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5G: empresas novatas conseguirão quebrar 'monopólio' da Claro, Vivo e Tim?

Fachada da sede da Brisanet, empresa cearense que vai virar operadora para Nordeste e Centro-Oeste - Marília Camelo/UOL
Fachada da sede da Brisanet, empresa cearense que vai virar operadora para Nordeste e Centro-Oeste Imagem: Marília Camelo/UOL

Abinoan Santiago e Felipe Oliveira

Colaboração para Tilt, em Florianópolis e São Paulo*

05/11/2021 10h30Atualizada em 05/11/2021 18h28

A exploração e oferta de internet 5G no Brasil levará aos consumidores uma novidade para além da própria tecnologia, que é vinte vezes mais rápida: novas operadoras de telefonia móvel em mercados regionais e uma mudança no domínio da empresas tradicionais Claro, Vivo e Tim.

Brisanet, Cloud2U, Consórcio 5G Sul e Winity Telecom são exemplos de empresas que poderão a partir de agora atuar como operadora regionais do 5G após arremataram lotes para oferta da conexão em cidades menores nas cinco regiões brasileiras.

Os arremates, segundo alguns dos especialistas ouvidos por Tilt, poderão acarretar em um mercado mais competitivo, resultando em um valor de pacote de internet 5G mais acessível a partir de 2022, quando as primeiras cidades brasileiras devem começar a receber o serviço.

"Não é surpresa a entrada de novos players no mercado de internet móvel porque temos acompanhado o trabalho relevante que essas empresas têm feito com banda larga fixa. Elas estão fazendo uma verdadeira revolução digital silenciosa no interior do Brasil", afirma Leonardo Euler Morais, até ontem presidente da Anatel, em entrevista exclusiva a Tilt.

"Portanto é justo pleitearem o espaço na banda larga móvel, não apenas na fixa", acrescenta.

Essa mudança de estrutura com a chegada das empresas "menores" (entre aspas porque elas são grandes dentro de seus mercados) foi possível pelas regras definidas pelo edital do 5G, que permitiu ofertas de arremates dividindo-as em nacional e regionais.

Com isso, explicam os entrevistados, as empresas de menor porte conseguiram fazer propostas para ter o direito de explorar lotes onde já atuam.

Para Luca Belli, professor e coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Direito Rio, o leilão nesse sentido está sendo um sucesso.

"Estimula maior concorrência e o ingresso no mercado de empresas que não são as dominantes, como é o caso das três clássicas [Claro, Tim e Vivo], mas empresas regionais ou com atuação principal na internet fixa", destaca.

A chegada das novatas na internet móvel

Com a definição do primeiro dia do leilão, iniciado ontem (4), quatro empresas ganharam permissão para oferecer internet móvel de alta velocidade no Brasil — elas já atuam com serviços de telefonia e internet fixa em diversas regiões do país.

Apenas como exemplo, a provedora cearense Brisanet arrematou dois lotes regionais da faixa de frequência de 3,5 GHz — a mais concorrida do 5G no Brasil — e, com isso, vai levar internet de quinta geração não apenas para o Nordeste, onde já atua fortemente, como também para municípios com menos de 30 mil habitantes do Centro-Oeste.

A empresa desembolsará a bagatela de R$ 1,25 bilhão.

Segundo Paulo Robilloti, professor de economia da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), os arremates feitos pela Brisanet podem ser talvez o maior destaque até o momento entre as companhias novas no setor.

Já a startup de São Paulo Winity II, que trabalha com conexões sem fio entre máquinas para empresas, levou o primeiro lote da faixa de 700 MHz por R$ 1,4 bilhão. O lance mínimo era de R$ 157,6 milhões. Essa faixa já é parcialmente ocupada pelo 4G, tem abrangência nacional e permitirá levar o 5G para áreas mais isoladas.

Na região Sul do Brasil, vem o Consórcio 5G, uma união entre a Copel Telecom (que pertence ao Fundo Bordeaux após ser vendida pela Companhia Paranaense de Energia) e a Unifique, de Santa Catarina, ambas atuantes no ramo das telecomunicações. Eles arremataram por R$ 73,6 milhões o direito de explorar a tecnologia de quinta geração na própria região onde atuam.

