Sonha com piso autolimpante? A ciência pode torná-lo realidade
Pesquisadores criaram um novo revestimento, à base de compostos de dióxido de titânio e sílica com propriedades autolimpantes, para ser aplicado em pisos cerâmicos. O material permite que os pisos, após terem contato com fontes de luz, degradem poeira, gordura, resquícios de remédios e poluentes atmosféricos que se depositam em sua superfície.
Os resultados obtidos por cientistas do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da USP e do Instituto de Química (IQ) da Unesp, em Araraquara, geraram artigo publicado na revista científica internacional Materials Advances, da Royal Society of Chemistry.
Segundo os cientistas, o novo revestimento poderá ajudar na manutenção da limpeza de residências e hospitais, gerando até mesmo economia com a higienização dos espaços.
Os pesquisadores estão abertos a parcerias com a indústria para que o novo material seja inserido no mercado.
O revestimento é formado por nanopartículas de sílica (SiO2) e dióxido de titânio (TiO2), dois compostos que são encontrados na natureza na forma de minerais. Para testar a eficiência da solução, os pesquisadores prepararam um experimento com dois grupos de peças cerâmicas: um com pisos que imitam os convencionais vendidos no mercado e outro com pisos tratados com o novo revestimento.
Os cientistas simularam um processo de degradação, aplicando um corante lilás às peças. Após 30 minutos de iluminação com radiação ultravioleta, os resultados mostraram que, enquanto os pisos comerciais degradaram apenas 30% do corante, os materiais com o novo revestimento limparam 90% da tinta.
"Os pisos autolimpantes vendidos atualmente no mercado são revestidos apenas com dióxido de titânio e possuem funções de limpeza limitadas. Isso porque, durante a fabricação das peças, elas são submetidas a processos de queima industrial que podem chegar a 1.200ºC, afetando o material", explica Ubirajara Rodrigues Filho, professor do IQSC e um dos autores do trabalho.
"Quando os pisos cerâmicos são expostos a altas temperaturas, o dióxido de titânio se transforma e suas propriedades autolimpantes diminuem", conta o docente.
Por conta dessa limitação, os pesquisadores precisaram buscar alternativas para garantir que as peças suportassem o superaquecimento, que é fundamental para que as cerâmicas resistam a riscos, absorvam menos água e suportem melhor o peso, além de favorecer a fixação adequada de seus componentes.
Após uma série de estudos, eles encontraram na sílica a solução, pois descobriram que o material de baixo custo, quando utilizado em conjunto com o dióxido de titânio, conferia mais estabilidade térmica ao revestimento. Nos testes realizados com peças que foram submetidas a temperaturas de 1.200ºC, os pesquisadores observaram que a sílica não só protegeu o dióxido de titânio, evitando que ele perdesse suas propriedades, como até aumentou a atividade autolimpante do revestimento.
Ação do revestimento
A função de autolimpeza ocorre, basicamente, pela atuação do dióxido de titânio, material capaz de absorver energia de fontes de luz para realizar determinada tarefa; no caso do revestimento para pisos, a de degradar poluentes orgânicos. Quando o piso é exposto à radiação ultravioleta (que pode vir do Sol, por exemplo), ele transforma essa radiação em energia química para degradar a sujeira.
Na prática, isso auxilia na higienização dos locais, garantindo mais segurança, além de evitar o desgaste estético dos pisos. "Em ambientes externos, por exemplo, o revestimento pode ser útil para preservar estruturas e paredes de edifícios, pois evita o acúmulo de contaminantes", explica Elias Paiva Ferreira Neto, pesquisador do IQ e um dos autores da pesquisa.
"Você pode ativar luz ultravioleta em uma sala hospitalar para que o dióxido de titânio presente nos pisos limpe a matéria orgânica em sua superfície, permitindo, inclusive, a economia de produtos de limpeza. Outra aplicação seria em casa, em um piso externo de uma churrasqueira, cenário em que a luz incidiria na cerâmica fazendo com que ela degrade gordura e poeira", comenta o engenheiro de materiais formado pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP, Victor Martinez, que participou do trabalho durante sua iniciação científica (IC) realizada no laboratório do professor Ubirajara.
Nos próximos passos do estudo, os pesquisadores pretendem verificar se o piso com o novo revestimento também possui atividade contra fungos, vírus e bactérias. Em teoria, o mecanismo responsável por degradar a sujeira também pode atuar na desinfecção das peças, eliminando agentes patológicos. Caso essa nova função seja comprovada, as novas cerâmicas poderiam, além de limpar compostos orgânicos, ajudar na esterilização de ambientes.
O trabalho contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Além de pesquisadores do IQSC-USP e do IQ-Unesp, participaram do trabalho cientistas do Instituto de Física da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), do Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE) da Unesp, em Rio Claro, do Instituto Fraunhofer de Tecnologia de Manufatura e Materiais Avançados, na Alemanha, e do Instituto de Química da Universidade de Peshawar, no Paquistão.
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