Futuro do iOS em risco? Por que guerra com empresa de games ameaça a Apple
Sem tempo, irmão
- Apple entrou em guerra com desenvolvedora de games dona do Fortnite
- Jogo foi removido da App Store após oferecer pagamentos sem "imposto da Apple"
- Epic Games acionou a Justiça e lançou campanha contra modelo de negócio da Apple
- Outras empresas, como Spotify, apoiaram postura da desenvolvedora
A Apple entrou nesta semana em uma das mais importantes batalhas de sua história recente. A abertura de uma guerra com a Epic Games, responsável pelo game Fortnite, pode redefinir a maneira como o iOS - e lojas de aplicativos em celulares - funcionam. E isso ameaça a empresa de Tim Cook.
O que rolou foi o seguinte: a Epic Games passou a dar a opção aos usuários de fazer transações em seu aplicativo fora do sistema da Apple - e, portanto, não repassando a taxa de 30% que a dona do iPhone cobra de transações em apps. A companhia norte-americana viu isso como um abuso de suas regras e deletou o game, que é um sucesso mundial.
A Epic Games sabia o que estava fazendo e fez de propósito, claro, já imaginando que seria banida tanto do sistema da Apple quanto do Google - sim, ela realizou a mesma ação na Play Store, que cobra os mesmos 30% da maçã em transações de aplicativos.
Isso foi o início de uma guerra que pode mudar a maneira como aplicativos passam monetizações às grandes plataformas de tecnologia.
Como funcionam as lojas de apps
A App Store foi uma revolução tecnológica possivelmente maior até do que o próprio smartphone. Criada em 2008 com apenas 500 aplicações disponíveis, ela já possui atualmente milhões de programas diferentes disponíveis para download.
Lojas de aplicativos aceleraram, de fato, revoluções na nossa vida digital possibilitadas por smartphones. Pense em Uber, Spotify, Instagram, WhatsApp, Waze e outras plataformas voltadas para o mobile que você começa a entender como nossa vida foi modificada graças a desenvolvedores que transformaram suas ideias em apps.
Dentro das lojas, os responsáveis pelos apps têm diversas opções de oferecer seus produtos. Um aplicativo pode ser totalmente de graça (como o WhatsApp), pode ter compras dentro para liberar algumas ações do app (como comprar vidas no Candy Crush ou remover propagandas em outros apps) ou pode até exigir um pagamento antes de ser baixado (como o jogo Minecraft).
É razoavelmente raro, até, encontrar aplicativos pagos nas lojas - os desenvolvedores sabem que poucas pessoas optam por pagar sem saber se vale a pena. Mesmo assim, seja em aplicativos pagos antes do download, em assinaturas feitas dentro do app ou em compras no aplicativo, uma coisa é certa: a Apple (e o Google, também) vão levar seus 30%.
Pense nesses 30% como uma espécie do "quinto", imposto cobrado por Portugal aos colonos do Brasil para cada ouro encontrado. No caso das grandes empresas de tecnologia, elas se justificam dizendo que oferecem o sistema operacional, a loja e uma base gigante de usuários possivelmente interessados. Mas isso tem causado mais e mais revolta - Tim Cook, chefão da Apple, teve até que se defender sobre isso no Congresso norte-americano.
Em respostas a questionamentos, Cook afirmou que a comissão de 30% cobrada por desenvolvedores é compatível com o mercado - o Google cobra o mesmo na Play Store - e que os desenvolvedores são tratados igualmente pela empresa. Ele ainda discordou de um questionamento sobre o que impediria a Apple de, de repente, aumentar a comissão para 50%.
Igualmente, no entanto, entre aspas: há alguns meses foi revelado um acordo com a Amazon em que filmes podem ser alugados ou comprados no Prime Video norte-americano sem passar pelo sistemas de pagamento da Apple (e sem a taxa de 30%). Ou seja: todos são tratados igualmente, exceto se você fizer um acordo bem feito com a Apple.
Campanha e apoio de outras empresas
Casos do tipo foram gerando "ranço" em desde pequenos desenvolvedores a até algumas empresas mais graúdas, como a Epic Games. Com um jogo com sucesso mundial estrondoso como Fortnite em mãos, ela lançou seu ataque à Apple.
