Só intervenção estatal é capaz de pôr limites em filhos loucos por games?
As novas regras chinesas que proíbem crianças e adolescentes com menos de 18 anos de jogarem videogame por mais de três horas por semana repercutiram não só no país.
Jovens chineses foram às redes sociais expressar revolta e investidores manifestaram preocupações com o impacto de longo prazo à indústria, mas pais ao redor do mundo também pararam para pensar sobre como lidar com filhos que não largam os games.
As autoridades argumentaram que as restrições são necessárias para conter o "vício", e um jornal oficial do Partido Comunista afirmou que o governo teve que ser "implacável" porque jogos online prejudicam a vida normal de estudos e a saúde mental dos adolescentes. As limitações foram vistas como uma tentativa de Pequim de promover a primazia do socialismo e fortalecer controles sobre a sociedade que agora teria se tornado muito relaxada após anos de crescimento laissez-faire do setor de tecnologia e outras indústrias.
"Este grupo de avôs e tios que fazem essas regras e regulações já jogou games? Entendem que a melhor idade para jogadores de e-sports é na adolescência?", disse um comentário no Weibo, equivalente da China ao Twitter. "Consentimento sexual aos 14 anos, aos 16 você pode trabalhar, mas tem que ter 18 para jogar games. É uma piada mesmo."
Apesar de o golpe às ações de empresas de jogos ter sido relativamente modesto, analistas dizem que as implicações ao crescimento em longo prazo da indústria são muito mais severas. "O problema é que essa medida destrói toda a natureza da formação do hábito de jogar games em uma idade mais jovem", afirmou o analista Mio Kato.
O governo jogou para as empresas a implementação da lei —sendo que as crianças podem contornar as regras que exigem nome e número de identificação nacional para se inscrever nos games usando login de membros adultos da família.
"É uma questão de educação familiar, não de games", afirmou um gamer de 17 anos que quis ser identificado apenas pelo seu sobrenome, Luan.
Alguns pais como Li Tong, diretor de hotel em Pequim com uma filha de 14 anos, ficou animado com as novas regras. "Minha filha fica colada ao celular após o jantar todos os dias por uma ou duas horas e é difícil impedi-la." "Dissemos a ela que é ruim para os seus olhos e desperdiça o seu tempo, mas ela não ouve."
Do outro lado do oceano, Raleigh Smith Duttweiler estava dobrando a roupa lavada em sua casa no Estado de Ohio enquanto seus filhos jogavam o game Minecraft no andar de cima, quando escutou uma reportagem no rádio sobre novas regras na China.
"Oh, está aí uma ideia", pensou Duttweiler, que trabalha na área de relações públicas em uma organização sem fins lucrativos. "Meu instinto de americana me diz: esse é um tipo de restrição de direitos e ninguém tem o direito de dizer o que fazer dentro de nossas casas".
"Por outro lado, não é muito bom para as crianças jogarem tanto quanto mesmo os meus filhos jogam. E eu acredito sim que seria muito mais fácil desligar o jogo se aquilo não significasse uma discussão com a mãe, mas fosse algo na linha de "foi a polícia que mandou".
Para Duttweiler e para muitas famílias fora da China, as notícias dessa rígida medida de intervenção social no país —que, segundo o governo chinês, era necessária para frear um vício crescente no que já foi descrito como um "ópio espiritual"— ressalta um desafio para regular o uso de videogames dentro de suas próprias casas, especialmente durante a pandemia.
Paul Morgan, um pai de dois adolescentes e professor da Universidade Penn State que pesquisa o uso de dispositivos eletrônicos, vê falhas na proibição, ao mesmo tempo em que reconhece o desafio de controlar o tempo de tela das crianças. "Os dispositivos eletrônicos são onipresentes", disse Morgan. "É hora de afastar as crianças deles". (Com Reuters)
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