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Vitiligo, TDAH e mais: eles usam a web para quebrar tabus e se divertirem

Diego Stopassoli, 33, conta nas redes sobre a vida com vitiligo - Reprodução
Diego Stopassoli, 33, conta nas redes sobre a vida com vitiligo Imagem: Reprodução

Priscila Carvalho

Colaboração para Tilt, no Rio de Janeiro

17/02/2022 04h00

Diego Stopassoli, 33, alcançou visibilidade nas redes sociais abordando temas além das tradicionais dancinhas. Ele decidiu falar abertamente na internet sobre vitiligo, doença autoimune caracterizada pela despigmentação da pele em algumas áreas do corpo.

Hoje, o catarinense soma quase 100 mil seguidores no TikTok e 58,4 mil no Instagram. Por meio das plataformas, ele viu uma oportunidade de compartilhar experiências com pessoas com o mesmo diagnóstico e tirar dúvidas sobre a doença.

Diego descobriu o vitiligo sete anos atrás. As primeiras manchas na pele surgiram enquanto ele viajava em um cruzeiro. "Elas eram bem pequenas, uma estava no dedão e a outra surgiu no olho. Pensei que era marca do Sol, mas achei estranho", conta a Tilt. Após o diagnóstico, Diego lembra que demorou para se aceitar.

Além da questão autoimune, ele passaria a conviver com mudanças em sua aparência. A percepção sobre essa nova fase de sua vida começou a mudar quando uma amiga o avisou que uma criança do interior de São Paulo havia sofrido preconceito por também ter vitiligo.

O catarinense fez então um vídeo de incentivo ao garoto com o objetivo de fortalecer a autoestima da criança, exaltando pessoas com a doença. O conteúdo foi postado em seu perfil no Instagram, e o perfil "Razões para Acreditar" (com 4,3 milhões de seguidores) repostou a publicação. Desde então, relata Diego, novos seguidores não param de chegar ao perfil.

"Foi bem no final de 2020 e eu pensei que podia ajudar as pessoas. Comecei a fazer mais vídeos e a galera começou a gostar, destaca.

Tirar dúvidas e quebrar preconceitos

Para Diego, a internet é um meio importante para inspirar e conscientizar as pessoas, já que muitas acham que a doença é contagiosa. "Já fui apertar a mão de algumas pessoas e elas recolheram a mão. Os olhares na rua são nítidos. Eu só não tenho pigmentação na pele. Sou igual a outra pessoa", afirma.

Um dos vídeos que mais bombou recentemente foi um em que ele comenta uma fala da participante do Big Brother Brasil Natalia, que também tem vitiligo, sobre a doença e o albinismo. Na postagem, ele esclarece que existe diferença entre as duas: mesmo o vitiligo atingindo 80% do corpo, ainda assim, a pessoa não será considerada albina.

"O albinismo está presente no nascimento da criança. Já o vitiligo não. Ele é mais raro no nascimento, mas pode acontecer", explicou no vídeo.

Quando perguntando como lida com os haters [internautas que criticam e fazem comentários ofensivos], ele diz que tolera bem e que hoje sabe administrar melhor cada situação ou comentário maldoso. Ele ressalta que atualmente o feedback vem mais de forma positiva do que negativa.

"Já recebi mensagens dizendo que depois que comecei a postar os vídeos, mulheres com vitiligo conseguiram colocar biquíni. Sair do jeito que são. Eu comecei a colocar na minha cabeça que precisava atingir essas pessoas", afirma.

Síndrome de Tourette

Diagnosticada com síndrome de Tourette no ano passado, a estudante de psicologia e maranhense Joyce Luz, 19, também utiliza as redes sociais para compartilhar todas as informações sobre o distúrbio, que provoca tique motores, vocálicos crônicos (algumas pessoas falam palavrões sem intenção), e pode ter origem genética.

Joyce também sofre com transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), TOC (Transtorno Obsessivo-Compulsivo), depressão e ansiedade.

Na época em que descobriu a síndrome, seu psicólogo a incentivou a fazer uma rede social para falar sobre o assunto e mostrar aos internautas que era possível conviver com os sintomas da melhor maneira possível.

