Topo

Afinal, por que ainda se sabe tão pouco sobre sexo no espaço?

Falta de incentivo e tabus prejudicam estudos sobre o assunto - iStock
Falta de incentivo e tabus prejudicam estudos sobre o assunto Imagem: iStock

Aurélio Araújo

Colaboração para Tilt, em São Paulo

13/03/2022 04h00

À medida que a humanidade se aproxima de viagens espaciais mais acessíveis, um grupo de cientistas canadenses propôs que se desenvolvesse uma "sexologia do espaço". O tema é espinhoso, uma vez que o sexo fora da Terra é tabu em agências aeroespaciais.

O grupo, liderado por Simon Dubé, pesquisador da Universidade de Concórdia, em Montreal, Canadá, publicou um artigo no final do ano passado, chamado "The Case for Space Sexology" (ou, "O Caso a Favor da Sexologia do Espaço", em tradução livre).

Na proposta, os cientistas defendem que "embora a ciência espacial possa nos levar para o espaço sideral, serão as relações humanas que determinarão se floresceremos como uma civilização ocupante do espaço".

A tese argumenta também que a vida nos habitats espaciais pode impactar as funções reprodutivas e sexuais dos astronautas, restringir a privacidade, impor novos protocolos de abstinência e higiene íntima, além de aumentar os riscos de conflitos interpessoais. Apesar disso, dizem que pouca atenção está sendo direcionada à questão sexual no espaço.

Daí a proposta para o desenvolvimento de um novo campo de estudos, a chamada sexologia do espaço. "Para avançarmos, as organizações da área devem parar de evitar os tópicos sexuais e reconhecer por completo a importância do amor, do sexo e das relações íntimas na vida humana", escreveram os cientistas em texto conjunto publicado em setembro de 2021, no periódico online científico "The Conversation".

Por serem do Canadá, os pesquisadores propõem que a agência espacial do país, a CSA, seja pioneira no desenvolvimento do tema, para que, assim, tal qual em Jornada nas Estrelas, possam "ir audaciosamente onde nenhum homem jamais esteve".

Tabu

O assunto é tópico polêmico na Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, por algumas razões. Uma delas é que a agência considera que a atividade sexual no espaço pode atrapalhar a harmonia da tripulação e, portanto, causar problemas na realização das missões.

Além disso, como uma agência pública que é financiada por verbas estatais, existe uma pressão de parlamentares conservadores para que os fundos não sejam investidos nesse tipo de estudo.

"Nenhuma pesquisa jamais explorou as relações íntimas, nem a experiência humana das funções sexuais e do bem-estar, seja no espaço ou em análogos do espaço, nem a maneira como isso pode afetar a performance da tripulação", afirmou Dubé em entrevista ao site americano Mic.

Consultada pelo Mic, a Nasa se disse aberta a esse tipo de pesquisa, "em caso de surgir a necessidade de um estudo mais profundo sobre a saúde reprodutiva no espaço".

Falta de conhecimento

Uma das questões mais curiosas apontadas pelos cientistas canadenses é que, desde que a exploração espacial começou, há estudos sobre como ela afeta praticamente todas as funções humanas, como fluxo sanguíneo, força muscular e esqueletal, e até mesmo o equilíbrio dos hormônios. Sobre o sistema reprodutivo, porém, as informações são escassas.

No entanto, desde que, na década de 1980, a União Soviética lançou ao espaço a estação Mir, que permitia que os astronautas permanecessem no espaço por meses, a necessidade de falar sobre sexo no espaço aumentou. Já na época, a imprensa internacional questionava se estava havendo sexo no espaço e se ele tinha diferenças para o sexo praticado na Terra.

A Nasa registra ter feito experimentos reprodutivos com moscas, anfíbios, aves e roedores. Em 2018, entretanto, os cientistas Alex Layendecker e Shawna Pandya revisaram os dados desses experimentos e, num artigo sobre a reprodução no espaço, disseram que "não há informações suficientes para concluir se os processos reprodutivos podem ocorrer de forma exitosa no espaço". Além disso, apontaram para o fato de que dados de modelos animais podem não se aplicar a humanos.