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Robô com 'empatia artificial' já vende carro nos EUA e quer ser terapeuta

Humano e robô se cumprimentam à frente de carros azuis - Getty Images/iStockphoto
Humano e robô se cumprimentam à frente de carros azuis Imagem: Getty Images/iStockphoto

Marcella Duarte

De Tilt, em São Paulo

19/06/2023 04h00Atualizada em 19/06/2023 16h50

Enquanto exploramos os potenciais das inteligências artificiais (IA) generativas, aquelas que como o ChatGPT são capazes de gerar conteúdo, um novo conceito acaba de surgir: a empatia artificial. Seu objetivo é, basicamente, tornar mais significativas e humanizadas nossas conversas com computadores.

Empatia não é só ficar triste se outra pessoa está triste, é querer ajudar. Se você teve um dia ruim, dizer 'eu sinto muito' é simpatia; falar 'como posso torná-lo melhor?' é empatia. Queremos que o sistema considere nossos sentimentos, estado mental, prioridades e valores. E ajude a resolver problemas relevantes
Scott Sandland, terapeuta e cofundador da Cyrano.ai, que desenvolveu um sistema com poder de entender as nuances do que dizemos e até convencer pessoas

Assim como tenta na terapia ajudar seus pacientes a aprimorar habilidades interpessoais, Sandland quis incorporar ao robô algumas das chamadas "soft skills", como inteligência emocional, escuta ativa e comunicação acolhedora e empática.

"A ideia é criar uma conexão verdadeira, para que a pessoa se sinta ouvida", explica Sandland, em entrevista a Tilt.

Vendedor de carros e futuro terapeuta

O modelo de empatia artificial da Cyrano.ai já atua em situações reais. Ele é auxiliar de revendedores de carros da Honda nos Estados Unidos. Ainda em fase de testes, não chega a substituir os vendedores humanos, mas trabalha dando a eles os melhores argumentos para cada negociação.

Como entende rapidamente a intenção de cada cliente, o robô faz 26% mais vendas e em 44% menos tempo do que um funcionário atuando sozinho, segundo a empresa. A ferramenta está sendo expandida para comércios de outros ramos, como imobiliárias.

sandland - Divulgação - Divulgação
Scott Sandland - empatia artificial
Imagem: Divulgação

"Dependendo do perfil do interessado, o robô sugere quais características do carro ressaltar, a melhor abordagem para negociar o valor, e outras dicas, por exemplo, dar um tempo para que a pessoa imagine sua família naquela casa", explica Sandland.

A ideia, contudo, não é usar as habilidades do robô apenas para vender. A grande meta de Sandland é construir um "terapeuta digital". Ele também não substituiria psicólogos reais— não por enquanto, ao menos—, mas realizaria tarefas complementares que ampliem o atendimento, como mediar grupos de apoio para jovens em situação de vulnerabilidade ou ajudar a controlar uma crise de ansiedade.

Com os bons resultados nas vendas, a fase de teste como terapeuta digital já começou, com 50 profissionais.

Ele conta que interagir com a empatia artificial é como conhecer uma pessoa. "Quando ficamos amigos de alguém, entendemos o valor daquela pessoa, os melhores conselhos a dar, as perguntas que podemos fazer. Sabemos, por exemplo, que tal pessoa se importa com fatos e números, que uma gosta de seguir regras e outra tem altos valores morais."

Algumas das possibilidades do terapeuta:

  • Otimizar o tempo de consulta: a IA pode recapitular para o psicólogo/psiquiatra quem é aquele paciente, o que está passando e as melhores abordagens (quando está triste fica assim, é isso que o motiva etc).
  • Mediar grupos de apoio: o terapeuta pode conectar pacientes com idades e/ou problemas em comum, para terem conversas mediadas que podem auxiliar na evolução do quadro. Por exemplo, jovens em situação de vulnerabilidade social ou pessoas e enlutadas.
  • Oferecer suporte remoto: a empatia artificial é uma boa ouvinte, e pode conversar com as pessoas quando não estão se sentindo bem, por exemplo, durante uma crise de ansiedade.

Futuro do trabalho

O ChatGPT se tornou em cerca de seis meses um fenômeno de popularidade e já transformou a maneira como as pessoas enxergam a IA.

"O ser humano gosta quando a interação com uma máquina vira uma conversa. Por isso o ChatGPT é tão popular. Mas o objetivo desse tipo de sistema é apenas ser polido. O que queremos é uma IA que preste atenção na gente e não apenas responda educadamente, mas que deseje que você melhore sua situação", acredita Sandland.

Dessa forma, diz, a empatia artificial não é exatamente um concorrente desses chatbots, mas sim uma tecnologia que pode um dia ser integrada a eles.

O momento em que vivemos, diz Sandland, é comparável a outras revoluções tecnológicas que impactaram profissões. O surgimento da calculadora (e depois do Excel), por exemplo, permitiu que contas matemáticas fossem feitas rapidamente e sem erros. "Contadores ainda podem calcular manualmente, mas assim conseguem fazer mais e melhor."

A ideia de que robôs inteligentes funcionariam como copilotos de humanos está no nome de empresas que incorporaram poderes do ChatGPT, da Open IA, em seus serviços, como os Copilot da Microsoft a do GitHub. Sandland quer levar essa "mãozinha" para momentos em que a interação humana é importante, mas não crucial.

Em alguns casos, as pessoas querem contato humano, sentir uma conexão, apertar a mão. Em outros, a automação total faz sentido, mas é um erro ter isso em tudo, só para reduzir custos. Precisamos pensar no impacto para as pessoas, não no mais barato. É um erro dar qualquer trabalho para um robô
Scott Sandland

No caso do terapeuta digital, ele poderia ajudar a reduzir as longas filas de espera por atendimento de saúde mental na rede pública e a amenizar o desgaste dos profissionais. "Seria mais uma ferramenta para ajudar os pacientes, e não para diagnóstico", ressalta.

Na saúde, a IA não está pronta para fazer tudo sozinha, ainda há um risco alto. Seria muito imprudente soltar um terapeuta para o mundo agora. Algum dia quero que exista, mas, para chegar lá, não queremos correr
Scott Sandland

Serviço:

Scott Sandland estará no Brasil esta semana, para participar da feira APIX 2023, nesta quinta-feira (22). Em sua palestra "The Intersection of APIs and LLMs: Customization unlocking new risks and possibilities", irá abordar os Large Language Models, sob a ótica da Empatia Artificial.