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IA controla fusão nuclear e abre caminho para energia inesgotável; entenda

Interior do reator nuclear TCV, onde a IA da empresa DeepMind ajudou a estabilizar plasma de fusão - A. Herzog, Swiss Plasma Center, EPFL
Interior do reator nuclear TCV, onde a IA da empresa DeepMind ajudou a estabilizar plasma de fusão Imagem: A. Herzog, Swiss Plasma Center, EPFL

Juliana Stern

Colaboração para Tilt, em São Paulo

18/02/2022 13h48

Sem tempo, irmão

  • IA da empresa americana DeepMind conseguiu estabilizar parte mais quente de uma fusão nuclear
  • Semelhante a um 'sol artificial', fusão nuclear pode gerar energia limpa e inesgotável no futuro
  • Desafio é manter fusão estável por mais tempo; IA conseguiu mantê-la por 2 segundos

Pesquisadores deram mais um passo para usar reatores de fusão nuclear como fontes de energia. Um novo estudo desenvolveu uma inteligência artificial (IA) capaz de controlar o plasma superquente que fica no interior das máquinas, o que pode ser uma solução para o maior problema no uso de reatores para o fornecimento elétrico.

Reatores de fusão prometem energia barata, abundante e relativamente limpa —se algum dia for possível fazê-los funcionar. Ainda como uma máquina experimental, esses reatores são projetados para aproveitar a energia gerada pela reação de fusão nuclear.

Esse avanço poderia ajudar os físicos a entender melhor como a fusão funciona e acelerar o desenvolvimento de uma fonte ilimitada de energia limpa.

Na fusão nuclear, os núcleos dos átomos de hidrogênio (H) são forçados a formar átomos mais pesados, como o hélio (He). Isso produz muita energia em relação a uma pequena quantidade de combustível, tornando-a uma fonte energética muito eficiente, muito mais limpa e segura do que os combustíveis fósseis ou a energia nuclear convencional. Esse também é o processo que alimenta as estrelas.

No entanto, controlar a fusão nuclear não é uma tarefa fácil. O problema é que o processo de fundir os núcleos atômicos só pode ser realizado a temperaturas extremamente altas, o que transforma a matéria em um plasma mais quente que a superfície solar dentro do reator.

O desafio é manter esse plasma unido por tempo suficiente para que a máquina possa extrair energia pelo calor. Essa tarefa, auxiliada por lasers e ímãs, requer monitoramento e manipulação constante do campo magnético que mantém o plasma estável. E é aí que a inteligência artificial entra.

A empresa DeepMind, em parceria com cientistas do Instituto Federal Suíço de Tecnologia em Lausanne (EPFL), na Suíça, desenvolveu uma IA capaz de controlar os campos magnéticos dentro do reator de fusão Tokamak de Configuração Variável (TCV) da EPFL.

Tokamak é o nome dado ao tipo de reator cuja energia produzida é absorvida em forma de calor pelas paredes do recipiente em que se une o plasma. Depois, a usina de fusão nuclear usa esse calor para produzir vapor e eletricidade por meio de turbinas e geradores.

Estes campos magnéticos são essenciais para o funcionamento seguro do reator. Se o plasma quente toca as paredes do recipiente, ele esfria rapidamente, interrompendo a reação de fusão, o que pode causar danos significativos. A IA da DeepMind é capaz de controlar todas as bobinas magnéticas ao mesmo tempo, aprendendo automaticamente quais tensões são necessárias em cada uma para conter melhor o plasma.

No total, a IA controlou o plasma por dois segundos, tempo próximo do limite do reator —o TCV só pode sustentar o plasma em um único experimento por até 3 segundos. Depois disso, o equipamento precisa de 15 minutos para esfriar.

O recorde de tempo de controle de plasma para reatores de fusão é de apenas 5 segundos, estabelecido recentemente pelo Joint European Torus no Reino Unido.

A rede neural foi treinada para fazer 90 medições diferentes sobre a posição e a forma que o plasma toma dentro do reator, e assim ajustar 19 ímãs para responder às mudanças e continuar controlando o processo. A tecnologia age muito mais rápido do que algoritmos anteriores, podendo repetir o ciclo de feedback até dez mil vezes por segundo —e, obviamente, é muito mais rápida que um operador humano.

Para acelerar as coisas, a IA foi dividida em duas redes neurais. Uma grande, chamada de crítica, aprendeu por tentativa e erro como controlar o reator dentro da simulação. Em seguida, a habilidade adquirida foi codificada em uma rede menor e mais rápida, chamada de ator, que roda no próprio reator.

Em entrevista ao portal New Scientist, a pesquisadora Gianluca Sarri, da Queen's University Belfast, no Reino Unido, diz que a IA é a chave para o futuro dos sistemas de controle destes reatores, que ainda precisam evoluir para sustentar uma reação que produza mais energia do que é consumida.

"Uma vez feito isso, este não é o fim da história. Então você tem que fazer uma usina", diz ele. "E essa IA é, na minha opinião, o único caminho a seguir. Existem tantas variáveis, e uma pequena mudança em uma delas pode causar uma grande mudança no resultado final. Se você tentar fazer isso manualmente, é um processo muito demorado."