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Sob 3º presidente, Sirius abre para pesquisas em marco da ciência nacional

Sirius, acelerador de partículas situado em Campinas (SP) - Henrique Grandi/UOL
Sirius, acelerador de partículas situado em Campinas (SP) Imagem: Henrique Grandi/UOL

Gabriel Francisco Ribeiro

De Tilt, em São Paulo

21/10/2020 17h55

Sem tempo, irmão

  • Com presença de Bolsonaro, Sirius abre primeira estação de pesquisas
  • Acelerador teve obras iniciadas no governo Dilma e foi inaugurado por Temer
  • Estação de pesquisa estava sendo usada em caráter emergencial contra coronavírus
  • Sirius ainda constrói outras estações e coloca a ciência brasileira em novo patamar

O acelerador de partículas Sirius foi aberto oficialmente para pesquisas nesta quarta-feira (21) em evento com a presença do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ele é o terceiro presidente a inaugurar uma etapa de uma das maiores obras da ciência nacional. Mas o mandato de Bolsonaro pegou apenas a parte final da obra, com a construção das suas linhas de pesquisa e início dos testes de funcionalidade.

Orçada em R$ 1,8 bilhão, a obra foi aprovada ainda sob o governo Dilma Rousseff (PT), com a construção iniciada no fim do primeiro mandato da ex-presidente, em 2014. O acelerador foi inaugurado em 2018, com a presença do então presidente Michel Temer (PMDB). Coube, agora, a Bolsonaro abrir a primeira linha de pesquisa.

"É fantástico, faltam palavras para definir esta obra. Ela materializa para nós o futuro. Isso demonstra a capacidade do pesquisador e cientista brasileiro", disse Bolsonaro em evento em Campinas (SP).

Nesta quarta, o Sirius inaugurou oficialmente a primeira linha de pesquisa do projeto, chamada Manacá. Ela já estava aberta para pesquisas em caráter emergencial sobre o coronavírus enquanto ainda passava por ajustes. Agora, ficará disponível para outros pesquisadores.

9.jun.2016 - A presidente afastada, Dilma Rousseff, é alvo de selfies de operários das obras do Sirius, novo acelerador de partículas brasileiro que está sendo construído pelo Laboratório Nacional de Luz Sincrotron, em Campinas (SP). Dilma visita a cidade para encontro com cientistas - Dario Oliveira/Código19/Estadão Conteúdo - Dario Oliveira/Código19/Estadão Conteúdo
Ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em visita às obras do Sirius em 2016
Imagem: Dario Oliveira/Código19/Estadão Conteúdo

Michel Temer (PMDB, 3º da esq. para dir.) em evento de inauguração de etapa do Sirius - César Itiberê/PR - César Itiberê/PR
Michel Temer (PMDB, 3º da esq. para dir.) em evento de inauguração de etapa do Sirius em 2018
Imagem: César Itiberê/PR

Jair Bolsonaro (sem partido) e ministro Marcos Pontes em evento no Sirius em 2020 - Wagner Souza/Futura Press/Estadão Conteúdo - Wagner Souza/Futura Press/Estadão Conteúdo
Jair Bolsonaro (sem partido) e ministro Marcos Pontes em evento no Sirius em 2020
Imagem: Wagner Souza/Futura Press/Estadão Conteúdo

Segundo os responsáveis pelo projeto, a estação terá instrumentos que permitem revelar as estruturas de proteínas em três dimensões, além de mostrar enzimas humanas e patógenos com resoluções que não podem ser obtidas em equipamentos convencionais.

Uma das técnicas permite revelar a posição de cada um dos átomos de uma determinada proteína e suas funções e interações com outras moléculas, que podem ser usadas como princípios ativos de novos medicamentos.

Ainda em fase de comissionamento científico, a Manacá poderá apoiar o avanço de pesquisas em áreas como biotecnologia industrial, agricultura, nutrição e busca de novos candidatos a remédios para Alzheimer, câncer, esquizofrenia e doenças do coração, dentre outras, de acordo com os pesquisadores do Sirius.