Por R$ 405,1 milhões, a empresa Cloud2You poderá oferecer o 5G em municípios com menos de 30 mil habitantes nos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais.

Quebra de domínio do setor?

Para a Abrint (Associação Brasileira de Provedores de Internet), a entrada de novas operadoras poderá melhorar o relacionamento de atendimento entre o cliente e a empresa de telefonia, pois a demanda estará focada na localidade arrematada no leilão.

"O mercado móvel era muito maduro, mas resumido a apenas três empresas [depois da saída Oi]. Vamos ter entrada de novas operadoras, gerando uma nova competição e a tendência é de que se aproximem do consumidor final por serem regionais e focadas somente em determinadas localidades", explicou a conselheira da Abrint, Cristiane Sanches.

De acordo com Fernando Moulin, especialista em negócios digitais e sócio da consultoria Sponsorb, o leilão do 5G no Brasil representa a consolidação das empresas que estavam atuando há décadas no mercado regional brasileiro.

Contudo, ele pondera a necessidade de continuidade de investimentos para que elas não sejam compradas pelas grandes operadoras em eventuais crises.

"Estamos em um momento de fragmentação, com empresas entrando. Não acho que o 'monopólio' sairá totalmente das mãos das grandes. Acredito que ao longo do tempo voltaremos a ver uma concentração. Essas novas empresas fizeram abertura de capital e estão vitaminadas. Mas, na minha visão, devem se difundir e ser compradas, como aconteceu com o mercado de telecom há alguns anos", analisa Moulin.

Essa percepção é dividida com o professor Paulo Robilloti, da ESPM. Ele acrescenta que o setor de serviços de internet móvel ainda manterá uma concorrência muito dura. E o que demonstra isso é que no lote nacional, que é o principal do leilão do 5G, o domínio ainda permaneceu com a Claro, Vivo e Tim.

"Então é comum que haja muita convergência, muitas parcerias [entre empresas de diferente porte] nesse processo como todo. Vamos ver como é que vai ser o rearranjo disso. Elas [as menores] terão enormes desafios. Para a infraestrutura a ser montada, elas têm capacidade [de fazer], mas ainda sim é tudo novo", diz.

Empresas menores terão capacidade financeira?

Com o arremate pelas empresas menores em lotes para distribuir 5G aos brasileiros, as novas operadoras deverão investir em capitais de infraestrutura para cumprir os prazos determinados pela Anatel.

Para a Abrint, isso não é um problema, pois os preços ofertados acima do mínimo nos lances indicam que as empresas possuem dinheiro em caixa para investir.

"Elas demonstram ter capacidade. A aquisição dos lotes revela que as novas empresas estão bem capitalizadas. Caso contrário, nem arrematariam. Se não cumprirem aos prazos, aliás, é até uma ofensa ao termo que assinará se comprometendo com as datas. Sem dúvida, darão conta do recado", diz Cristiane Sanches.

Membro fundador do GTEL (Grupo de Pesquisa em Telecomunicações Sem Fio) da UFC (Universidade Federal do Ceará), Rodrigo Porto Cavalcanti lembra que, como as empresas regionais já possuem infraestrutura e demanda pré-estabelecidas de oferta da rede de banda larga fixa em mercados no interior dos Estados, a tendência é agilizar o 5G nas cidades que não são atrativas financeiramente para as grandes operadoras.

"As empresas regionais já estavam focadas nas localidades mais interioranas que tinham uma sobra de mercado pelas grandes operadoras. O arejamento desses provedores nos arremates pode ajudar a interiorizar o 5G de maneira mais rápida em comparação com as outras gerações de internet, e sem uma dependência da Claro, Vivo e Tim — que possuem o foco nos grandes mercados", concluiu Cavalcanti.

*Com informações de Lucas Carvalho.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que dizia uma versão anterior deste texto, no 15º parágrafo, a Copel Telecom não pertence mais à Companhia Paranaense de Energia, que vendeu sua divisão de telecomunicações ao Fundo Bordeaux em 2020. O erro foi corrigido.