Embrião de rato cresce em útero artificial; meta é fazer o mesmo em humanos
Um grupo de cientistas de Israel conseguiu o feito inédito de manter um embrião de rato se desenvolvendo até o 12º dia dentro de um útero artificial. O período, que corresponde à metade do tempo gestacional da espécie, foi suficiente para que o filhote começasse a desenvolver cabeça, membros e todos os órgãos principais.
O estudo, publicado na última quarta-feira (17) na revista científica britânica Nature, levantou uma série de questões éticas, a começar pela possibilidade de que o experimento seja reproduzido futuramente com embriões humanos.
Jacob Hanna, biólogo do Instituto Weizmann de Ciência que coordenou a equipe de pesquisa, disse, em entrevista ao MIT Technology Review, que os resultados preparam o terreno para estudos com outras espécies. "Espero que isso permita aos cientistas cultivar embriões humanos até a quinta semana."
Segundo ele, os embriões de laboratório poderiam ser uma importante fonte de tecidos para tratamentos médicos. "Em vez de obter tecido de abortos, vamos pegar um blastocisto [estrutura do embrião nos primeiros estágios de desenvolvimento] e cultivá-lo", afirmou.
Como o estudo foi feito
Para conseguir desenvolver o embrião de rato por tanto tempo fora do útero, a equipe liderada por Hanna trabalhou por seis anos na criação de um sistema complexo, que inclui garrafas rotativas e cheias de nutrientes.
Como os embriões de rato só crescem corretamente após um tempo fixados no útero real, os pesquisadores não puderam fazer todo o processo de gestação no laboratório. Em vez disso, eles coletaram embriões de uma fêmea grávida até o quinto dia e os colocaram em placas de cultura, onde ficaram até o sétimo dia. Só então, eles seguiram para o sistema de garrafas rotativas.
Segundo o estudo, além de conter os nutrientes necessários para o crescimento das células, as garrafas de vidro giratórias ajudavam a fornecer o oxigênio e a pressão atmosférica ideais, o que segundo Hanna era um dos fatores mais críticos do experimento.
Os embriões só morreram no 12º dia, porque se tornaram grandes demais para o oxigênio se difundir por eles, uma vez que não contavam com o suprimento de sangue natural da placenta.
Barreiras às pesquisas com embriões humanos
Trabalhar com embriões humanos de maneira semelhante é um interesse de Hanna. No entanto, ele reconhece que a pesquisa entraria em conflito direto com a discussão sobre aborto, pois caso conseguisse desenvolver o equivalente humano dos ratos de 12 dias, seria possível ver um corpo parcialmente definido, com cabeça e alguns membros já reconhecíveis.
Atualmente, experimentos que envolvem o desenvolvimento de embriões humanos vivos em laboratório são limitados pela chamada "regra dos 14 dias". Segundo essa diretriz, os embriões obtidos por fertilização in vitro só podem ser cultivados por até duas semanas.
Porém, uma importante organização de pesquisa sobre células-tronco, a International Society for Stem Cell Research (ISSCR), tem planos de recomendar a rescisão da proibição. Segundo Hanna, isso permitiria a ele cultivar embriões humanos em sua incubadora. Bastaria que os conselhos de ética de Israel aprovassem —o que ele acha bastante possível.
"O benefício de cultivar embriões humanos até a semana três, semana quatro, semana cinco é inestimável. Acho que esses experimentos deveriam pelo menos ser considerados. Se pudermos chegar a um embrião humano avançado, podemos aprender muito", disse Hanna.
Ele afirma que é possível tornar essas pesquisas mais aceitáveis, limitando, por exemplo, o potencial de desenvolvimento completo. Segundo ele, uma possibilidade é instalar mutações genéticas para evitar que o coração sequer chegue a bater.
Nova era de estudos com embriões humanos
Na mesma edição da Nature em que saiu o resultado da pesquisa coordenada por Hanna, foi publicado um relatório sobre os primeiros modelos de embriões humanos criados em placas de Petri.
O texto menciona dois estudos que mostraram como células-tronco embrionárias humanas ou células reprogramadas de tecidos adultos podem ser induzidas a se autoorganizar em uma placa de Petri, formando estruturas semelhantes aos primeiros embriões humanos.
Estes blastoides podem ajudar a melhorar tecnologias de reprodução assistida e o entendimento sobre os estágios iniciais do desenvolvimento, além de poderem ser uma alternativa mais acessível à ideia de Jacob Hanna, de utilizar blastocistos para obter tecidos úteis em tratamentos médicos. Os estudos, porém, têm limitações e detalhes que ainda precisam ser explicados, mas apontam para uma nova era da ciência sobre o desenvolvimento inicial humano.
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