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Já é 2022 e nada de elevadores espaciais; por que ainda não virou realidade

Getty Images
Imagem: Getty Images

Rodrigo Lara

Colaboração para Tilt, em São Paulo

03/02/2022 04h00

Elon Musk, Richard Branson e Jeff Bezos. Além de uma conta corrente extremamente recheada de dinheiro, os três empresários têm outra coisa em comum: estão envolvidos, à sua forma, com uma nova corrida espacial. O termo remete à clássica disputa entre Estados Unidos e União Soviética, na segunda metade do século passado, para tentar se mostrar como o país mais avançado em termos de exploração do espaço.

A questão é que, salvo inovações tecnológicas, a forma de explorar o Universo levada a cabo pelos três bilionários é um tanto convencional, com o lançamento de foguetes e espaçonaves. Por mais que seja a solução mais viável de se sair da Terra atualmente, ela passa longe de ser a mais eficiente — e, muito menos, barata.

"O custo para colocar qualquer coisa em órbita é muito alto, mesmo considerando o barateamento dos últimos tempos. Atualmente, para colocar cada quilo de material em órbita da Terra são precisos US$ 2.750 [equivalentes a cerca de R$ 15 mil]", diz Roberto D. Dias da Costa, professor do departamento de astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP).

É aqui que entraria uma ideia típica de filme de ficção científica: se ao invés de usarmos espaçonaves, que além de apresentarem um alto custo de operação ainda demandam um processo de lançamento altamente complexo, não utilizássemos um elevador espacial para levar algo para o espaço?

A ideia básica por trás desse conceito é relativamente simples e se assemelha a um elevador daqueles que encontramos em edifícios: uma estrutura fixa, apontando para o céu, pela qual cargas das mais variadas — incluindo pessoas — poderiam transitar.

Parece maneiro, não é? Pena que, na prática, colocar algo do tipo em operação passe longe de ser simples e, até mesmo, viável.

Os desafios

Para construir um elevador do tipo, antes de mais nada, seria preciso optar entre mais de um modelo de operação. Primeiramente, vamos considerar uma estrutura fixa, como uma torre. Isso, por si só, já geraria uma série de obstáculos que, até o momento, são intransponíveis.

Para fins de referência, vamos usar aquilo conhecido por órbita baixa da Terra, que é de cerca de 400 km em relação ao solo. É nessa "altitude" que a Estação Espacial Internacional orbita o nosso planeta.

Como é de imaginar, erguer uma torre de 400 km de altura não é simples como construir um castelinho de areia. O material usado teria que ser muito resistente, como o aço, porém não poderia ser pesado.

O motivo para isso é que, diante da imensidão da construção, usar materiais pesados faria com que os andares inferiores desse elevador não suportassem tamanho peso, levando toda estrutura a colapsar.

De qualquer forma, vamos supor que o desafio de construir algo desse tamanho fosse superado e a solução encontrada para a sua construção seja um material leve e resistente, como ligas de carbono e até mesmo grafeno. E também que fosse encontrada uma forma da radiação espacial não afetar a sua durabilidade.

O próximo ponto seria criar meios de tornar esse elevador, de fato, útil. Aqui, você deve estar pensando: "ué, ele poderia ser usado para colocar objetos em órbita, não?". A realidade é bem diferente.

Elevador limitado

Uma vez que ele esteja preso ao solo terrestre, sua velocidade de rotação fica totalmente ligada à da Terra. Aqui, é preciso considerar que a velocidade angular da Terra é algo em torno de 7,29 x 10^-5 radianos por segundo. Radiano é a razão entre o comprimento de um arco e o seu raio. Ele é a unidade padrão de medida angular.

É possível transformar esse número em palpáveis quilômetros por hora: no equador do planeta, isso seria algo em torno de 1.675 km/h.

A questão é que essa seria a velocidade de um objeto que estivesse na superfície do planeta. Conforme vamos nos afastando, essa velocidade aumenta — uma vez que estamos realizando um movimento circular, quanto mais longe se está do centro, maior a distância percorrida no mesmo intervalo de tempo. Quer um exemplo claro disso? Imagine uma prova de atletismo de 1.500 m em uma pista padrão (400 m).

Nessas competições, quem está nas raias mais externas da pista é posicionado mais à frente na largada, de forma a anular a diferença de distância entre as raias mais internas da pista. Não houvesse essa adaptação, quem estivesse na parte externa da pista teria que correr muito mais rápido do que os adversários para ter chance de vitória.

Voltando ao elevador: considerando isso, a velocidade de rotação na ponta da estrutura, a 400 metros do solo, seria superior aos 1.675 km/h. Parece rápido — e é —, mas um objeto a 400 km de altitude não entraria em órbita se fosse lançado do topo do elevador a essa velocidade. Nessa altitude, ficar em órbita da Terra exige uma velocidade de 7,7 km/s, alto em torno de 27.700 km/h.

Sendo assim, a utilidade desse elevador espacial já ficaria limitada. A solução para soltar um objeto do topo de uma estrutura do tipo e ele entrar em órbita seria construir uma torre muito maior, com 36 mil quilômetros de comprimento.

O número não é à toa: uma órbita com essa distância em relação à Terra é a chamada órbita geossíncrona e é nela que que os chamados satélites geoestacionários transitam — e fazem isso a cerca de 28 mil quilômetros por hora.

Opções "mais próximas" da realidade

Uma opção relativamente mais viável seria construir um cabo de 36 mil quilômetros de extensão e prender a um objeto que esteja em órbita estacionária.

Sim, relativamente: estamos falando aqui de construir um cabo de comprimento próximo ao da circunferência da Terra (cerca de 40 mil quilômetros) e que precisaria ser de um material extremamente resistente.

Além disso, ele teria que estar preso a um objeto de massa enorme, de maneira que a tensão gerada pelo transporte de objetos por meio desse cabo não seja capaz de alterar sua órbita e causar um desastre de enormes proporções.

De qualquer forma, essa solução envolvendo um cabo foi a utilizada por um projeto desenvolvido por Kaishu Koike e Naoki Arakawa, que venceram uma competição em 2018 chamada European Space Elevator Challenge (Desafio Europeu de Elevador Espacial), criada para promover a ideia de uma estrutura do tipo. Os criadores são da Nihon University, em Tóquio.

Em seu projeto, a dupla construiu um veículo que é ao mesmo tempo leve, rápido e resistente, que seria capaz de percorrer um cabo ligando a Terra a uma estrutura geoestacionária.

Essa não é uma ideia isolada no Japão, uma vez que a Obayashi Corporation, uma das maiores construtoras do país, planeja construir um elevador espacial até 2050. O projeto prevê a construção de uma estação geoestacionária e um porto terrestre de 400 metros de diâmetro, que ficariam ligados por meio de um cabo de nanotubos de carbono — seriam necessários 96 mil quilômetros desse cabo.

Outra ideia veio da China e foi apresentada em 2021. Ela consistiria em duas partes: um elevador unindo a Terra a uma estação espacial e outro elevador unindo a Lua a uma outra estação espacial. Dessa forma, seria possível levar uma espaçonave para fora do planeta, de onde ela partiria até atracar na estação presa à superfície da Lua. Essa segunda ideia, no entanto, ainda não tem prazo de conclusão.

Ao menos por ora, no entanto, elevadores espaciais ainda devem aparecer exclusivamente em obras de ficção científica.

No episódio Deu Tilt #10, você pode entender melhor o que é o grafeno e como um elevador espacial pode, um dia, virar realidade com ele: