Pouco espaço no guarda-roupa? Aumente o HD: as roupas digitais vêm aí
Imagine um futuro em que, antes de uma reunião de trabalho virtual no home office, você não precise trocar seu pijama por uma roupa mais séria. O computador fará isso para você.
Acredite: as chamadas roupas digitais já são uma realidade. O Tech Trend Reports, publicação anual do Future Today Institute sobre tendências de mercado e tecnologia, apontou 2022 como o ano em que itens de vestuário criados em pixel e tecnologia 3D vão se popularizar de vez.
Para quem joga videogame, o conceito é familiar. Em games como Fortnite e Free Fire, as chamadas "skins" já servem para mudar o visual do personagem instantaneamente. E são uma enorme fonte de rendas para as produtoras de jogos, movimentando US$ 40 bilhões ao ano, de acordo com a plataforma e market place Dmarket. Em 2022, esse valor deve chegar a US$ 50 bilhões.
Semana da Moda do Metaverso
Essa nova moda está atraindo velhos nomes. Em março, a primeira Metaverse Fashion Week na plataforma de metaverso Decentraland tinha tudo que uma semana da moda física costuma oferecer: desfiles, exposições, festas — e marcas como Dolce & Gabbana, Hugo Boss e Tommy Hilfiger. No total, foram mais de 60 grifes.
Em 2021, a italiana Gucci criou, pela primeira vez em sua história, um modelo que não podia ser vestido fisicamente. Era o tênis Virtual 25, para ser usado em ambientes virtuais como Roblox e VRChat. Custava US$ 12.
Por falar em tênis, a Nike adquiriu recentemente uma marca nativa digital, a RTFKT, que cria calçados e outros tokens não-fungíveis (NFT).
No início deste ano, a gigante de fast fashion sueca H&M anunciou a criação de uma linha totalmente digital em parceria com a plataforma de roupas virtuais DressX e com a atriz Maise Williams (a Arya de "Game of Thrones").
A DressX é um dos principais cases no segmento. Em junho do ano passado, recebeu US$ 2 milhões de fundos de investimentos e investidores-anjo. Em novembro, outra rodada: mais US$ 3,3 milhões. As fundadoras Natalia Modenova e Daria Shapavalova terminaram o ano entre as "50 pessoas mais disruptivas da America", segundo a revista Newsweek.
Mas elas estão longe de serem as únicas players no mercado. Os últimos anos viram surgir uma leva de market places nesse segmento, como XR Couture, The Dematerialised e The Fabricant.
Para vestir no Insta
Por enquanto, os principais clientes estão nas redes sociais - influenciadores que querem ir muito além dos "recebidinhos" que grifes tradicionais mandam em massa para várias celebridades online. Afinal, por que ser igual se você pode ser digital?
"As redes sociais estão deixando de ser uma curadoria de momentos específicos de nossas vidas para se tornar experimentos mais criativos de nossas identidades", acredita Daniella Loftus, fundadora da This Outfit Does Not Exist ("Esta Roupa Não Existe", em inglês), empresa criada para impulsionar a moda digital - e, claro, virar uma gigantesca influenciadora nas redes.
Parece loucura, mas faz sentido: segundo um levantamento do e-commerce Squarespace em parceria com a empresa de pesquisa The Harris Poll, 60% da geração Z considera sua apresentação virtual mais importante que a física. "Conforme caminhamos nesse sentido, obviamente, precisaremos de algo para vestir", avalia Loftus.
Mas como funciona? Na DressX, você encontra um tutorial. Você precisa enviar uma foto de corpo todo, com roubas básicas justas no corpo e bem iluminada com luz natural. A resolução precisa ser de pelo menos 1 MB.
Aí é só escolher sua roupa digital no catálogo, pagar, e pronto. Pouco tempo depois, você recebe a imagem tratada com a vestimenta aplicada em você, com o caimento perfeito - não importa como você posou braços ou pernas, por exemplo. Hora de postar nas redes!
Do virtual de volta ao real
"O que é muito empolgante na moda digital é que tudo que você precisa é o custo de um computador", diz Loftus. "Você pode renderizar um modelo e basicamente ter seu design distribuído para qualquer lugar do mundo de forma digital, ou mesmo produzi-lo fisicamente sob encomenda, se houver demanda."
Para as empresas tradicionais, uma das vantagens é otimizar estratégias de comunicação e campanhas de lançamento em redes sociais. Ou até mesmo testar o mercado e repensar a gestão da manufatura.
"Você não precisa produzir de fato uma peça para testá-la: é possível fazer isso exibindo réplicas digitais em mídias sociais, em diferentes cores, tamanhos e formatos, e aí decidir quais itens devem ser fabricados", diz Nadzeya Kalbaska, coordenadora do programa de mestrado em comunicação para moda digital na Università della Svizzera Italiana, na Suíça.
"As cadeias de suprimentos ainda não estão prontas para adotar essa inovação, mas a tecnologia está aqui: essas imagens em 3D já são usadas por designers e pelo back office e agora estão ganhando papel central também em departamentos como e-commerce, comunicação e merchandising", avalia.
Mais sustentável?
O relatório do Future Today Institute crava que "a capacidade de se expressar livremente no metaverso por meio de estilos virtuais pode estimular hábitos de compra mais sustentáveis quando se trata de vestuário físico", mas a questão ainda é controversa.
O slogan da Dress X já afirma: "Não compre menos, compre moda digital". De fato, nenhum especialista prevê que roupas tradicionais vão desaparecer - ou sequer ver sua produção radicalmente diminuída.
A segunda metade pode sair do digital: para Kalbaska, as peças virtuais podem levar a compras reais.
"Eu entendo os motivos que fazem a indústria querer associar a ideia de sustentabilidade, mas tenho sérias preocupações sobre isso", diz. "No caso dos influenciadores, realmente reduziria o número de peças produzidas e enviadas para eles, mas estamos falando de uma porcentagem muito pequena; e, para o consumidor, a possibilidade de experimentar mais modelos e cores pode, inclusive, levar a mais compras físicas."
E complementa: "Ainda é necessário pesquisar mais para entender esse novo domínio em rápido desenvolvimento, tanto pela indústira quanto pela academia."
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