Rubia Gouveia, a cientista que usa nanocelulose para nos salvar da poluição
Desde a infância em Loanda, uma cidadezinha no interior do Paraná, Rubia Gouveia sempre teve grandes sonhos, mas que a levaram a trilhar caminhos literalmente pequenos: estudar partículas com milionésimos de milímetro para salvar o meio ambiente.
Ela é especialista em desenvolver compostos renováveis usando resíduos de biomassa (material orgânico) vegetal — especialmente a nanocelulose retirada do bagaço da cana.
Uma de suas principais descobertas foi a espuma "verde", totalmente natural e reutilizável, capaz de absorver óleos e outros poluentes da água.
A decisão de ser cientista veio no segundo ano do curso de química, na Universidade Estadual de Maringá. Ela então partiu para um pós-doutorado na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e no King's College London, na Inglaterra, e tornou-se pesquisadora no LNNano (Laboratório Nacional de Nanotecnologia), do CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais), em Campinas (SP).
No principal centro de pesquisa em nanomateriais do Brasil, ela trabalha para achar materiais alternativos e renováveis que nos salvem do colapso global. Gouveia conta que quer deixar um legado mais sustentável para as próximas gerações.
"A pesquisa dos meus sonhos seria voltada para o meio ambiente, com aproveitamento de recursos sustentáveis para uma melhor qualidade de vida da população", conta a Tilt.
A pesquisadora defende que a nanocelulose possui um papel revolucionário por ser "eco-friendly" (amigo do ambiente) e versátil.
"É uma estrutura bastante atraente: um material obtido de fontes naturais, biodegradável e renovável, que pode ser facilmente modificado e combinado para substituir aditivos à base de derivados de petróleo", explica.
Ao usar a nanocelulose em materiais porosos, como espumas, esponjas e aerogéis, os cientistas puderam criar matéria-prima para produção de isolantes térmicos e acústicos, sensores, tecidos, dispositivos de armazenamento e geração de energia e separadores e purificadores de água, por exemplo.
A espuma superabsorvente que criou usando nanocelulose e látex de borracha natural "suga" em poucos segundo e grandes quantidades — até 50 vezes a sua massa — óleos, combustíveis, solventes e outras substâncias.
Pode ser muito útil em ações de despoluição da água, como derramamentos, além de ser reutilizável.
A grande sacada deste produto foi a combinação com o látex — normalmente, seria utilizado algum derivado de petróleo para dar liga na estrutura e manter sua forma. Sozinha, a nanocelulose desmancharia na água. Com mais pesquisas, esse composto pode encontrar novas e diversas aplicações na indústria e em produtos.
"A biodiversidade brasileira nos coloca na dianteira mundial da produção de biomassas vegetais", ressalta Gouveia. "E nós conseguimos extrair nanoestruturas de plantas, como a nanocelulose, de eucalipto e de bagaço de cana-de-açúcar, e o látex de borracha natural, da seringueira."
Nanofibras de celulose são obtidas de resíduos de biomassas em geral, então algo que seria descartado vira tecnologia com alto valor agregado.
A cientista lembra que essas fontes renováveis já fornecem nanocompósitos "verdes" para aplicações como adesivos, insumos biodegradáveis para embalagens, aditivos para cosméticos e remédios. Com o progresso da indústria, acredita ela, em um curto prazo, a nanotecnologia será parte integrante do nosso dia a dia.
"Este impacto depende dos investimentos em ciência e tecnologia, pois são avanços altamente dependentes de recursos."
Além do LNNano, outras instituições brasileiras têm sediado pesquisas com estruturas renováveis, como a nanocelulose. É o caso da Embrapa, USP (Universidade de São Paulo), Universidade Federal do ABC e Unicamp. Gouveia diz que o país deu um salto nos estudos do ramo de nanotecnologia com a inauguração do Sirius, nosso acelerador de partículas de luz síncrotron de 4ª geração.
"É uma poderosíssima ferramenta. A caracterização de nanoestruturas no estado da arte, que o Sirius permite, é o grande diferencial no Brasil", diz.
Os nanomateriais baseados em materiais de carbono, como o grafeno, são as maiores conquistas dos pesquisadores brasileiros da área, dignos de reconhecimento internacional, ressalta, mas ainda faltam verbas para que muitos estudos possam sair do papel e avançar.
"Ressalto fortemente a necessidade de investimentos em recursos humanos, por meio de bolsas de graduação, pós-graduação e pós-doutorado. As agências de fomento têm um papel muito importante no desenvolvimento e manutenção das nossas pesquisas no dia a dia. Nós precisamos manter as pessoas na ciência", defende.
Este texto faz parte da série "Made In Brazil", que descreve o trabalho de 12 cientistas brasileiros que brilham criando supermateriais (e já falou sobre os cientistas que estão revolucionando o combate ao coronavírus). Estudando partículas de um milionésimo de milímetro, eles se debruçam para achar respostas capazes de revolucionar o futuro da humanidade. Leia mais aqui.
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