Topo

Robôs e IA podem agilizar tarefas sem 'deletar' trabalhador humano?

sompong_tom/Getty Images/iStockphoto
Imagem: sompong_tom/Getty Images/iStockphoto

Fernanda Canofre

Colaboração para Tilt, em Porto Alegre

06/05/2022 11h12Atualizada em 06/05/2022 14h34

O avanço tecnológico permitiu que robôs e inteligência artificial realizassem algumas tarefas mais rápidas e precisas do que humanos. Por isso, não é à toa que discussões sobre máquinas substituindo pessoas sejam tão recorrentes. Contudo, se depender de startups brasileiras, o trabalho para que exista um equilíbrio nessa relação está sendo feito.

As tecnologias vão reduzir riscos e agilizar atividades sem deletar o papel do trabalhador. É o que defende Luma Boaventura, presidente-executiva e cofundadora da AI Robots, com foco em usar robótica e IA para otimizar processos em indústrias.

"A tecnologia não veio para substituir, mas para complementar os profissionais e trazer mais qualidade de vida para a gente", afirmou a executiva durante participação em palestra sobre "O futuro da robótica", realizada no evento South Summit, em Porto Alegre, nessa quinta-feira (5). Realizado tradicionalmente em Madri (Espanha) desde 2012, é a primeira vez que o encontro sobre inovação acontece no Brasil.

Usos de robôs e inteligência artificial

Um exemplo dado por Boaventura em sua apresentação foi a de um cliente produtor de celulose. Cada vez que fardos com o produto tinham que ser colocados em trens para serem transportados, era preciso que um trabalhador movimentasse a pesada porta do vagão para inserir a carga lá dentro, enfrentando risco de acidente e desconforto ergonômico. Para resolver a questão, um robô foi integrado ao processo.

"O trabalhador continua lá, mas ele não faz mais a função de arraste da porta, que era a mais crítica. Ele faz a abertura, que é muito delicado [para] o robô fazer, e o robô faz o processo pesado de deslocar a porta", explica. "Esse é o futuro da robótica, enxergá-la como a serviço do ser humano. A gente precisa aculturar as pessoas do Brasil para que elas percam o medo [das tecnologias]."

A startup AI Robots, fundada em 2019, trabalha instalando em indústrias robôs fabricados por duas empresas estrangeiras: a dinamarquesa Universal Robots e a japonesa Omron. Entre os clientes atendidos, há empresas do setor siderúrgico, automotivo e varejo.

Além disso, as máquinas podem ser contratadas para resolver demandas específicas, como contagem de estoque em gôndolas e de monitoramento dos próprios robôs —se um defeito pode ser previsto em um dos robôs, por exemplo, é possível fazer o reparo sem que a linha de produção seja paralisada.

Em outro painel do South Summit, focado no uso de inteligência artificial na área da saúde, Henrique Dias, cientista de dados e fundador da NoHarm.ai, também defendeu que dificilmente a tecnologia irá substituir pessoas.

Sua startup, criada dentro da PUC-RS, disponibiliza tecnologia de forma gratuita a hospitais do SUS (Sistema Único de Saúde), usando inteligência artificial para auxiliar a Farmácia Clínica na revisão de prescrições dadas a pacientes. A remuneração da empresa, sem fins lucrativos, vem da atuação junto a hospitais privados.

A inteligência artificial foi programada para funcionar junto ao prontuário eletrônico do hospital. Ela lê informações dos pacientes, principalmente as prescrições, e gera um conjunto de alertas. A velocidade do processo de revisão, diz ele, aumentou em oito vezes num dos hospitais, usando o mesmo número de funcionários.

"A inteligência é um meio, assim como o celular ou qualquer outra tecnologia. Ela vai ajudar, melhorar processos, automatizar tarefas, mas eu vou precisar que o ser humano tome a decisão. Não tem como esperar que alguém vá laudar um exame através de uma IA", explica o cientista de dados.

"Eu preciso que um médico valide porque a IA pode errar e eu preciso da subjetividade desse problema, que vai ser resolvido por um humano", completa.

No painel mediado por Dias, quando ele apresentou a mesma questão aos outros participantes, Renato Cardoso, presidente-executivo da plataforma "Dr. Consulta", negou a possibilidade de um futuro onde a inteligência artificial dispensará o profissional humano.

"Análise de dados traz eficiência. Mas na saúde tem a questão do humanismo, do toque, do conforto, isso faz parte do tratamento, afeto. A humanidade não vai ser substituída, mas dados geram eficiência e melhoram capacidade do médico", destacou.

O uso da tecnologia ajuda ainda a tornar modelos computacionais mais preditivos (sistemas que preveem determinadas situações com base em dados), evitando complicações e reduzindo custos de tratamento de alta complexidade, por exemplo, aponta Cardoso.

"Cinco anos atrás, eu dava palestras, tinha três ou quatro startups usando inteligência artificial. Hoje, não tem startup na saúde que não use. Se não usar, vai perder mercado. É padrão da indústria", destaca Dias.

Educar sobre as vantagens da tecnologia

A empresa de Luma, que não tem local físico já que o trabalho da equipe é feito remoto, também trabalha com inteligência artificial, mas ela avalia que a demanda ainda é um pouco menor do que para a robótica no Brasil, com o país recém entrando no cenário da chamada indústria 4.0.

De qualquer forma, a executiva destaca o quanto é importante que os profissionais humanos entendam como as tecnologias podem ajudá-los em suas atividades.

"Não tem como trazer tecnologia sem pessoas. Primeiro, a gente leva a educação tecnológica, faz uma visita em campo na indústria, entende com os gestores e operadores onde estão os gargalos. Aí monta um estudo, explica o que é a tecnologia para o operador perceber que ele é parte do processo, não uma pessoa excluída", conclui.

A mudança é inevitável

Segundo especialistas e consultores de mercado, é inevitável que empregos deixem de existir e profissões desapareçam conforme novas tecnologias surjam e as antigas se fortaleçam. Mas, ao mesmo tempo, acredita-se que novas vagas serão criadas. O desafio aqui passa então a ser em termos de qualificação.

Por isso, é fundamental que empresas e governos invistam em treinamentos e ensino de novas habilidades para que profissionais possam continuar no mercado de trabalho. A preparação antecipada de políticas assistenciais e a chamada renda básica universal também são vistas como formas eficientes de apoio aos trabalhadores.

Essa renda envolveria uma espécie de bolsa paga por governos visando alimentação e necessidades básicas ao indivíduo. Bill Gates, grande nome da indústria da tecnologia e fundador da Microsoft, por exemplo, chegou a propor um "imposto de renda robótico". Ou seja, uma taxa paga por empresas cada vez que um robô substituir um humano.

Elon Musk, fundador da Tesla (de veículos elétricos), SpaceX (aeroespacial) e, possivelmente, novo dono do Twitter, já deu declarações destacando que algum tipo de renda básica universal será necessária diante do avanço das tecnologias no mercado de trabalho.