Com implante no cérebro, homem paralisado pede cerveja e rock pesado
Um paciente com paralisia total conseguiu se comunicar com frases completas com ajuda de um implante cerebral. Entre seus pedidos, estavam: comer goulash e sopa de ervilha, beber cerveja, e ouvir, bem alto, músicas da banda de metal Tool, segundo estudo realizado pela Universidade de Tübingen (Alemanha), e publicado na revista Nature.
O alemão, de 36 anos, foi diagnosticado com a doença degenerativa Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), a mesma que afetou o sistema nervoso do físico Stephen Hawking. Com o passar do tempo, ela progressivamente restringe os movimentos do corpo, inclusive os faciais e a fala.
Com o implante cerebral, no lugar de o sistema rastrear os olhos do paciente, como é mais comum, a tecnologia conseguiu registrar os pensamentos do homem para compreender o que ele queria dizer.
O paciente foi diagnosticado com ELA em 2015, quando tinha 30 anos. No final daquele ano, ele já não conseguia andar ou falar. Desde 2016, depende de um respirador.
A família, inicialmente, recorreu às técnicas disponíveis para estes casos: comunicadores que se baseiam no movimento dos olhos, para selecionar letras na tela de um computador.
Mas a condição dele se deteriorou, e o alemão não conseguiu mais fixar os olhos em um ponto pelo tempo suficiente para que o sistema traduzisse o que ele queria falar.
A saída dos familiares então foi usar um sistema manual, com papéis com grupos de letras divididos em colunas de cores diferentes, para tentar se comunicar.
Paralelamente, eles procuraram os pesquisadores da universidade, que inicialmente tentaram automatizar o sistema analógico com um novo software. Contudo, o paciente estava piorando, e logo perderia qualquer movimento ocular. Um implante cerebral, inserido cirurgicamente, foi a única alternativa possível.
O implante
"Pequenos eletrodos podem ser implantados no cérebro para registrar diretamente a atividade elétrica das células cerebrais. O procedimento, que envolve fazer um buraco no crânio e cortar as camadas protetoras do cérebro, vem com um pequeno risco de infecção e danos ao cérebro. Então foi o último recurso", explicou o neurocientista Niels Birbaumer.
"Mas quando as interfaces cerebrais não-invasivas e os rastreadores oculares não funcionam mais, não há outra escolha", completou.
No final de 2019, foi realizada a cirurgia para implantar duas pequenas redes de 64 eletrodos com aspecto de agulhas, cada uma com 1,5 milímetros de comprimento, diretamente no córtex motor do homem — região na parte superior do cérebro, responsável pelo controle dos movimentos.
Os primeiros três meses não saíram como o esperado. Os cientistas não conseguiram estabelecer uma comunicação entre o sistema e o paciente.
O avanço veio apenas quando os pesquisadores começaram passaram a usar a tecnologia de neurofeedback (NFB), que monitora e controla em tempo real as ondas cerebrais, para que a própria pessoa consiga "treinar" o cérebro a emitir os sinais que deseja.
Ou seja, o implante funciona como um mouse de computador, movido pela força do pensamento, para disparar comandos.
Primeiro, os cientistas ensinaram o homem a dizer "sim" ou "não", por meio de um sinal sonoro ascendente e descendente, respectivamente. "Em apenas dois dias, ele conseguiu aumentar e diminuir a frequência do tom", diz o engenheiro biomédico Ujwal Chaudhary. "Foi simplesmente incrível."
Com essas respostas, o paciente conseguia selecionar letras, formar palavras e frases completas. Um de seus primeiros pedidos foi para que os enfermeiros reposicionassem seu corpo. Também disse que ama seu "filho legal".
Ele conseguiu realizar essas "sessões de ortografia" em 107 dos 135 dias registrados no estudo, com 80% de precisão. Contudo, em apenas 44 desse período foi que ele conseguiu completar frases compreensíveis.
Resultado anima, mas é preciso cautela
Apesar de inovador, o processo foi difícil e com resultados tímidos. A comunicação ainda é lenta: demora cerca de um minuto para selecionar cada letra.
Contudo, os pesquisadores acreditam que podem aperfeiçoar o software com inteligência artificial para que complete as frases, de acordo com o contexto e as palavras mais usadas pela pessoa.
Com o passar o tempo, o homem do estudo foi diminuindo sua capacidade de formular frases completas, mas continuou respondendo "sim" ou "não". Os cientistas ainda não sabem se isso se deve a fatores técnicos, psicológicos ou biológicos —como tecido cicatrizado ao redor do implante, degeneração do córtex pela doença ou mesmo rejeição do organismo aos eletrodos.
Vale destacar aqui também que os dois neurocientistas que fizeram parte dessa pesquisa chegaram a conduzir dois experimentos semelhantes anteriormente. Segundo reportagem do New York Times, eles tiveram seus estudos criticados pela Fundação Alemã de Pesquisa após a entidade descobrir que eles não forneceram detalhes suficientes das análises e fizeram declarações falsas sobre a metodologia.
*Com informações dos sites Futurism e New York Times.
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