14 bilhões de anos: como os cientistas calculam a idade do Universo?
Marcelle Souza
Colaboração para Tilt, em São Paulo
02/12/2021 04h00
As principais teorias chegam a um resultado bem parecido: o Universo tem quase 14 bilhões de anos. Mas antes de falar como os cientistas fazem essa conta, é preciso entender um pouco sobre os primeiros anos de "vida" no espaço, quando aconteceu o Big Bang, como é chamada a grande explosão que teria dado origem ao Universo.
"No começo, não existia nada, só radiação, uma energia muita alta que não deixava nada se organizar. Então, quando o Universo tinha um ou dois segundos de vida, aconteceu uma combinação de partículas com energia muito alta. O Universo em seguida se esfriou, a ponto de surgirem prótons e neutros, que, por sua vez, se organizaram depois em partículas de hidrogênio", explica Carlos Alexandre Wuensche, pesquisador de astrofísica do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Na etapa seguinte, as partículas começaram a se aglutinar, formando uma estrutura densa e uma reação nuclear. Foi aí que apareceram as estrelas e as galáxias. Os planetas são astros que não viraram estrelas.
O Sistema Solar, onde a Terra está, é um pedacinho da Via Láctea e tem aproximadamente 4,5 bilhões de anos. "Essa estimativa é feita a partir da idade do Sol", diz Wuensche.
Mas, afinal, como é feita essa conta?
Uma das formas de calcular a idade do Universo é medir o que os cientistas chamam de radiação cosmológica de fundo ou "ecos do Big Bang". Essa teoria ganhou mais força a partir de 1964, quando os físicos norte-americanos Robert Wilson e Arno Penzias descobriram um ruído que vinha do espaço e não desaparecia.
À época, eles trabalhavam no laboratório da Companhia Telefônica Bell com uma grande antena para detectar sinais fracos de rádio, quando perceberam que um ruído estranho podia ser detectado em várias partes do Universo e mais: ele tinha a mesma intensidade.
Wilson e Penzias foram então conversar com colegas da Universidade de Princeton, que contaram que esse ruído, uma espécie de eco da grande exploração que originou o Universo, já havia sido previsto por cientistas em 1948, mas até então ninguém havia conseguido prová-lo.
A descoberta acidental rendeu a dupla de físicos norte-americanos o Prêmio Nobel em 1979.
A luz entrega a idade
Segundo Wuensche, investigar os ecos do Big Bang é uma das formas mais precisas de medir a idade do Universo, mas outras teorias têm chegado a resultados muito próximos.
"Outra maneira utilizada pelos cientistas é buscar objetos que estão muito distantes e, a partir da luz que emitem, conseguimos entender melhor como o Universo evolui. Isso é possível porque todas as estrelas geram elementos químicos, o que permite que a gente estime a sua distância. E quanto mais longe, mais antiga é a estrela", diz o pesquisador.
A Estrela Matusalém (ou HD 140283) é considerada a mais antiga identificada no Universo, segundo observações feitas a partir do telescópio Hubble. De acordo com a estimativa de cientistas da Nasa (agência espacial norte-americana), a estrela tem aproximadamente 14,5 bilhões de anos, com uma margem de erro de 0,8 bilhão para mais ou para menos.
A Estrela de Matusalém está localizada a 190 anos-luz da Terra e teria surgido na mesma época do Universo.
A terceira forma mais reconhecida de fazer o cálculo da idade do Universo leva em conta os resíduos resultantes das supernovas, que são explosões muito brilhantes e tem um efeito parecido ao surgimento de uma nova estrela.
O grande enigma do Universo
Depois de tantos eventos, uma questão ainda sem resposta pelos cientistas é o formato do espaço. "A gente não consegue determinar uma forma para o Universo. Pela posição que estamos aqui na Terra, o que a gente consegue imaginar, pelas contas, é que o Universo não tem uma forma, porque é infinito", diz o pesquisador.