Ela passou a oferecer duas opções de cobranças: uma tradicional que passa pela Apple e outra "por fora", em que são dados 20% de desconto ao usuário sob a alcunha de que estavam cortando a parte tomada pela Apple - ok, só não me pergunte onde estão os 10% restantes que deveriam ser repassados em desconto ao consumidor.
Ao ver a ação, a Apple entendeu como uma infração grave dos termos de uso de suas plataformas e baniu o Fortnite da App Store - o mesmo foi feito pelo Google.
A Epic Games rapidamente lançou uma campanha nas redes sociais com o termo #FreeFortnite, jogando a gigante comunidade gamer contra a Apple. Além disso, criou uma campanha publicitária inspirada no icônico comercial 1984 da Apple, usando elementos de Fortnite se rebelando contra "sistema vigilante" da Apple que controla tudo.Isso foi ainda acompanhado de um processo judicial da Epic Games contra a Apple e Google, levando a guerra aos tribunais.
Nos últimos dias, outras grandes empresas apoiaram a ação da Epic Games. O Spotify, que rivaliza com o Apple Music, apontou que "aplaude a ação da Epic Games de tomar uma posição contra os abusos da Apple de sua posição dominante". O Spotify já fez reclamações formais contra as taxas na União Europeia, citando que o Apple Music teria privilégios competitivos.
O Facebook, que também teve suas tretinhas e trocas de farpas recentes com a Apple, criticou o imposto de 30% após um novo recurso que permitirá a criação de eventos pagos no app também cair no imposto.
A briga da Apple com empresas de games é ainda maior. Recentemente, a maçã disse que serviços de jogos em nuvem como o Google Stadia ou o Microsoft xCloud não entrariam no iOS, já que não seria possível controlar os jogos disponíveis nesses serviços. A Microsoft criticou e chamou de políticas "rígidas demais".
Ao mesmo tempo, a Samsung provocou Google e Apple ao lembrar que a Galaxy App Store não baniu o Fortnite e é uma opção para continuar jogando o game em seus celulares.
Modelo de negócio em risco?
Todo esse holofote coloca um modelo de negócio vital para a Apple em risco. Cada vez mais a companhia foca em elementos não relacionados a vendas de produtos físicos para o crescimento da empresa - como sua linha cada vez maior de serviços de assinaturas, que já envolve streaming de músicas, streaming de séries e filmes, games e até notícias.
O caso todo ainda vem em um momento de pressão mundial contra as gigantes de tecnologia. As grandes empresas como Google, Amazon, Facebook e Apple são acusadas de abusos de mercado e práticas para minar competidores.
A guerra contra a Epic Games pode mudar o modelo de negócio da App Store ou, no mínimo, forçar a maçã a explicar melhor por que oferece vantagens para alguns aplicativos - sejam seus próprios ou os que ganham acordos - e outros não, em um mundo cada vez mais dependente do digital e marcado pelo duopólio em relação a sistemas operacionais de celulares.
A briga também promete ser uma grande queda de braço em que ganhará quem aguentar mais a pressão. De um lado, a Epic Games com um jogo que é sucesso mundial e tem milhões de fãs - muitos deles jovens - revoltados por não poderem jogar o game. De outro, a Apple, com um poder de mercado enorme e uma base de usuários que nenhum desenvolvedor pode negar a importância.
Aliás, chama a atenção a briga ser tão focada na Apple. Google, Sony (no PlayStation), Microsoft (com Xbox) e Nintendo também cobram taxas de 30% de desenvolvedores em microtransações.
No cenário mobile, isso pode ocorrer pela Apple ser um "jardim mais murado" do que o do Google - o Android é uma plataforma mais aberta e permite APKs para ultrapassar proibições na Play Store. Além disso, por mais que o Google tenha mais usuários no mundo com o Android, o iOS é conhecido por ser um sistema mais rentável para desenvolvedores - o usuário do iPhone está mais disposto a pagar por conteúdos do que o do Android.
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