Norte virou Sul: cientistas veem buraco negro invertendo campo magnético
A misteriosa explosão de uma galáxia, a 236 milhões de anos-luz de distância da Terra, pode ter sido desencadeada pela reversão magnética de um buraco negro supermassivo. Agora cientistas tentam explicar este fenômeno nunca antes testemunhado.
Diante de nossos "olhos" — na verdade, de telescópios —, a galáxia 1ES 1927+654, na constelação do Dragão, ficou muito brilhante e depois parou de emitir raios-X. Por pouco tempo. Após alguns meses, as emissões não só voltaram como aumentaram.
A melhor explicação para as estranhas características da erupção, de acordo com uma equipe internacional de cientistas, são mudanças no ambiente do buraco negro que fica no centro da galáxia. Ele pode ter, súbita e espontaneamente, invertido o campo magnético ao seu redor — ou seja, trocado seu norte pelo sul.
"Mudanças rápidas na luz visível e ultravioleta já foram vistas em algumas dezenas de galáxias semelhantes a esta", explica Sibasish Laha, pesquisador da Nasa. "Mas este evento marca a primeira vez que vimos raios-X caindo completamente, enquanto outros comprimentos de onda se iluminaram."
Como foi detectado?
O estudo que descreve o fenômeno, liderado por Laha, foi aceito para publicação na revista The Astrophysical Journal e está disponível previamente. Sua equipe analisou observações antigas em diversos espectros de luz, registradas por diversos instrumentos.
Em março de 2018, astrônomos detectaram que a galáxia 1ES 1927+654 tinha ficado quase cem vezes mais brilhante na luz visível. Uma pesquisa em detecções anteriores revelou que a erupção havia se iniciado meses antes, no final de 2017.
Em maio, a radiação ultravioleta (UV) estava 12 vezes mais elevada, mas caindo rapidamente. Em junho, as emissões de raio-X de alta energia desapareceram.
"Foi muito emocionante mergulhar no estranho episódio explosivo desta galáxia e tentar entender os possíveis processos físicos em ação", disse o astrofísico espanhol José Acosta-Pulido, coautor do estudo.
Vale explicar que a maioria das grandes galáxias, incluindo a Via Láctea, hospeda em seu "coração" um buraco negro supermassivo, com até bilhões de vezes a massa do nosso Sol. A matéria capturada por ele vai se acumulando em uma vasta estrutura achatada ao seu redor, chamada de "disco de acreção".
À medida que o material gira lentamente, sendo puxado para o centro, é aquecido e emite luz visível, UV e raios-X de baixa energia. Bem perto do buraco negro, uma nuvem de partículas extremamente quentes — chamada "coroa" — produz raios-X de alta energia. O brilho depende de quanta matéria flui.
O que pode ter acontecido?
Uma interpretação inicial sugeria que a explosão foi desencadeada por uma estrela que passou tão perto do buraco negro que foi dilacerada, interrompendo o fluxo de gás. Porém, os pesquisadores mostraram que um evento deste tipo desapareceria mais rapidamente.
A rara pausa nas emissões de raios-X forneceu aos astrônomos uma pista importante. Eles suspeitam que o campo magnético do buraco negro cria e sustenta a coroa, e que qualquer mudança magnética pode afetar suas propriedades de radiação.
"Uma inversão magnética, onde o polo norte se torna sul e vice-versa, parece se adequar melhor às observações", disse outro coautor, Mitchell Begelman, que desenvolveu o modelo magnético. "O campo enfraquece inicialmente na periferia do disco de acreção, levando a um maior aquecimento e brilho na luz visível e UV" no centro da galáxia.
A coroa vai diminuindo e o disco ficando mais compacto. À medida que a inversão progride, o campo se torna tão fraco que não pode mais suportar a coroa — e a emissão de raios-X para. Mas, depois, o campo magnético gradualmente se fortalece em sua nova orientação.
Em outubro de 2018, cerca de quatro meses após o desaparecimento, os raios-X voltaram, indicando que a coroa havia sido totalmente restaurada. No segundo semestre de 2021, a galáxia já havia retornado completamente ao seu estado pré-erupção.
É normal?
Reversões magnéticas, provavelmente, são eventos comuns no universo. O registro geológico da Terra, por exemplo, mostra que o campo magnético realmente muda de forma imprevisível, com algumas inversões a cada 1 milhão de anos.
O Sol, por sua vez, passa pelo processo frequentemente em seu ciclo normal de atividade, alternando os polos norte e sul a cada 11 anos, em média.
*Com informações da Nasa
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