Topo

Twitter e Google não se manifestam sobre excluir dados de criança estuprada

Sara Winter, durante manifestação do grupo 300 do Brasil, em Brasília - Getty Images
Sara Winter, durante manifestação do grupo 300 do Brasil, em Brasília Imagem: Getty Images

De Tilt, em São Paulo *

17/08/2020 18h58Atualizada em 17/08/2020 18h58

O Twitter e o Google Brasil não informaram se excluirão postagens em que a militante de extrema-direita Sara Fernanda Giromini, conhecida como Sara Winter, expôs uma criança de dez anos, grávida após estupro, autorizada a realizar um aborto no Recife (PE). A Justiça do Espírito Santo determinou em liminar (decisão provisória), que Facebook, Twitter e Google Brasil retirassem o conteúdo do ar.

As três plataformas emitiram notas à imprensa sobre o caso. Enquanto o Twitter e Google (dono do YouTube) afirmaram que não comentam casos específicos, o Facebook disse que excluiu um vídeo de Giromini sobre a menor.

A decisão atendeu a um pedido da Defensoria Pública do Estado, e as plataformas têm até 24 horas para obedecer a partir da intimação. Caso as empresas descumpram a medida, será aplicada uma multa diária de R$ 50 mil.

Em sua nota, o Twitter disse que coopera com as autoridades locais, respeita as ordens e requisições destinadas à empresa e "tem regras que determinam os comportamentos e conteúdos permitidos na plataforma, e violações a essas regras estão sujeitas às medidas cabíveis". A nota não explica se (e quando) os posts serão removidos.

O Google disse que todos os vídeos do YouTube precisam seguir as diretrizes de comunidade, "que incluem medidas de proteção ao bem-estar emocional ou físico de menores", mas não quis dizer quais medidas foram todas. A revisão do conteúdo, afirmou a empresa, usa "sistemas inteligentes, revisores humanos e denúncias de usuários para identificar conteúdo suspeito" para agir "rapidamente sobre aqueles que estão em desacordo com nossas políticas."

Em nota, o Facebook também não comentou o caso, mas emitiu nota dizendo que o vídeo de Giromini foi removido da plataforma "por violar nossas políticas ao promover potenciais danos a pessoas no mundo offline de forma coordenada."

Sara Winter divulgou na tarde de domingo (16) o endereço da unidade de saúde em que acontece o procedimento, revelou o primeiro nome da criança e usou o termo "aborteiro" para se referir ao suposto médico que realizaria o procedimento. Em seguida, pediu que seus seguidores rezassem e "colocassem os joelhos no chão".

De acordo com a Polícia Civil do Espírito Santo, a criança de dez anos era estuprada havia quatro anos e engravidou. O tio, de 33 anos, foi indiciado pelo crime, mas está foragido. O caso chegou à polícia no dia 8 de agosto, quando ela deu entrada num hospital público da cidade de São Mateus, a 220 km de Vitória, com suspeita de gravidez.

Segredo de Justiça e exposição da criança

Em um trecho da decisão, o juiz de plantão ressalta que "não se pretende obstar o direito à liberdade de expressão, o qual é, inclusive, constitucionalmente assegurado, à luz do art. 5º, inciso IV da CF, entretanto, consoante se extrai dos autos os dados divulgados são oriundos de procedimento amparado por segredo de justiça".

À reportagem, a defensora pública Maria Gabriela Agapito, coordenadora de Promoção e Defesa aos Direitos das Mulheres, disse que Sara "fez uma exposição à identidade da criança, expondo sua integridade física e psicológica, sobretudo porque foi indicada a localização do hospital no Recife, gerando toda uma situação".

Ela explicou ainda que a ação judicial indica postagens a serem removidas, mas que a Defensoria está monitorando e "assim que identificarmos outras de mesmo teor, estaremos indicando, até mesmo dentro desse mesmo processo por meio de um aditamento".

As postagens da ativista de extrema-direita levaram dezenas de pessoas se reuniram em frente ao hospital pernambucano para protestar contra o procedimento. Houve confusão no local.

"Incitar as pessoas a irem até o local é incitar violência contra a criança e contra os profissionais de saúde que irão atendê-la. Ela [Sara] precisaria ser investigada por meio de inquérito policial e pela promotoria da infância e da juventude", disse Ariel de Castro, advogado especialista em direitos da infância e juventude consultado por Universa.

A Justiça do Espírito Santo autorizou a realização do aborto, mas o Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam) se negou a realizar o procedimento. Por isso, a criança foi levada ao Recife, onde conseguiu expelir o feto espontaneamente, após indução iniciada ontem à noite pela equipe médica do Cisam (Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros), ligado à UPE (Universidade de Pernambuco).

À reportagem, o Hucam disse que "realiza o procedimento de interrupção da gravidez tão somente nos casos permitidos pela legislação e constantes em protocolo instituído pelo Ministério da Saúde". Juristas discordam e dizem que, há sim, amparo legal.

A reportagem questionou a Secretaria de Estado da Saúde, para saber se não haveria outra unidade hospitalar que pudesse fazer o procedimento, evitando essa viagem até o Recife. Mas não houve retorno até o momento.

Sara Winter, que já fez parte do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, da ministra da Damares Alves, foi presa em junho pela Polícia Federal por sua participação nos chamados "atos antidemocráticos", que pediam fechamento do STF (Supremo Tribunal Federal) e do Congresso Nacional. Libertada, ela agora usa tornozeleira eletrônica.

Às 18h deste domingo, duas horas depois da exposição da criança em rede social, o Twitter já acumulava mais de 12 mil posts sobre o caso. A publicação de Sara, que tem 43 mil seguidores, tinha 900 curtidas.

* Colaborou Lucas Rezende