Como brasileira usa IA para descobrir os mistérios dos buracos negros
Sabia que se você cair perto de um buraco negro que está girando, você obrigatoriamente vai girar junto com ele? Desvendar os segredos por trás do objeto mais misterioso do universo faz parte da vida da brasileira Roberta Duarte, 25, aluna de doutorado do Instituto de Astronomia e Geofísica da USP (Universidade de São Paulo).
A curiosidade sobre o efeito do buraco negro sobre os humanos próximos a ele foi compartilhada pela jovem em seu perfil no Twitter, rede social que ela utiliza como parte de seu trabalho de divulgadora científica. Atualmente, ela tem 21,9 mil seguidores. E seu papel na ciência vai muito além.
Com ajuda de inteligência artificial, a pesquisadora realizou uma raríssima simulação de buracos negros como parte de sua pesquisa de mestrado. Os resultados foram publicados no arXiv, arquivo da Universidade de Cornell para estudos científicos em campos como o da física, matemática e computação.
Em setembro, o anúncio de sua participação em uma palestra na XVI Semana da Física da Universidade de Brasília para falar sobre seu estudo com buracos negros rendeu quase mil curtidas e vários comentários. E sua fama não fica restrita ao site do passarinho azul. Mestre em astrofísica, ela também faz roteiros de vídeos o canal do YouTube Ciência Todo Dia, que soma mais de 2 milhões de inscritos.
Em entrevista para Tilt, a pesquisadora brasileira fala sobre seu trabalho e sobre como inteligência artificial e astronomia se misturam.
Tilt: Como funciona a simulação de um buraco negro por meio da inteligência artificial?
Roberta Duarte: Primeiramente, nós precisamos ensinar para o computador [o que fazer]. Usamos uma técnica de machine learning [aprendizado de máquina] chamada deep learning [aprendizado profundo]: utilizando dados de simulações numéricas e equações que descrevem um fluido em torno de um buraco negro para cada instante de tempo.
Queríamos quantificar o quanto da física a IA conseguiria aprender e, se o modelo, depois de treinado, conseguiria simular sozinho a dinâmica do disco de acreção [matérias, gás ou plasma que se movem em espiral em torno de um objeto celeste] de um buraco negro. Nós conseguimos que o modelo fizesse a simulação corretamente apenas aprendendo a física via outras simulações.
Tilt: Quais as vantagens dessa simulação?
RD: A primeira é que, do ponto de vista científico, o estudo mostra que seria possível acelerarmos simulações de buracos negros, que são importantes para entendermos como esses objetos se comportam.
A segunda é do ponto de vista da inteligência artificial. É interessante submeter IAs para resolverem problemas complexos e entendermos qual o limite que essas ferramentas possuem.
Tilt: Como foi e quanto tempo o estudo durou?
RD: Dividimos o trabalho em duas partes. A primeira é da IA conseguir simular um modelo que só ela já viu, o que teve uma duração de seis meses a um ano, entre aprender as ferramentas, propor o algoritmo, preparar os dados, treinar e analisar os resultados. Mas treinando mesmo, durou apenas algumas horas.
Já a segunda parte, que envolve a IA aprender com várias simulações e representar um sistema que ela nunca tinha visto antes, levou cerca de seis meses.
Tilt: E quem participou dessa pesquisa complexa?
RD: O trabalho foi feito por mim, pelo meu orientador Rodrigo Nemmen [astrofísico e professor da USP] e por um colaborador da Nvidia [empresa de computação gráfica], João Paulo Navarro.
Tilt: E como a "mágica" acontece na prática?
RD: Nós alimentamos um bloco de frames [quadro de vídeo] para a IA já treinada e ele retorna com os próximos estados que aquele disco de acreção terá.
É como dar um quadro de um vídeo de uma bola caindo, e a IA conseguir antecipar a trajetória da bola nos próximos quadros. Ela sempre prevê como vai ser o estado futuro, após o frame que demos a ela.
Tilt: Quais foram os recursos tecnológicos que você usou?
RD: Usamos duas GPUs [processador gráfico de computador, responsável por renderizar imagens] que foram contribuições da Nvidia para a realização desse projeto.
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