerado ilegal ignora o fato de que alguns conteúdos são compartilhados em diferentes plataformas. Por exemplo, vídeos do YouTube no WhatsApp, e capturas de tela do Twitter e do Facebook.
- A criação de um sistema rígido ou padronizado para rastrear mensagens pode abrir oportunidades da criação de técnicas para "enganar o sistema", isto é, manipular o sistema para obter resultados.
"Medidas que exigem o monitoramento e armazenamento de dados de mensagens (metadados), mesmo que haja critérios para esse rastreamento, geram mais riscos do que benefícios", destacou a Data Privacy Brasil.
O que eles recomendam?
A associação acredita que os esforços para combater a desinformação devem mirar em como os dados do usuário são coletados e processados para espalhar propagandas políticas e campanhas de fake news.
Por isso, é preciso políticas de transparências que vão além do financiamento, principalmente no caso de conteúdos políticos. O ideal é que envolva também o ciclo de tratamento de dados pessoais, esclarecer métodos de criação de perfis e prestação de contas de como os dados foram usados para enviar determinadas mensagens a determinados grupos.
O objetivo da Data Privacy Brasil agora é que a Câmara dos Deputados considere a sua nota técnica em suas discussões sobre o projeto de lei e que a proposta de rastreabilidade possa ser revista.
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