TikTok suspende qualquer publicação de vídeos na Rússia após novas leis
A gigante de mídia social TikTok anunciou neste domingo (6) que está suspendendo a publicação de todo o conteúdo de vídeo da Rússia para manter seus funcionários em segurança e cumprir as novas leis sobre "notícias falsas" naquele país.
"À luz da nova lei de 'notícias falsas' da Rússia, não temos escolha a não ser suspender a transmissão ao vivo e novos conteúdos de nosso serviço de vídeo enquanto analisamos as implicações de segurança desta lei", explicou a empresa em comunicado, esclarecendo, porém, que seu serviço de mensagens não será afetado.
Nova lei
A Rússia aprovou nesta sexta-feira (4) uma lei que prevê punições, que podem ir até 15 anos de reclusão, para pessoas que publicarem e disseminarem notícias falsas na internet envolvendo as forças armadas do país.
Na prática, as novas regras punirão pessoas que compartilharem recorrentemente noticias consideradas falsas sobre as Forças Armadas da Rússia no conflito com a Ucrânia, bem como declarações que ofendam os militares — ou ainda, a defesa de sanções contra o governo.
A lei prevê prisão de cinco a dez anos para quem infligir a cláusula, ou uma dedução de até 500 mil rublos (cerca de R$ 24 mil, na conversão de hoje) de salário ou renda da vítima por um período de até três anos. No caso de falsificação com "consequências graves", a pena pode ir para até 15 anos de detenção.
A questão é que o governo russo proíbe, por exemplo, o uso do termo "guerra". Logo, a nova lei poderá considerar frases com a palavra como fake news — a Rússia trata a invasão como "operação especial". Convocar pela internet pessoas para protestos contra a guerra na Rússia também pode ser considerado infração.
Segundo a Reuters, oficiais russos afirmaram constantemente que informações falsas foram espalhadas pelos inimigos da Rússia, tais como os Estados Unidos e seus aliados na Europa Ocidental, com o objetivo de disseminar discórdia entre a população local.
A ação vem acompanhada de um cerco constante contra a mídia independente local e portais internacionais na região, com as autoridades cortando o acesso a materiais de fora.
De acordo com a Vice, a nova lei está sendo vista pelos críticos como grave, pois a redação da legislação é tão ampla que envolve qualquer cidadão que queira expressar sua opinião, além de jornalistas e meios de comunicação.
"[Esta lei] visa qualquer cidadão que fale a verdade", disse Olga Lautman, analista do Kremlin do Centro de Análise de Políticas Europeias, ao site da Vice.
Dancinhas de lado
Do outro lado, a invasão da Rússia à Ucrânia fez perfis de moradores ucranianos no TikTok ganharem uma nova finalidade. As dancinhas engraçadas deram espaço a vídeos com cenas da guerra — em andamento há dez dias no país.
O próprio presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, além de usar a rede, incluiu os tiktokers em um apelo para que a população registrasse e publicasse nas redes sociais o que está acontecendo no país.
Com 60,4 mil seguidores, Alina Volik parou de postar vídeos de suas viagens para mostrar sua rotina durante o conflito. Nas postagens, ela escreve em inglês. "Eu mostro a verdade sobre a Ucrânia nos meus stories."
Em uma das postagens, aparece deitada numa cama, mas subitamente é acordada por uma sirene. "Som de bom dia na Ucrânia", diz, acrescentando que escutou o barulho quatro vezes num mesmo dia.
@alina__volikAnd it's not the worst what I have right now. People in other cities can't even go to the grocery and they sleep on the floor in the metro.
? ???????????? ???? - ukr.kozak
Em outro vídeo, ela conta o que mudou na sua vida desde a invasão. "Nossa academia: ir até o abrigo e voltar para casa. Nosso entretenimento nesses dias é ir até o mercado ou à farmácia. Notícias ao invés de filmes", conta a jovem que, em uma das cenas, mostra prateleiras do supermercado com escassez de produtos.
@alina__volikAnd this is nothing to what people are going through in other regions and cities? watch my inst stories alina__volik ??
? bringing the era back yall - chuuyas gf
Alina revela ainda ter deixado preparada uma mochila de emergência, colocada ao lado da cama, com documentos, dinheiro e kit de primeiros socorros. "Nossas janelas são seladas, então estilhaços não vão se espalhar. Você dorme vestida porque o alarme pode soar de repente. Seus amigos mandam vídeos dos abrigos."
Já Marta Vasyuta, que tem 193,8 mil seguidores, passou a repostar vídeos que circulam na internet. A maior parte deles mostra locais destruídos pelos ataques aéreos. Não é possível saber se ela permanece no país ou se está em outro lugar, e nem se algum dos vídeos são, de fato, dela.
Enquanto Anna Prytula deixou de compartilhar imagens de itens de luxo para mostrar cenas de guerra. Diferente das outras duas, há apenas três vídeos sobre os flagrantes do conflito e só um deles em inglês, no qual escreveu: "Não à guerra". Ela tem 41,9 mil seguidores.
@annaprytulaaano war!!!! Ukraine ??
? ???????????? ???? - Anna Prytulaaa
A TV e a Guerra do Vietnã
O professor de jornalismo na USP (Universidade de São Paulo) Eugenio Bucci ressalta que a própria atuação do presidente da Ucrânia nas redes sociais influencia o uso massivo da plataforma para retratar a guerra.
"O presidente da Ucrânia é uma celebridade nas redes sociais. É um ator e ao mesmo tempo surpreende com uma liderança, que é, em grande medida, uma liderança exercida nas redes sociais, mas no sentido da defesa da paz. É algo novo. O que a gente está vendo na Ucrânia é um roteiro que a gente não tinha um rascunho. Por isso, é preciso muito cuidado para não fazer generalizações em relação a muitos atos desse teatro de guerra."
Bucci relembra que na Guerra do Vietnã a televisão —novidade na época— fez com que a "população despertasse para a ausência de sentido humano" do conflito.
"A televisão no tempo da Guerra do Vietnã era veículo do mercado de consumo. E foi a televisão que começou a carregar imagens mais poderosas para alertar os Estados Unidos sobre os horrores da guerra. Se não tivesse chegado a televisão, não mostraria o que estava acontecendo. Na Ucrânia, o TikTok não é um pilar da democracia, mas indica um canal de reação". (Com agências internacionais e reportagem de Hygino Vasconcelos e Gabriel Daros)
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