Ela começou a postar vídeos diariamente no TikTok. Hoje, a estudante já tem pouco mais de 851 mil seguidores na plataforma. Algumas das postagens já somam meio milhão de visualizações. No Instagram, ela já alcançou mais de 80 mil.

"As pessoas eram um pouco céticas. Elas não entendiam o propósito da minha mensagem [transmitida por meio dos vídeos na internet]", conta Joyce.

Para ela, a internet a ajudou a ter mais voz e dar voz para outros que, assim como ela, sofrem com estigmas e preconceitos. "Algumas pessoas não entendem que a gente tem sentimentos e que somos seres humanos", diz.

Assim como Joyce, a paulistana e técnica de enfermagem Dandara Tavares sofre com uma condição genética rara conhecida como síndrome de Barber Say. Ela é provocada por uma displasia ectodérmica (inflamação na pele) que gera diversas alterações no corpo, que podem atingir unhas, cabelos e glândulas de secreção.

Na época do seu nascimento, somente 20 pessoas no mundo foram diagnosticadas com o problema.

Através da internet, Dandara conscientiza sobre síndrome rara - Reprodução - Reprodução
Através da internet, Dandara conscientiza sobre síndrome rara
Imagem: Reprodução

No início da pandemia, ela começou a criar vídeos no TikTok com dublagens e músicas. Hoje, sua conta na plataforma de vídeo já soma mais de meio milhão de seguidores.

"Eu comecei na plataforma sem o intuito de falar da síndrome. Mas comecei a postar sobre por causa das curiosidades. As pessoas perguntavam tanto de uma forma agradável quanto de uma forma desagradável", relembra.

Depois da exposição massiva na rede social, Dandara destaca que precisou responder e desmitificar dúvidas e comentários maldosos dos internautas.

"Infelizmente ainda há pessoas ignorantes que encaram a síndrome de forma desagradável, por puro preconceito. Mas algumas já encaram de forma natural", diz.

A técnica de enfermagem reforça ainda que acha importante falar de sua síndrome e abrir caminhos para pessoas com outras condições genéticas e com deficiência. "Um assunto acaba se tornando estranho para você quando você não o conhece. Quando é algo exposto e falado é mais fácil de entender", conclui.

Compartilhar é importante

Embora algumas doenças e condições genéticas ainda causem estigmas, Maria Inez Padula, médica da família e comunidade, ressalta que é importante falar abertamente sobre o assunto para que essas pessoas tenham um acolhimento e mais confiança na sua vida.

"Quanto mais for acolhida, mais facilidade terá de se cuidar. E muito importante falar para o médico, para família", ressalta ela, que é diretora clínica da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade.

Isadora Bottarello, coordenadora do setor de psicologia na Vibe Saúde, ressalta que a internet tem um papel social fundamental nesse processo de aceitação e de compartilhar conhecimento.

"A importância de compartilhar informações sobre algo que não é abordado em nosso dia a dia é a possibilidade de transmitir informações sobre o assunto. Quando alguém que já tem espaço na mídia fala sobre um diagnóstico de uma patalogia que carrega um estigma social, possibilita a quebra disso", pontua.

No caso das doenças e síndrome citadas na matéria, o preconceito fez com que todos os entrevistados se sentissem em algum momento excluídos da sociedade. Com abordagem das redes sociais, é possível que o assunto seja tratado de forma mais leve e com informações acessíveis e didáticas, diz Bottarello, que também é psicóloga clínica pela IFEN (Instituto de Psicologia Fenomenológica do Rio de Janeiro).

Vale ressaltar que mesmo a divulgação de informações de confiança sendo nas redes sociais, o diagnóstico e tratamento devem ser acompanhados com um médico especialista.

"A busca pelo diagnóstico e tratamento clínico e psicológico é indispensável. Mesmo compartilhando de um diagnóstico, somos únicos e nosso organismo e mente funcionam de maneira individual. As receitas prontas devem ser evitadas", completa Bottarello.