A pergunta que intriga mesmo os cientistas faz anos é: de que material é feito o Universo? "A gente só consegue medir 5% da matéria do Universo, ou seja, tem 95% que a gente não tem menor ideia do que é", diz o pesquisador do Inpe.
Desse material desconhecido, os cientistas estimam que 27% seja matéria escura e 68%, energia escura. "É uma matéria que não emite luz, mas tem gravidade, uma energia esquisita que, em vez de puxar, pode afastar um objeto", explica Wuensche.
A resposta para esse enigma pode ter impactos em várias áreas da ciência, como a física de partículas e a cosmologia. Aqui na Terra, os admiradores das noites estreladas poderão saber um pouco mais sobre esse ilustre desconhecido.
Qual o tamanho da Terra perto do resto do Universo? Confira estas comparações
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A Terra pode parecer enorme quando vista por um astronauta de uma nave espacial em sua órbita, mas bastam algumas comparações com outros astros e formações do espaço para que nos sintamos bem pequenos. Confira a seguir qual o tamanho do nosso planeta perto de outros elementos do espaço... E surpreenda-se!
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Na distância Terra-Lua cabem todos os planetas? "Não, mas quase! A distância média Terra-Lua é de aproximadamente 384 mil km", diz o físico Roberto Costa, professor do Departamento de Astronomia do IAG (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas) da USP (Universidade de São Paulo). Veja na próxima imagem o que aconteceria se tentássemos encaixar os planetas do Sistema Solar nesse espaço
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Somando o diâmetro aproximado dos quatro planetas gasosos gigantes (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno) com o dos quatro planetas com superfícies terrestres (Mercúrio, Vênus, Terra e Marte) temos, nesta ordem: 143 mil km + 120 mil km + 51 mil km + 49 mil km + 4,9 mil km + 12,1 mil km + 12,8 mil km + 6,8 mil km = 398,6 mil km. Ou seja, um pouquinho mais que a distância média Terra-Lua, que segundo o físico Roberto Costa, tem aproximadamente 384 mil km
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Sabe quantas Terras cabem nos anéis de Saturno? Quase seis! Segundo o físico Roberto Costa, os anéis se estendem na distância de 7.000 a 80 mil km da superfície do planeta, portanto possuem 72 mil km de largura. Como a Terra tem 12,8 mil km de diâmetro, daria para colocar 5,6 terras nesse espaço
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O Sol é enorme mesmo? Quando estamos deitados na praia, curtindo o calor e pegando um bronzeado, nem parece ser assim tão grande... Mas acredite: ele tem 1,4 milhões de quilômetros de diâmetro. Isso equivale a 3,5 vezes a soma dos diâmetros de todos os planetas do Sistema Solar
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Como ficaria o Sol ao lado da maior estrela já descoberta, a UY Scuti, que tem 2,38 bilhões de km de diâmetro? "Se fosse colocada onde está o Sol, ela encheria todo o sistema solar até a órbita de Urano", explica o físico Roberto Costa. "Fazendo uma analogia com números menores, isso significa que se o Sol tivesse 10 cm de diâmetro (o tamanho de uma maçã grande), ela teria 170 metros de diâmetro, maior que um estádio de futebol"
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Você acredita que existem mais estrelas no céu do que grãos de areia em todas as praias? De acordo com os cálculos do físico Roberto Costa, devem existir aproximadamente 700 trilhões de m³ de areia nas praias da Terra, algo como 5 sextilhões de grãos. "Isso é o algarismo '5' seguido por 21 zeros", explica o professor. "O número de estrelas também pode ser apenas estimado: em nossa galáxia, a Via Láctea, existem de 200 bilhões a 400 bilhões de estrelas. Estimando o número total de galáxias em 100 bilhões (mas talvez seja muito mais, talvez 500 bilhões!), tem-se no mínimo 10 sextilhões de estrelas, mas talvez chegue a 100 sextilhões! Portanto existem mais estrelas no universo do que grãos de areia na Terra"
