Como funcionará hub que criará internet e energia do futuro no Brasil

Levar internet para aldeias indígenas da região amazônica onde não há eletricidade. Criar uma rede de recarga para carros elétricos. Desenvolver um rádio com tecnologia e protocolos de comunicação nacionais para o Exército não depender de tecnologia estrangeira.

Essas são algumas das credenciais com que nasce a nova área do CPQD, um dos maiores centros de pesquisa e desenvolvimento do Brasil. Composto por dois laboratórios, um dedicado à conectividade e outro às energias renováveis, o Núcleo de Evolução Tecnológica foi inaugurado nesta segunda-feira (2) em Campinas, no interior de São Paulo.

Tudo que fazemos aqui é para levar tecnologia nacional para empresas brasileiras e suportar o estado, na figura de ministério e agências, a tomar melhores decisões, de uma forma agnóstica e neutras. Frederico Sigrist Nava, diretor de Tecnologias e Novos Produtos do CPQD

Ao custo de R$ 12 milhões do próprio CPQD, o núcleo foi criado para atender um aumento de 30% na demanda. Para dar conta do trabalho, o CPQD, que já tem cerca de mil colaboradores, contrata 15 profissionais qualificados por mês desde o começo do ano, diz Nava.

Nascido em 1976 para criar soluções de telecomunicação que permitissem à Telebras cumprir seu papel de promotora de políticas públicas, o CPQD se tornou privado em 1998. Desde então, atingiu um modelo de negócio para depender menos de verbas públicas. De tudo que entra no caixa, 70% vêm do desenvolvimento de produtos, consultorias e ensaios para empresas. Os outros 30% são de projetos de inovação, geralmente financiados por fundos públicos de fomento.

O novo núcleo foi criado para absorver a alta procura por projetos de duas grandes áreas do CPQD. A primeira é a conectividade, um desdobramento natural da tradicional atuação do centro. Para isso, o laboratório destinado a ela foi ampliado —e já há espaço sua capacidade ser duplicada— para se dedicar a:

  • Internet das Coisas;
  • Open RAN;
  • Futuras redes de telecomunicações e industriais;

Carro-chefe dessa estratégia, o Open Ran é apontado como peça central para a telecomunicação depender menos de fornecedores estrangeiros, como Huawei, Ericsson e Nokia. O segredo está na arquitetura de telecomunicação baseada na interoperabilidade entre equipamentos e programas, sejam eles fabricados pela mesma empresa ou não. A chave aqui é um padrão em código aberto que permite a comunicação entre hardware e software.

Sendo uma tecnologia amparada fortemente em software, ela abre uma possibilidade para países cuja matriz é fortemente influenciada neles, caso do Brasil Gustavo Correa Lima, gerente de Soluções de Conectividade do CPQD

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Essa mudança já está acontecendo no exterior. Nos Estados Unidos, está em operação a Dish Network, a maior rede Open Ran do mundo. Na Europa, a Telefónica já anunciou 50% de sua base será assim nos próximos anos. No Brasil, por outro lado, as operadoras estão inclinadas a abraçar essa nova modalidade de tecnologia, mas não o fazem por estarem amarradas a contratos de exclusividade com grandes fabricantes, conta Lima.

Gustavo Correa Lima, gerente de Soluções de Conectividade do CPQD, apresenta a tecnologia de Open Ran
Gustavo Correa Lima, gerente de Soluções de Conectividade do CPQD, apresenta a tecnologia de Open Ran Imagem: Helton Simões Gomes/UOL

Um exemplo do potencial funcional dessa inovação está no próprio CPQD, onde está em operação uma rede privativa (que opera apenas nos limites do centro) 5G Open Ran. Além disso, a instituição foi escolhida pelo Embrapii como o centro oficial do desenvolvimento dessa tecnologia no Brasil, ao lado da RNE (Rede Nacional de Ensino e Pesquisa).

O segundo campo de atuação a ter o laboratório ampliado é o das energias renováveis, que vai focar em:

  • hidrogênio verde;
  • controle eletrônicos de baterias;
  • desenvolvimento de baterias;

Área em que o CPQD vai estrear, o hidrogênio verde é um combustível renovável em que a União Europeia tem apostado muito. Em junho, o bloco sinalizou que iria investir 2 bilhões de euros (R$ 10,5 bilhões) em iniciativas brasileiras.

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Atualmente, a produção do hidrogênio como combustível é feita a partir de fontes de energia não renovável, como carvão mineral. Para diferenciar, a indústria passou a chamar o produto desse processo de "hidrogênio não verde". Já o hidrogênio verde é gerado da eletrólise da água (separação entre hidrogênio e oxigênio) com o uso de eletricidade gerada por fontes renováveis, como a eólica ou a solar.

Um projeto desta área já em andamento é uma rede de eletropostos da concessionária de eletricidade CPFL. Até o fim do ano, serão oito estações de recarga elétrica, posicionadas ao longo de rodovias do interior paulista. Para gerenciar tudo, está em fase de testes uma plataforma de gerenciamento, que será acessada via aplicativo. Ela indicará ao motorista a estação disponível mais próxima e reservará um horário para ele.

Um carregador exige muita energia. Quando faz isso, bagunça a rede Aristides Ferreira, gerente de Soluções em Energia do CPQD

A plataforma não é só o jeito de evitar essa sobrecarga mas também é um novo modelo de negócio, já que haverá cobranças diferentes. Ferreira explica que a demanda está reprimida. Exemplo disso é o posto instalado em um shopping de Campinas. Esperavam cerca de dez clientes. Aparecerem 200.

Este laboratório também criou, a pedido do governo federal, uma solução para conectar uma aldeia indígena sem eletricidade. O modem recebia sinal de satélite e, por meio do roteador, gerava sinal de Wi-Fi para a localidade. Um painel fotovoltáico, capaz de gerar energia solar, mantinha tudo funcionando. Agora, o conjunto chegará a escolas públicas de áreas remotas. Para facilitar a manutenção, o CPQD desenvolveu um módulo que, usando inteligência artificial, prevê quando será necessário o próximo reparo.

Para chegar a essa área remota indígena, levamos 10 dias de barco. Mas não precisa ir à Amazônia para ver que há muitas áreas descobertas. No interior de São Paulo, há produtores que estão descobertos. Frederico Nava

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Conjunto formado por modem de internet via satélite, roteador Wi-Fi e placa fotovoltaica usada para conectar escolas públicas remotas é apresentada por Frederico Sigrist Nava, diretor de Tecnologias e Novos Produtos do CPQD.
Conjunto formado por modem de internet via satélite, roteador Wi-Fi e placa fotovoltaica usada para conectar escolas públicas remotas é apresentada por Frederico Sigrist Nava, diretor de Tecnologias e Novos Produtos do CPQD. Imagem: Helton Simões Gomes/UOL

Alguns dos projetos são financiados com verba do Funttel (Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações), que há anos não tinha destinação por falta de projetos. O fato foi lembrado pelo ministro das comunicações, Juscelino Filho.

Fico satisfeito em ver que os recursos do Funttel investidos no CPQD retornam para o país (...) a fundação contribui diretamente para o alcance das políticas públicas de telecomunicação do país. Juscelino Filho

*o jornalista viajou a convite do CPQD

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