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Entenda as polêmicas por trás da compra do Twitter pelo bilionário Musk

Elon Musk - Mike Blake/Reuters
Elon Musk Imagem: Mike Blake/Reuters

Marcella Duarte

Colaboração para Tilt, em São Paulo

26/04/2022 04h00

Depois de semanas de especulação, o acordo de compra do Twitter pelo bilionário sul-africano Elon Musk foi oficializado ontem (25) num valor que deve girar em torno de US$ 44 bilhões (cerca de R$ 214 bilhões). Com a aquisição, a companhia deixará de ter ações negociadas na bolsa, e se tornará de capital fechado.

O empresário, fundador da Tesla (empresa de carros elétricos) e da SpaceX (de exploração espacial), pode estar satisfeito com a aquisição, mas continua no meio de polêmicas. A hashtag "RIPTwitter" (descanse em paz, Twitter) virou parte dos tópicos mais comentados da plataforma ontem. Internautas já ameaçam abandonar a rede social.

Entenda a seguir os principais capítulos que fizeram parte dessa novela pública.

"Liberdade de expressão é a base do funcionamento da democracia, e o Twitter é a praça de discussão digital, onde são debatidos os assuntos vitais para o futuro da humanidade", disse Musk em comunicado após o anúncio oficial da compra.

Março de 2022: A cruzada contra o Twitter

"Tuiteiro" muito ativo desde 2009, Musk é o oitavo maior perfil da rede social. Ele tinha 81 milhões de seguidores até a semana passada. Agora, soma 83,8 milhões.

Nos últimos meses, ele vinha questionando mais intensamente a falta de liberdade de expressão (ou discurso livre; free speech, em inglês) e a moderação de conteúdo no Twitter (como bloqueio de usuários e exclusão de comentários que violem os termos de uso).

Musk é um dos maiores críticos ao banimento permanente do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump da plataforma — ele foi suspenso do Twitter acusado de incitar a violência durante a invasão ao Capitólio, Congresso dos EUA.

Ele chegou a dizer que estava "pensando seriamente" em criar sua própria rede social, livre de algoritmos.

"Liberdade de expressão é essencial para o funcionamento da democracia. Você acredita que o Twitter cumpre rigorosamente este princípio?", perguntou Musk em uma enquete: 70% dos mais de 2 milhões respondentes disseram que não.

"As consequências desta pesquisa serão importantes, vote com cuidado", aconselhou o bilionário — até então, ninguém sabia que ele já havia secretamente comprado uma parte do Twitter.

4 de abril: Musk compra parte do Twitter e vira maior acionista

Musk comprou quase 74 milhões de ações do Twitter, por um total de US$ 2,89 bilhões (R$ 13,5 bilhões), se tornando o maior acionista da empresa na época. A compra aconteceu em 14 de março deste ano, mas foi revelada apenas em um relatório, três semanas depois.

A inesperada atitude levantou questionamentos sobre a influência de Musk nos rumos da empresa, que é seu megafone digital. Em seus anos como "tuiteiro", Musk já manipulou o valor de ações de seus negócios, jogou cortinas de fumaça em notícias negativas sobre ele e suas empresas, espalhou desinformação sobre testes de covid-19 e menosprezou a gravidade da pandemia.

7 de abril: Foto com maconha e conselho "pegando fogo"

Em 2018, Musk foi forçado a deixar presidência do conselho Tesla por causa de um tuíte publicado em sua conta dizendo que o capital da empresa seria fechado, pagando por ação US$ 420 (o número símbolo da maconha). A brincadeira rendeu uma acusação de fraude e de indução de investidores ao erro. Foi estipulada uma multa de US$ 20 milhões.

Na época, uma foto de Musk fumando maconha registrada durante o podcast de Joe Rogan fez as ações da Tesla caírem. No dia sete de abril deste ano, ele usou essa mesma imagem para dizer que a próxima reunião do conselho do Twitter iria "pegar fogo".

8 de abril: Musk perde posto de maior acionista do Twitter

O posto durou pouco. Dias depois de se tornar o maior acionista, o grupo de investimentos Vanguard revelou que possuía 82,4 milhões de ações do Twitter, ou 10,3% da empresa, valor acima do investido por Musk.

9 de abril: "O Twitter está morrendo?"

Musk passou o final de semana criticando a rede social. Em um dos tuítes, perguntou se a plataforma estava morrendo: "Por exemplo, a Taylor Swift não postou nada em três meses. E o Justin Bieber só postou uma vez este ano".

