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Rússia usa sistema de foguetes brasileiros contrabandeados do Irã; entenda

Militares russos dirigem um blindado em Mariupol, no sudeste da Ucrânia - STRINGER/REUTERS
Militares russos dirigem um blindado em Mariupol, no sudeste da Ucrânia Imagem: STRINGER/REUTERS

Simone Machado

Colaboração para Tilt, em São José do Rio Preto (SP)

14/04/2022 17h08Atualizada em 15/04/2022 12h20

Munições e equipamentos militares do Iraque estão sendo enviados para a Rússia com ajuda de redes iranianas de contrabando de armas, segundo membros de milícias iraquianas apoiadas pelo Irã e serviços de inteligência regionais. O objetivo é fortalecer os ataques contra a Ucrânia.

Segundo reportagem do jornal britânico The Guardian, RPGs (granadas propelidas por foguetes) e mísseis antitanque, bem como sistemas de lançamento de foguetes projetados no Brasil, foram enviados do Iraque para a Rússia.

Uma fonte que ajudou a organizar o transporte afirmou que as autoridades de Teerã, capital do Irã, também doaram a Moscou um sistema de mísseis Bavar 373, de fabricação iraniana, semelhante ao russo S-300.

Por que isso importa?

Usar o submundo do tráfico de armas sinalizaria uma mudança na estratégia russa diante das sanções recebidas após invadir o território ucraniano. Moscou agora é forçado a se apoiar no Irã, seu aliado militar na Síria, destaca o jornal.

"Se o regime de Putin for desestabilizado, isso terá enormes implicações para o Irã, particularmente na Síria, onde Damasco depende do apoio aéreo russo e das coordenadas da Rússia para evitar conflitos diretos entre eles e Israel", explica Mohaned Hage Ali, analista do Carnegie Middle East Center (Centro de estudos e pesquisas sobre políticas públicas no Oriente Médio).

De acordo com a reportagem, o contrabando desses materiais também tem reflexos diretos no volume do comércio internacional do tráfico de armas.

Após duas décadas de guerra, o Iraque se tornou uma região inundada de armamentos. Desde a derrubada de Saddam Hussein, em 2003, o país recebeu tropas norte-americanas e outras ocidentais.

Os EUA, por exemplo, treinaram e forneceram várias unidades do exército e forças especiais iraquianas para defender o governo de Bagdá, capital do Iraque, contra rebeliões.

Isso fez com que grande parte dessas armas caísse nas mãos de milicianos. Conhecidos por sua eficiência em combater o Estado Islâmico, esses grupos se tornaram peças importantes no sistema de segurança do Iraque.

Lançadores projetados no Brasil

Ainda segundo o jornal, RPGs e mísseis antitanques que estavam na posse de Hashd al-Shaabi, um dos nomes mais poderosos da milícia xiita, foram transportados para o Irã através da fronteira de Salamja no dia 26 de março, onde foram recebidos pelos militares iranianos e levado para a Rússia por mar.

Hashd al-Shaabi também enviou para o Irã em 1º de abril parte de dois sistemas lançadores de foguetes Astros II, projetados no Brasil pela empresa brasileira Avibras. A tecnologia é conhecida no Iraque como a versão licenciada Sajil-60.

João Marcelo Dalla Costa, especialista em veículos blindados e ex-professor da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, afirmou, em entrevista dada no ano passado, que o sistema de foguetes fazia parte da "nata da tecnologia militar brasileira, o que temos de mais avançado junto com o veículo blindado Guarani."

"Nossos foguetes têm entre 30 e 80 km de alcance, mas está em processo de construção um equipamento com 300 km de alcance, que permitirá defender toda a nossa região costeira", acrescentou na época.

A apuração do The Guardian indica ainda que, nas datas citadas pelo comandante da milícia xiita, três navios de carga capazes de transportar equipamentos militares, dois com bandeira russa e um com bandeira do Irã, cruzaram o Mar Cáspio indo do porto iraniano de Bandar Anzali para Astrakhan, uma cidade russa no Delta do Volga.

"O que os russos precisam na Ucrânia agora são mísseis. Eles exigem habilidade para transportar, pois são frágeis e explosivos, mas se você estiver comprometido em fazê-lo, é possível", afirmou Yörük Isik, especialista em assuntos marítimos de Istambul, ao jornal.

"Também não é o tipo de atividade que seria captada por imagens de satélite, pois elas podem ser transportadas em caixas grandes e contêineres regulares", completou.

Mohaned Hage Ali destaca que Ashd al-Shaabi controla grande parte da região fronteira com o Irã, o que facilitaria esse transporte de armamentos. "O Irã quer garantir que a Rússia não perca terreno neste conflito."

Mudando os planos

Perdas significativas renderam pouco ganho: Moscou, por enquanto, parece ter abandonado sua tentativa de tomar a capital, Kiev, e, em vez disso, reduziu e reposicionou suas forças terrestres para um novo ataque à região de Donbass, no sudeste do país.

Espera-se que os ataques aéreos e de artilharia continuem nas cidades de Kharkiv e Mykolaiv, bem como no porto sitiado de Mariupol.

Errata: este conteúdo foi atualizado
No 8º parágrafo, o correto é "forças especiais iraquianas", e não "iranianas", como dizia uma versão anterior deste texto. O erro foi corrigido.