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Quanto enxergamos da Via Láctea quando olhamos para o céu? A olho nu vemos apenas as estrelas mais próximas, que estão a poucas centenas de anos-luz de nós (círculo em destaque na imagem). Estruturas maiores e mais distantes também podem ser vistas facilmente, sem ajuda de aparelhos, desde que sejam observadas a partir de lugares sem iluminação artificial e em noites sem lua. "Alguns exemplos são a Pequena e a Grande Nuvem de Magalhães, galáxias-satélite da nossa que estão a cerca de 150 mil anos-luz de distância. Ou então a galáxia de Andrômeda, que está a 2,5 milhões de anos-luz", explica o especialista em astronomia Roberto Costa. De qualquer forma, o que vemos é uma parte ínfima da galáxia
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E como ficaria a Via Láctea ao lado da maior galáxia que existe? Eis a razão concreta para você se sentir realmente pequeno diante do Universo: o diâmetro da maior galáxia conhecida, a IC1101, é 60 vezes maior que o da Via Láctea --6 milhões de anos-luz contra 100 mil da nossa. A maior galáxia abriga cerca de 100 trilhões de estrelas, enquanto a Via Láctea tem de 200 bilhões a 400 bilhões
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Que tamanho tem um buraco negro perto da Terra? São gigantescos! Sabemos que buracos negros são corpos celestes de massa muito grande para o espaço que ocupam, com campo gravitacional gigantesco capaz de engolir galáxias e de onde nem a luz pode escapar. Sendo assim, por não refletirem nada, eles são invisíveis. O que os cientistas conseguem detectar são os chamados horizontes de eventos, aquilo que gravita ao seu redor. "Os buracos negros supermassivos, como o que existe no centro da Via Láctea, tem horizonte de eventos imenso devido à sua enorme massa", diz o físico Roberto Campos. Na imagem, vemos um desses ralos gigantes, encontrado no centro da galáxia NGC 1217, comparado com as órbitas da Terra e de Netuno. Caso fosse possível, a luz demoraria quatro dias para atravessá-lo, contra 17 minutos-luz da órbita da Terra
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Já parou para pensar? Se viajássemos para bem longe, o que veríamos pelo caminho? Descubra na próxima imagem!
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À medida que nos afastássemos da Terra (ponto vermelho na imagem), teríamos primeiro uma visão panorâmica do Sistema Solar inteiro --que você conhece bem: Sol, Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno, além de planetas anões, como Plutão, e objetos menores
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Depois, veríamos as estrelas da vizinhança solar (foto) e o braço da Via Láctea onde está o nosso Sol, chamado Órion
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Passando Órion, veríamos então a Via Láctea inteira e suas centenas de bilhões de estrelas. O ponto vermelho na imagem mostra o nosso Sistema Solar
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Longe da Via Láctea (o ponto vermelho na imagem), passaríamos por mais de cinquenta galáxias próximas, como as Nuvens de Magalhães, a Andrômeda e as galáxias do chamado 'Grupo Local', que são cerca de 30. A maioria é de galáxias anãs
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No final da viagem, veríamos a estrutura em larga escala do Universo (com a Terra no centro, marcada pelo ponto vermelho) e todo objeto cujo sinal emitido em algum momento depois do Big Bang tenha nos alcançado agora. Mas poderíamos ver o Big Bang? "Negativo", diz o físico Roberto Costa. "No início, o Universo era opaco devido à alta densidade de matéria e de energia. Os fótons não se deslocavam a grandes distâncias. E mais tarde não existiam estrelas. É o período chamado 'dark age'. Apenas quando as primeiras estrelas começaram a se formar é que houve produção de fótons que viajam pelo espaço e podem ser vistos hoje",explica
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Eis o percurso completo da nossa viagem imaginária
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Parece muita coisa, não é? Mas saiba que a matéria, tal qual a conhecemos (formada por prótons, nêutrons e elétrons), representa apenas 4% do total de massa do Universo. Os outros 96% são formados por matéria escura e energia escura. Nem uma nem outra é visível ou pode ser detectada por telescópios
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