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Como são feitos os acoplamentos de naves no espaço?

A Estação Espacial Internacional viaja a 20 mil km/h na órbita da Terra - Handout / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
A Estação Espacial Internacional viaja a 20 mil km/h na órbita da Terra Imagem: Handout / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP

De Tilt, em São Paulo

05/11/2022 04h00

Se estacionar um carro numa vaga às vezes já é um desafio e tanto, imagine fazer isso sem gravidade, além da estratosfera? O acoplamento de naves e objetos espaciais requer cálculos extremamente complexos, propulsores muito bem calibrados e uma imensa afinidade com as leis da Física. Os cálculos são feitos tanto por equipes de cientistas quanto por computadores especialmente programados para acoplamentos em gravidade mínima.

Estes acoplamentos espaciais ocorrem entre a Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês) - uma estrutura de 400 toneladas que está na órbita da Terra, cheia de laboratórios e mantida por diversos países - e naves e foguetes - que também são enormes, mas perto da ISS parecem minúsculos - que viajam até lá.

Além de ser gigantesca, a estação espacial percorre a órbita da Terra a uma velocidade superior a 20 mil km/h. Por isso, a nave que vai acoplar-se à ISS deve também atingir essa velocidade, e mantê-la constante.

Quando uma nave espacial cheia de equipamentos e suprimentos, por exemplo, viaja até o espaço a fim de acoplar-se à ISS, a primeira coisa a fazer é alinhá-la à órbita da estação espacial. Ou seja, computadores calculam a distância atual da estrutura em relação à Terra e enviam a nave exatamente para a mesma distância.

Tanto a ISS quanto a nave devem se movimentar na mesma direção. Se fosse de encontro uma à outra, poderiam provocar um acidente que poderia ser fatal para os tripulantes da Estação. Propulsores localizados em partes estratégicas do exterior da nave espacial fazem todo o trabalho para que ela se alinhe na mesma direção da ISS e alcance a mesma velocidade de órbita.

Quando a nave chega bem perto da estação, seus computadores começam a "conversar" com os da ISS e de centros de comando na Terra para ajustar a posição exata do acoplamento. Os computadores enviam comandos para ligar os propulsores e ajustar a posição em alguns centímetros.

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Astronauta Jerry Ross durante caminhada espacial ao redor da Estação Espacial Internacional (ISS), realizada em 2002
Imagem: AFP/Nasa

Se algo der errado, mãos humanas também podem enviar comandos, mas essa é uma operação muito rara. Além disso, câmeras e lanternas que saem de braços mecânicos das naves e ficam do lado de fora ajudam os astronautas e a equipe em solo a checarem visualmente as posições das naves.

Para que haja um acoplamento, é preciso que cada uma das duas naves tenha uma grande peça circular cheia de encaixes mecânicos e eletrônicos que se conectem perfeitamente. Após se conectarem, as duas naves começam a nivelar a pressão - se a despressurização de uma nave em relação à outra não ocorrer, elas podem explodir quando a porta (que fica no meio do círculo) se abrir.

Depois que a pressão é nivelada dentro das duas naves, as equipes abrem as portas que ficam no centro das duas peças circulares que acoplaram-se, e pronto: uma nave já está em conexão direta com a outra.

Macho ou fêmea?

Em 1975, os Estados Unidos e a União Soviética desenvolveram em parceria o programa espacial Apollo-Soyuz. O objetivo era mostrar ao mundo que a guerra espacial era algo do passado. Para selar as pazes, acoplariam uma nave espacial norte-americana em uma soviética, na órbita da Terra.

Durante as pesquisas, surgiu um impasse que quase levou os dois países a esquentar a Guerra Fria: naquela época, o sistema de acoplamento era baseado em um encaixe simples, de macho e fêmea (a tomada elétrica da sua casa é um exemplo disso). Só que nenhuma das duas potências queria ser a "fêmea".

A solução para acabar com esse impasse típico da masculinidade frágil, foi preciso criar um novo sistema de acoplamento hermafrodita - com encaixes machos e fêmeas simultâneos. Este sistema é usado até hoje - só que atualmente, com mecanismos eletrônicos e mecânicos muito mais modernos.

(Ah, e a missão foi um sucesso: os astronautas soviéticos e norte-americanos trocaram presentes, abraços e sorrisos, em plena órbita da Terra.)

Fonte: Pretônio Noronha de Souza, diretor de Política Espacial e Investimentos Estratégicos da AEB (Agência Espacial Brasileira)