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Proteção a dados pessoais vira direito constitucional; entenda o que muda

Com inclusão na PEC, Lei Geral de Proteção de Dados ganhará mais força - Getty Images/iStockphoto
Com inclusão na PEC, Lei Geral de Proteção de Dados ganhará mais força Imagem: Getty Images/iStockphoto

Gabriel Daros

De Tilt, São Paulo

11/02/2022 18h35Atualizada em 13/02/2022 16h46

O Congresso Nacional aprovou ontem (10), em sessão especial, uma emenda que inclui a proteção a dados pessoais como direitos fundamentais da Constituição Brasileira. Em tramitação durante três anos, a iniciativa (PEC 17/2019) diz que informações de cidadãos em meios físicos e digitais possuem a mesma importância e prioridade a ser garantida quanto educação, saúde e segurança pública.

A partir dessa emenda, o estado passa a ter responsabilidade em organizar e fiscalizar o tratamento de dados da população, de acordo com os critérios da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Durante a sessão, o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), destacou a necessidade das leis brasileiras se adaptarem para garantir a privacidade das pessoas.

"O novo mandamento constitucional reforça a liberdade dos brasileiros, pois ele vem instalar-se em nossa Constituição em socorro da privacidade do cidadão. Os dados, as informações pessoais, pertencem, de direito, ao indivíduo e a mais ninguém", disse o senador.

A jornada até aqui

Originário no Senado, em 2019, o projeto foi submetido ao parecer da Câmara de Deputados, que estipulou alterações na emenda. Em outubro de 2021, a proposta retornou aos senadores, que aprovaram a PEC com 65 votos.

Para o autor da PEC, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO), agora o cidadão brasileiro terá na Constituição a garantia de que seus dados devem ser protegidos pelo estado, responsável por criar mecanismos para efetivar esse direito.

"Os dados hoje são um ativo mais valioso que ouro. Eles são diariamente utilizados por meio de captação formal por empresas ou órgãos públicos. Devido a vazamento ou invasões, essa PEC dá uma segurança formal e sistêmica ao cidadão, pois está amparado legalmente", afirmou Gomes a Tilt em outubro, à época do envio ao Senado.

Mas afinal... o que muda?

Quando passou pela Câmara, os deputados incluíram no texto um artigo que atribui à União as competências de organizar e fiscalizar a proteção e o tratamento de dados pessoais, de acordo com a lei.

"Estamos defendendo direitos que antes eram absolutos, direito à intimidade, à vida privada. Esse mundo da internet se volta contra nós mesmos. Ora somos vítimas do crime, ora somos vítimas do mercado", acrescentou a senadora Simone Tebet (MDB-MS), relatora da proposta no Senado, durante a primeira passagem do texto na casa.

Para Carlos Affonso, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade, a transformação da proteção de dados em direito fundamental é um marco na trajetória da proteção de dados no Brasil.

"Essa mudança é importante porque, ao se reconhecer a proteção dos dados pessoais como direito fundamental, a violação desses direitos garante uma via de acesso mais clara ao Supremo Tribunal Federal para analisar e julgar esses casos, já que é o STF o guardião da Constituição", afirmou o professor, que também é colunista em Tilt.

Para o advogado especialista em direito digital Leonardo Neri, da empresa Mazzucco & Mello Advogados, existem basicamente três implicações importantes sobre a mudança:

  • Processual: o direito fundamental à proteção de dados passa a ser discutido judicialmente perante o Supremo Tribunal Federal;
  • Legislativa: a competência passa a ser privativa da União para legislar sobre o assunto;
  • Social: as discussões sobre o direito a termos informações pessoais protegidas tendem a ser ainda mais aprofundadas.

"Potencializa o tema da privacidade como elementar para nossa sociedade que vive imersa numa imensa revolução tecnológica e, consequentemente, os reflexos da proteção de dados vão ser debatidos com muito mais profundidade'', afirmou, em comunicado divulgado à imprensa.

Especialistas ouvidos anteriormente por Tilt também haviam esclarecido a importância da PEC em obrigar o Estado a criar mecanismos de proteção dos dados da população.

Antônio Carlos de Freitas Júnior, advogado e professor de direito constitucional, explicou que as orientações presentes na Lei Geral de Proteção de Dados ganhassem mais força.

"O rito da proteção já estava na LGPD. Tudo o que a sociedade poderia fazer caso tivesse seus dados violados, já estava nela. Porém, a PEC veio mais como um reforço e eleva esse status da proteção de dados para a mesma importância de outros direitos fundamentais", explica.

Bruno Bioni, consultor na área de regulação e tecnologia e diretor da Data Privacy Brasil, afirmou que a determinação passa agora a exigir ações das entidades públicas voltadas exclusivamente para lidar com o tema.

"Será necessário que o Estado tenha políticas públicas para que esse direito seja materializado, como campanhas de educação ou até celebração de contratos somente com empresas de tecnologia que sejam pelas pró-privacidade dos dados. Isso agrega muito", concluiu,

Na prática, isso confere mais poder à ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), a agência reguladora e fiscalizadora da LGPD, sendo também responsável pelas políticas públicas.