Em 3 pontos: entenda MP de Bolsonaro que atinge as redes sociais
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assinou na segunda-feira (6) uma medida provisória (MP) que altera o Marco Civil da Internet, lei que regula o uso da web no Brasil desde 2014. Na prática, a mudança dificulta o trabalho de provedores como Facebook, Twitter, Instagram, YouTube e outras redes sociais, de remover contas, perfis e conteúdos que quebrem suas regras.
Segundo a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República, a alteração "objetiva maior clareza quanto a políticas, procedimentos, medidas e instrumentos" para cancelamento ou suspensão de conteúdos e contas, exige "justa causa e motivação" e prevê direito de restituição do conteúdo, alegando liberdade de expressão.
Para as redes sociais atingidas pela MP, porém, a ação do presidente "limita de forma significativa a capacidade de conter abusos nas nossas plataformas, algo fundamental para oferecer às pessoas um espaço seguro de expressão e conexão online", disse o YouTube em nota enviada a Tilt.
Entenda a decisão do presidente de regular a remoção de posts das redes sociais em três pontos.
Posts apagados
Bolsonaro tem elevado as críticas às plataformas nos últimos meses após ter diversas postagens ocultadas ou limitadas por espalhar "desinformação médica sobre a covid-19".
O YouTube já removeu dezenas de vídeos publicados por Bolsonaro, incluindo registros de transmissões ao vivo, que faziam apologia do chamado "tratamento precoce" contra a covid-19 com cloroquina e da ivermectina —apesar de não existir qualquer comprovação científica para isso.
Um vídeo postado por Bolsonaro no Facebook e no Instagram também foi removido pelos mesmos motivos. Em 2020, o Twitter apagou dois posts dele com vídeos em que ele aparecia provocando aglomerações, criticando medidas de isolamento contra a pandemia e propagandeando remédios sem eficácia contra a covid.
Em fevereiro, numa conversa com apoiadores na entrada do Palácio do Planalto, Bolsonaro reclamou do Facebook e disse que a plataforma estaria impedindo o envio de fotos de notas fiscais de combustíveis pela plataforma — um pedido feito pelo presidente para se defender de críticas pela alta nos preços.
Na ocasião, o presidente também falou em tributar as empresas de mídia social. "O governo federal também, junto com o Parlamento, [tem que] criar uma legislação, taxar mais ainda esse pessoal [redes sociais] que paga muito pouco de imposto para operar dentro do Brasil", declarou.
Em 2019, o presidente também reclamou da decisão do WhatsApp de limitar o encaminhamento de mensagens a apenas cinco contatos —medida que a empresa diz ter tomado para evitar a propagação de notícias falsas dentro do app. "Uma maneira de me cercear foi diminuir o alcance do WhatsApp", disse Bolsonaro em uma live nas redes sociais. "Há censura em cima disso. Temos que lutar contra isso."
Em maio deste ano, Bolsonaro disse que estava "na iminência" de fazer "um decreto para regulamentar o Marco Civil da Internet". Ele reclamou que tem uma das redes sociais com mais interações no planeta, mas que ele e aliados são "cerceados". Por isso, ao decreto serviria para garantir "liberdade e punições" para os que não respeitassem certas regras.
Em fevereiro, o presidente também falou em tributar as empresas de mídia social. "O governo federal também, junto com o Parlamento, [tem que] criar uma legislação, taxar mais ainda esse pessoal [redes sociais] que paga muito pouco de imposto para operar dentro do Brasil", declarou.
Fake news em massa
Embora as redes sociais sempre tenham sofrido muita pressão para melhorar o nível da moderação de conteúdo, a pandemia as colocou em outro patamar. Com a disseminação de informações falsas sobre o coronavírus, elas começaram a agir com mais rigor para remover conteúdos desinformativos, etiquetar publicações com links para fontes confiáveis ou mesmo excluir usuários que repetidamente infringissem suas regras.
Um grupo de pesquisadores da UFPEL (Universidade Federal de Pelotas) analisou dados de 4.256 páginas e grupos na rede social de Mark Zuckerberg para observar a disseminação de informações sobre a covid-19. E o resultado provou o que muita gente já imaginava: circula no Facebook muito mais desinformação sobre saúde do que conteúdo confiável.
Segundo o estudo, apenas 10% dos grupos e páginas abertos da rede que compartilham desinformação também compartilham a checagem dos fatos.
Mas as fake news são um problema cada vez mais sério no Brasil há mais tempo. Em 2018, só nos dois meses que antecederam o primeiro turno das eleições majoritárias que elegeram o presidente Jair Bolsonaro, o projeto Comprova checou e desmentiu 106 fake news. Algumas delas já fazem parte do imaginário do eleitor (vai dizer que você nunca ouviu falar na tal da mamadeira?).
As fake news também marcaram 2016, ano das eleições dos EUA vencidas por Donald Trump e o referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia (o Brexit). Chegamos a este ano e as fake news sobre coronavírus foram tantas que a OMS (Organização Mundial de Saúde) cunhou até um novo termo: infodemia.
"Essas campanhas digitais baseadas na desinformação já ocorrem desde a primeira década do século. O marco zero do uso maciço de dados e algoritmos para distribuir notícias falsas talvez seja o Brexit, no Reino Unido", explica Hartmut Glaser, secretário executivo do CGI.br (Comitê Gestor da Internet), órgão que cria diretrizes sobre o uso da internet no Brasil.
Inspiração em Trump
A "infodemia" nas redes sociais não é o único elemento que o Brasil tem em comum com os Estados Unidos. Por lá, o ex-presidente Donald Trump também tomou uma atitude semelhante à de Bolsonaro, assinando, em maio de 2020, um decreto que responsabilizava judicialmente redes sociais pelo conteúdo publicado pelos usuários.
Na prática, a decisão facilitou que empresas de tecnologia, como Facebook, Google e Twitter — que, na época, havia acabado de marcar posts do então presidente americano como "potencialmente enganosos" — pudessem ser processadas e punidas se usuários publicassem conteúdo contra a lei, como pedofilia e atos de terrorismo.
O decreto de Trump foi revogado em maio deste ano pelo atual presidente americano, Joe Biden, eleito em 2020 para substituir Trump. Mas o interesse do governo Bolsonaro em copiar o movimento americano contra as redes sociais começou a surgir ali, com aliados compartilhando nas redes sociais interesse em importar o tema.
*Com reportagem de Fabiana Uchinaka, Rodrigo Trindade e Fausto Fagioli Fonseca
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.