Quem fala português enxerga cores diferente de quem fala inglês, diz estudo
Quem já foi até uma loja de construção comprar tinta para pintar a casa deve ter se deparado com um catálogo de cores no mínimo curioso. Descobrimos, por exemplo, que nem todos os brancos são iguais. Ele pode aparecer na forma de "branco gelo", "branco neve", "off white" (quase branco), "branco renda antiga", "branco baunilha", entre outras variações.
O mesmo acontece com outras cores neutras, como o bege, o preto e até mesmo o cinza (senão, de onde viria o título do filme "50 Tons de Cinza"?)
Se apenas pensamos nessas variações de maneira abstrata, sem observá-las primeiro, podemos não conseguir diferenciar uma da outra. Mas quando aproximamos as tonalidades e damos nomes a elas, percebemos até que há grandes diferenças entre os tons.
Essa capacidade de enxergar tonalidades diferentes para uma mesma cor pode ser maior para nós, brasileiros, que falamos a língua portuguesa, do que talvez para os norte-americanos e ingleses, que falam o idioma inglês, cujo vocabulário referente às nuances cromáticas é mais reduzido.
É o que sugerem algumas pesquisas científicas, que têm investigado como as aparências das cores estão intrinsecamente ligadas ao nosso idioma materno, nossas experiências de aprendizagem e até mesmo pelas influências culturais que recebemos.
Ou seja, quanto mais verbetes ou expressões são utilizadas para nomear diferentes categorias de cores, mais conseguimos perceber (e lembrar) as variações.
Um artigo do The Conversation traz outros exemplos para a mesma questão. O texto, publicado na última semana, mostra como a cor azul pode ser percebida entre diferentes povos.
Pessoas que falam a língua russa, grega e turca conseguem distinguir mais rapidamente — e com mais confiança — o azul claro e o azul escuro, do que os ingleses e espanhóis, que utilizam uma mesma expressão para se referir aos diferentes tons de azuis.
A língua grega, por exemplo, possui um termo específico para azul claro — a palavra "ghalazio" — e um para azul escuro — a palavra "ble". "Logo, são cores diferentes para os gregos", diz o artigo.
Esse assunto vem sendo pauta de revistas científicas pelo menos desde o fim do século XIX. Um dos principais estudiosos do tema foi o linguista Benjamin Lee Whorf. Ele foi um dos criadores da teoria chamada relatividade linguística.
De acordo com essa hipótese, a estrutura de uma linguagem afeta diretamente a visão de mundo e os aspectos cognitivos de seus falantes.
Linguagem pode reduzir cores a tonalidades opostas
Em meados do século XX, outras teorias a respeito da percepção cromática surgiram, aprofundando ainda mais a relação entre linguagem e tonalidades. Após estudar o vocabulário das cores em mais de 100 idiomas, os antropólogos norte-americanos descobriram que alguns povos restringem bastante o dicionário das cores.
Além de reforçar a teoria de quanto menos palavras, menos cores disponíveis, eles notaram ainda que as expressões obedecem a uma hierarquia: elas começam a partir dos preto e branco e vai ampliando em direção às outras quatro cores básicas: verde, vermelho, azul e amarelo.
E quando o vocabulário das cores permanece reduzido, as percepções cromáticas podem ser limitadas às tonalidades escura/clara ou fria/quente. É o caso de países como Papua-Nova Guiné — que fala a língua dani — e Libéria e Serra Leoa, que falam o idioma bassa.
Nestas línguas, em que existem apenas dois termos para se referir às cores, o preto, o azul e o verde são percebidos como tons frios, enquanto o branco, vermelho e amarelo são entendidos como tons quentes.
Novas línguas, outras cores
Mais recentemente, em 2018, um novo estudo, desta vez publicado pela PNAS, revista oficial da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, demonstrou ainda que a percepção das cores pode mudar a partir do momento em que aprendemos, por exemplo, uma segunda língua.
Com treinamento rápido, qualquer pessoa pode expandir seu vocabulário de cores e aprender facilmente a diferenciar diferentes tonalidades, porque nossa forma de enxergá-las depende sobre como nosso cérebro as interpreta.
Ou seja, uma pessoa que foi alfabetizada na língua inglesa pode se familiarizar com os diferentes tipos da cor azul ao aprender o idioma português ou grego, por exemplo.
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