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Massa de 450 toneladas: brasileiro filma impacto de asteroide em Júpiter

Júpiter, o planeta mais antigo do Sistema Solar - Reprodução/Nasa/ESA/Goddard Space Flight Center/University of California
Júpiter, o planeta mais antigo do Sistema Solar Imagem: Reprodução/Nasa/ESA/Goddard Space Flight Center/University of California

Marcella Duarte

Colaboração para Tilt, em São Paulo

20/09/2021 16h46

O astrônomo amador José Luis Pereira, de São Caetano do Sul (SP), ganhou destaque nos últimos dias. O brasileiro conseguiu um feito raríssimo: registrou o violento impacto de um asteroide no planeta Júpiter. Uma descoberta que movimentou a astronomia mundial, e que pode levar a importantes estudos sobre o Sistema Solar.

Na imagem, capturada com uma câmera acoplada a um telescópio, o impacto aparece como um flash de luz, bem brilhante, na região equatorial do gigante gasoso. Foi neste momento que a rocha espacial — um asteroide ou cometa — se desintegrou ao entrar em altíssima velocidade na enorme atmosfera de Júpiter.

O evento ocorreu às 19h39 (horário de Brasília) da última segunda-feira (13), enquanto Pereira observava o planeta, como de costume.

"Era o primeiro vídeo da noite e eu ainda estava ajustando os parâmetros de captura. Iniciei a gravação e estava olhando para os controles de ajuste, então percebi o flash com o canto dos olhos", contou a Tilt. "No momento, não dei muita importância, pois a noite estava bastante nublada e eu tive de alterar muitos dos parâmetros com os quais estou habituado a capturar."

Pereira foi descansar e deixou um programa de computador analisando os vídeos feitos ao longo da noite. Na manhã seguinte, viu o alerta do programa para uma alta possibilidade de impacto.

"Sou um observador planetário assíduo. Monitoro os planetas Júpiter e Saturno há muitos anos, desde 2017. Estava fazendo observação de rotina, procurando especificamente por impactos", conta.

Pereira faz parte do DeTeCt, um projeto colaborativo amador/profissional na busca por impactos e outras mudanças nos planetas gasosos, idealizado pelo astrônomo francês Marc Delcroix — que também analisou o vídeo e confirmou a descoberta. Dados estatísticos do grupo apontam que, anualmente, acontecem 11 impactos em Júpiter e 22 em Saturno.

Mas qual era o tamanho do asteroide?

"Baseado em um impacto semelhante ocorrido em 2019, que gerou um flash de luz um pouco menor do que este, a estimativa é de que o bólido tenha entre 12 e 16 metros de diâmetro, e uma massa de aproximadamente 450 toneladas", diz Pereira.

Com essas dimensões, relativamente pequenas em termos astronômicos, a rocha não deixou nenhuma "cicatriz" escura na atmosfera do planeta, carregada de nuvens turbulentas e coloridas, pois não deve ter chegado a suas camadas mais profundas.

Após a divulgação de Pereira, astrônomos do mundo inteiro procuraram pelo impacto em suas gravações. O momento também foi capturado por um francês e um alemão.

Júpiter é o maior planeta do Sistema Solar, com um diâmetro de quase 140.000 km. Para efeitos comparativos, a Terra tem pouco mais de 12.700 km. Com esses números em mente, dá para entender o quão enorme foi o flash observado por Pereira.

"Júpiter é um gigantesco 'aspirador de pó' do Sistema Solar. Objetos que poderiam atingir outros planetas interiores, como a Terra, são 'sugados' por ele", explica Julio Lobo, astrônomo do Observatório de Campinas (SP).

O primeiro e maior impacto que já registramos por lá aconteceu em 1994, quando o enorme cometa Shoemaker-Levy 9, fragmentado em diversos pedaços quilométricos, bombardeou o planeta ao longo de seis dias. Foi tão intenso que deixou marcas escuras na atmosfera, que levaram meses para desaparecer por completo, apagadas pelo vento.

A observação deste processo, principalmente por meio das imagens do Telescópio Espacial Hubble, trouxe dados inéditos e muitas descobertas. Os estudos também confirmaram uma teoria importante: os planetas gigantes gasosos foram fundamentais na formação planetária.

"Júpiter e Saturno tiveram um papel essencial na formação dos planetas rochosos — Mercúrio, Vênus, Terra e Marte. Atraindo detritos, foram limpando a região orbital em que eles se posicionaram, permitindo que o Sistema Solar chegasse à configuração atual", explica Marcelo De Cicco, astrônomo do projeto Exoss.

Entender a dinâmica do Sistema Solar e o comportamento de todos seus corpos celestes é fundamental para decifrarmos a origem do nosso planeta, da vida, e o futuro da Terra. Estes eventos sempre soam o alerta da defesa planetária — no caso do cometa Shoemaker-Levy 9, se tivesse nos atingido, seria provavelmente um evento devastador como o que extinguiu os dinossauros.

A tecnologia tem nos permitido observações cada vez melhores e mais frequentes. Assim, podemos também prever possíveis impactos futuros. Com a popularização e barateamento de câmeras e equipamentos, mais pessoas estão fazendo registros, seja de pequenos meteoros que caem aqui ou de grandes cometas e asteroides ao longe. Quase nada nos céus nos passa despercebido.

"A persistência, constância e disciplina do José Luis foram fundamentais. Mesmo com condições climáticas que não estavam satisfatórias, cumpriu o que foi planejado para aquela noite. Ele está de parabéns por ter feito esse registro inédito no Brasil", comenta Lobo.