Equipamentos UV não são 100% eficazes para eliminar coronavírus, diz Anvisa
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) publicou nesta semana uma nota técnica na qual reforça que não há evidências científicas de que a luz ultravioleta (UV) seja eficaz como única forma de eliminar o coronavírus, numa resposta a diversas iniciativas pelo Brasil e pelo mundo que têm usado essa tecnologia para tentar desinfetar ambientes públicos e hospitalares.
Segundo a Nota Técnica 64/2020, só foram encontradas evidências da eficácia do UV em condições "muito específicas e controladas quanto à área irradiada, ângulo de exposição, intensidade e dose de radiação, sobre superfícies lisas e limpas".
Por isso, a agência não recomenda o uso de ultravioleta para matar o vírus "como única alternativa". Além disso, pede para evitar o manuseio dessa radiação em mãos ou outras zonas da pele "pelos potenciais efeitos adversos conhecidos", como efeitos agudos na pele e olhos, além de afetar o DNA de tecidos com potencial de formar células cancerígenas.
Por fim, o órgão diz que os equipamentos de UV criados para desinfetar ambientes públicos e superfícies precisam comprovar sua eficácia junto à Anvisa, com a área técnica responsável pelo registro de saneantes.
Diversos estabelecimentos públicos dentro e fora do Brasil apostaram bastante em equipamento UV nos últimos meses. Alguns exemplos:
- Na China, um robô da UVD Robots passou a limpar ambientes com a radiação, e a expectativa era de ser usado em mais de 2.000 hospitais.
- Em março, a Santa Casa da Misericórdia de São Carlos (SP) recebeu do Instituto de Física da USP (Universidade de São Paulo) dois rodos UV-C para a descontaminação dos pisos do hospital.
- Em São Paulo, o Colégio Dante Alighieri instalou uma mesa que emite radiação ultravioleta para fazer a higiene de livros que entram e saem da biblioteca.
- Redes de supermercado, como o Carrefour, instalaram cabines UV para descontaminação de carrinhos cheios de compras.
O que ele faz, afinal?
Segundo especialistas ouvidos por Tilt em maio, esse tipo de radiação não destrói a camada externa do coronavírus, feita de gordura —algo que água e sabão, álcool e água sanitária conseguem fazer. Por outro lado, tem potencial para enfraquecer a reprodução do organismo.
A radiação UV "bagunça" o DNA e/ou o RNA dos vírus, promovendo mutações e impedindo que eles façam aquilo que sabem fazer de melhor: se reproduzir. Ou seja: eles são inativados.
"Quando um organismo é exposto a uma dose alta dessa radiação, muitas mutações desse tipo irão ocorrer, o que o leva à morte", explicou Beny Spira, professor associado do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICMBio-USP).
Além disso, a devida intensidade de radiação UV pode causar outro efeito: destruir a proteção do material genético dos vírus.
"O capsídeo protéico dos vírus [uma espécie de camada de proteção que envolve o DNA e/ou o RNA dos vírus] também pode sofrer alterações químicas quando a radiação UV é maior do que 1000 mW.s/cm2, causando a ruptura do capsídeo e degradação do material genético", explicou Clarice W. Arns, professora titular do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB-Unicamp).
Mas nem toda radiação serve para esse uso. Há três tipos semelhantes, mas variam na capacidade de penetração e comprimento de onda.
- UV-C (onda de 100 a 280 nanômetros): é considerado germicida, ou seja, capaz de inativar bactérias, fungos e vírus em superfícies, ar e ambientes
- UV-A (onda entre 320 e 400 nm): correspondente a 95% da luz ultravioleta existente na Terra e capaz de penetrar na camada mais profunda da pele humana, causando envelhecimento precoce
- UV-B (onda entre 280 e 320 nm), que causa queimaduras na pele diante de uma exposição longa e pode causar mutações genéticas que resultam em câncer de pele
Isso explica por que a luz solar —que contém todas as variações da radiação UV— tem propriedades germicidas. Mas não é simplesmente deixar objetos expostos ao Sol: a eficiência depende de fatores como horário do dia, localização geográfica e época do ano.
O texto da nota técnica da Anvisa informa que a OMS (Organização Mundial da Saúde) chegou a dizer que a luz UV é eficaz para inativar várias bactérias e vírus nas faixas de UV-B e UV-C entre 200-310 nm, com eficácia máxima em torno de 265 nm. Este uso foi comprovado sobretudo na água.
Mas não foram encontradas recomendações específicas do uso de UV para covid-19 em órgãos como a própria OMS, o Fórum Internacional de Regulação de Dispositivos Médicos (IMDRF), a Agência de Medicamentos e Alimentos dos EUA (FDA), o Centro de Controle de Doenças dos EUA (CDC) e a Anvisa.
Outro fator a ser considerado é que, mesmo quando bombardeados por radiação UV-C, os vírus não são inativados instantaneamente.
Em testes realizados na Unicamp, três aparelhos —dois para uso localizado (dois tipos de câmara de raios UV-C) e um para uso em área (uma torre com lâmpadas que emitem raios UV-C)— foram avaliados.
Todos eles foram capazes de inativar os vírus, mas o tempo para isso acontecer variou entre um minuto, no caso dos aparelhos de uso localizado, e 15 minutos, no caso da torre com lâmpadas.
A ideia é que eles possam ser usados de maneira mais abrangente, sem que haja a necessidade da aquisição de equipamentos especializados e caros que usam os raios para fins germicidas.
* Colaborou Rodrigo Lara
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