9 de abril: Musk desiste de fazer parte do conselho

Musk chegou a ser indicado e aceitou participar do conselho de administração do Twitter quando comprou as ações no início de abril. Porém, no dia de sua nomeação, desistiu.

Rejeitando a cadeira, o empresário se desvinculou de um limite de deter no máximo 14,9% das ações (acordo entre os conselheiros), e passou de um investidor passivo para ativista — que tenta influenciar agressivamente as políticas e decisões da empresa.

A atitude demonstrou planos ambiciosos, e também o clássico jeitinho de Musk se envolver em tretas.

14 de abril: Musk oferece bilhões pelo Twitter

O polêmico bilionário ofereceu US$ 54,20 (R$ 250) por cada ação que ele não possuía do Twitter (90,8% da empresa). "O Twitter tem um potencial extraordinário. E eu vou desbloqueá-lo", escreveu em uma carta ao presidente da companhia, Bret Taylor.

Na data, Musk já demonstrava o desejo de fechar o capital da empresa: ou seja, ela não teria mais movimentação na bolsa de valores e acionistas. Segundo ele, haveria um conselho diretivo, mas sem remuneração.

O receio de que isso diminuísse a transparência nas decisões da empresa foi levantado, já que, com capital aberto, ela é obrigada a fazer relatórios públicos e prestar contas para os investidores. Fechada, não há pressão para maior fiscalização das regras e procedimentos internos.

14 de abril: Musk diz não mirar nos lucros do Twitter

Na conferência TED 2022, em Vancouver, Canadá, Musk afirmou que sua proposta de compra foi motivada pelo interesse público e pela liberdade de expressão, "um imperativo social para uma democracia em funcionamento", e não por lucros.

15 de abril: Twitter se protege com "pílula de veneno"

O conselho do Twitter decidiu adotar uma manobra conhecida como "pílula de veneno" (poison pill) para impedir que Musk usasse táticas hostis ou coercitivas para tomar o controle da empresa. Na prática, se qualquer acionista adquirir mais de 15% de participação, sem aprovação do conselho, os demais acionistas poderiam comprar ações adicionais pela metade do preço — o que reduziria a propriedade de Musk e tornaria a aquisição mais difícil e cara.

O plano, que ficaria vigente por um ano, foi um indicativo de que o conselho parecia tender para a recusa da oferta de Elon Musk — o que não ocorreu.

20 de abril: Dinheiro negado três vezes

Mesmo o homem mais rico do mundo não consegue US$ 43 bilhões do dia para a noite. Boa parte de sua fortuna está travada em ações e outros investimentos. E até para Musk foi difícil conseguir crédito na praça: ele levou três "nãos" das gestoras de recursos Blackstone, Vista Equity e Brookfield.

21 de abril: Musk diz ter conseguido US$ 46,5 bilhões

Em um documento apresentado à SEC (Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos), Musk detalhou seu plano de financiamento para realizar a compra do Twitter: dois empréstimos, um de US$ 13 bilhões e outro de US$ 12,5 bilhões, junto ao banco Morgan Stanley, e mais US$ 21 bilhões de sua fortuna pessoal. Um dos empréstimos tem a empresa Tesla como garantia.

25 de abril: Compra é oficializada

Durante a noite de domingo (24), houve uma reunião de acionistas na qual foi decidido que a empresa deveria abrir negociações com Elon Musk.

Perto das 15h50 de segunda, o Twitter emitiu um comunicado informando que aceitou o acordo integral de compra proposto por Elon Musk. O empresário pagará US$ 54,20 por ação (cerca de R$ 264) da companhia. Ainda não há detalhes sobre como ficará o comando do Twitter após a empresa fechar seu capital.

Musk prevê tornar públicos os algoritmos da rede, para que as pessoas confiem mais na plataforma, ampliar o combate aos bots (robôs ou usuários de comportamento automatizado) que semeiam spam. Outra ideia é autenticar todos os seres humanos que participam da rede social.

Entre outras mudanças que podemos esperar, de acordo com seus próprios tuítes estão: moderação de conteúdo mais branda e lançamento da função para editar tweets (na qual a empresa já revelou estar trabalhando).

O empresário afirma que a compra não foi feita pensando em lucro, mas esse é um desafio de anos do Twitter. Nos últimos meses, o "patinho feio das redes sociais" tem enfrentado grande escrutínio por questões de conteúdo e lutado ainda mais para reacender o crescimento de usuários.

O desafio do novo dono será reestruturar a plataforma para ter mais audiência e lucro nos próximos anos para fazer os seus bilhões valerem a pena.