Estão previstas as entregas de 13 cabines de pesquisa na primeira fase do projeto, que trabalharão com diferentes feixes de luz para pesquisadores. A capacidade total de estações de pesquisa poderá chegar a 40 até o fim do projeto.

O que é o Sirius

O gigantesco acelerador de partículas, quase do tamanho do estádio do Maracanã, tem 518 metros de circunferência e 68 mil m². Foi construído na zona rural da cidade, no campus do Cnpem (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais), entidade mantida e supervisionada pelo MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações).

A nova arma da pesquisa nacional é um laboratório de quarta geração de luz síncrotron e substituirá o UVX, outro laboratório com essa finalidade (e bem menor) que também fica no campus do Cnpem. O Sirius coloca a ciência nacional em um novo patamar e sua capacidade só pode ser comparada ao Max-IV, situado na Suécia.

O enorme anel metálico serve para fazer circular feixes de elétrons de forma tão rápida que formam linhas de luzes — as tais luzes síncrotron. Essa luminosidade funciona como um poderosíssimo raio-X, capaz de analisar rapidamente a estrutura interna de materiais orgânicos e inorgânicos sob diferentes espectros da luz.

Dentro do Sirius, os elétrons dão cerca de 600 mil voltas por segundo. Os elétrons partem de um metal aquecido do tamanho de uma moeda e são guiados por sistemas injetores, estruturas com micro-ondas e imãs até atingirem o acelerador principal e, então, gerar luz que sai para as cabines de pesquisa que ficam perpendiculares ao acelerador.

O feixe de luz que sai para as pesquisa é 35 vezes menor que um fio de cabelo. As cabines são de diferentes formatos para contemplar sua pesquisa. As maiores delas chegam a sair da circunferência do Sirius, se estendendo por mais de 100 metros.

O prédio inteiro foi construído com proteções contra vibração, controle de temperatura e estabilização, já que qualquer leve alteração estrutural pode afetar a aceleração dos elétrons.

Marcos do acelerador

Nos últimos anos, o Sirius tem alcançado marcos importantes, mesmo após sofrer com a perda de verbas para a construção a partir de 2016. Após a inauguração em 2018, o acelerador em 2019 obteve a primeira volta completa de elétrons no tubo principal, o que mostrou que a obra era funcional.

Ainda em 2019 o instrumento conseguiu obter as primeiras imagens em um teste com tomografias de rocha e coração de um camundongo. Já neste ano o acelerador foi usado em pesquisas sobre o coronavírus, revelando detalhes inéditos do organismo.

Após ser inaugurado, o Sirius poderá ser usado para diferentes pesquisas. As imagens feitas pelo laboratório de um mineral similar ao do pré-sal brasileiro podem revelar as interações de líquidos com a rocha e levar à descoberta de novas substâncias para a indústria petrolífera.

Em outra situação, ao estudar a estrutura de uma ponte, é possível olhar para uma rachadura e saber como ela surgiu ao longo do tempo.

O Sirius reflete a importância, sempre dita por cientistas, de apoio à ciência e tecnologia. Essas áreas são consideradas um "investimento" e não gasto, por possibilitarem retorno direto em pesquisas e patentes nacionais. Um exemplo disso é a necessidade do país ter que pagar royalties para receber vacinas estrangeiras contra a covid-19, como a de Oxford ou da China.

Controle de radiação

Se você ficou preocupado com a radiação envolvida nesse gigante, saiba que as medições são feitas na porta do acelerador. Mas, de qualquer forma, não estamos falando de algo perigoso.

Ainda assim, para evitar que isso aconteça, são várias etapas de proteção:

  • Isolamento do ambiente (paredes de concreto com espessura que varia entre 0,80 m a 1,5 m).
  • Monitoramento constante dos níveis de radiação auditado por comissão externa
  • Recursos que detectam quando há alguém no túnel e impedem a máquina de ser ligada
  • Travas de segurança ao longo dos 581 metros do equipamento devem ser desativadas para funcionar
As medições são feitas de uma forma que a radiação medida na porta do acelerador seja a mesma de uma praça qualquer de Campinas.