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Casal descobre no meio de rio amazônico que recebeu investimento do Google

Erika e Paulo Pelaez, fundadores da startup Lovel, em viagem de barco em rio amazônico Imagem: Arquivo Pessoal

De Tilt, em São Paulo

28/11/2023 14h00

Dentro de um pequeno barco, o casal de empreendedores Erika e Paulo Pelaez navegava pelo rio Guamá rumo à Ilha do Maracujá quando recebeu a notícia mais esperada. Diante da empolgação dos dois, proibidos de revelar o segredo, a família logo especulou: um bebê estaria a caminho. Nada disso.

Souberam ali, no município de Acará (PA), que a startup criada por eles receberá um investimento do Google for Startups. A empresa da dupla é uma das 10 escolhidas para a nova turma do Black Founders Fund, que fomenta o empreendedorismo negro no Brasil. Desde 2020, a Big Tech já fez aportes financeiros de R$ 16 milhões só nessa iniciativa, conta a Tilt André Barrence, diretor do Google for Startups para América Latina.

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A gente precisa ter, de fato, empresas fundadas por pessoas negras que construam produtos com tecnologia que vão transformar mercados
André Barrence, diretor do Google for Startups para América Latina

A startup do casal Pelaez é a Lovel. Cheia de símbolos, ela foi criada em 2020 para agilizar a contratação de profissionais de tecnologia. No nome, a empresa homenageia a pioneira da computação Ada Lovelace (1815-1852). No logotipo, o polvo é uma lembrança do suor do início.

No começo da nossa jornada empreendedora, eu e meu sócio tivemos que ter muitos braços para poder dar conta de tudo. O polvo é um ser adaptável, inteligente e que consegue fazer várias coisas ao mesmo tempo
Erika Pelaez, CEO da Lovel

Hoje com dez pessoas, a empresa une inteligência artificial com a figura do 'recrutador tech'. "A gente faz um match perfeito entre 'hard e soft skills'", diz a empreendedora.

Outro match perfeito -para além do enlace amoroso- ocorreu entre as habilidades da dupla. Vinda da área dos recursos humanos, ela chegou a ser coordenadora de gestão de pessoas da Sicredi no Ceará. Já ele traz a bagagem tecnológica, com passagem pela Arco Educação, que abriu capital na Nasdaq, e pelo Vale do Silício, na Califórnia.

Eu achava que no Brasil tinha um problema gigantesco de contratação técnica. Mas, nos Estados Unidos, eu tive uma dificuldade muito maior. Quando a gente listou na bolsa, o time foi de 28 para mais de 300 profissionais de tecnologia. Foi aí que nasceu a ideia. Porque isso aqui é uma baita dor de mercado
Paulo Pelaez, diretor de tecnologia da Lovel

André Berrance, diretor do Google for Startups para América Latina Imagem: Divulgação/Google

Fã de Larry Page, o empreendedor queria trabalhar no Google quando se mudou para os EUA. Ao voltar ao Brasil, trouxe na mala essa frustração. A realização do sonho, ainda que de forma indireta, chegou num momento inusitado, a bordo de um barquinho para seis pessoas. Como assinou um acordo de confidencialidade, precisou manter sigilo.

Quase chegando na ilha, a Erika dá um grito, 'Meu Deus, não acredito!'. Ela se levantou num pulou, começou a chorar. Aí eu me toquei o que era. A gente sacudiu o barco inteiro. Quase capota. E, como não podia falar, todo mundo acha que vou ser pai. Já fizeram até chá de bebê e deram nome: Teodoro, Ravi, Maria Luna, Ada
Paulo Pelaez

Com a nova turma, o Google for Startups chegou a 66 startups lideradas por empreendedores negros apoiadas pelo Black Founders Fund.

Além do investimento direto, o Google fornece acesso gratuito a algumas de suas plataformas, como Ads (para área de marketing), Cloud e as ferramentas de inteligência artificial. Tudo isso sem morder uma fatia acionária da startup.

No começo do programa, o Google até incentivava empresas cujas ideias não tinham saído do papel. Com o tempo, a empresa alterou a rota e passou a direcionar esforços para aquelas que já tinham algum produto inicial, ou seja, validaram a ideia e o modelo de negócio junto a usuários ou a clientes, conta Barrence.

É nesse estágio de vida da startup, explica o diretor, que a intervenção do Google é mais valiosa. Além de intensificar o desenvolvimento do produto, vira uma chancela aos olhos do mercado. Isso atrai novos investidores e clientes.

"Para você ter uma ideia, a gente investiu até o momento R$ 16 milhões nessas empresas, e elas levantaram dez vezes mais capital em rodadas subsequentes", afirma.

Ainda assim, diz o diretor, o objetivo do programa não é necessariamente fomentar o surgimento de startups com avaliação na casa do bilhão, as chamadas unicórnio.

Ter um unicórnio é bacana, mas o incrível é ter dezenas de empresas muito bem-sucedidas que geraram valor e se tornaram referências, e seus fundadores e fundadoras viraram histórias que inspiram
André Barrence, diretor do Google for Startups para América Latina

Algumas das startups apoiadas já deixaram o mercado, outra delas foram vendidas, algumas até viraram parceiras do Google. É o caso da naPorta.

Surgida em 2021, ela começou entregando produtos onde empresas de delivery ou de encomendas não iam. Ao ver que a solução poderia ser aprimorada, combinou uma série de tecnologias para dar uma espécie de CEP digital às pessoas que moram nessas comunidades. O Google fez o investimento no ano passado. Agora, a naPorta contempla 10 mil endereços em 20 favelas.

O endereço abrange muita coisa e hoje em dia é o segundo número mais importante para um cidadão
Sanderson Pajeú, CEO da naPorta

Uma das tecnologias usadas é o Plus Codes, que atribui um endereço digital no Google Maps. Com apoio da Gerando Falcões, presente em 6 mil favelas no Brasil, a naPorta roda as comunidades para levar ao mundo digital as escadarias, becos, vias e vielas do mundo real.

Outro passo da empresa foi fazer parcerias para o CEP digital ser aceito por serviços de saúde, de educação e bancário. A prefeitura de Ferraz de Vasconcelos (SP) já aceita o número para mães e pais poderem cadastrar crianças na escola ou no posto de saúde. Já a cidade de Santo André (SP) editou um decreto para permitir que o endereço virtual seja usado para abrir um MEI.

Segundo Barrence, é esse o diferencial dos empreendedores do BFF: sonhar com os pés firmes no chão e sem tirar os olhos de suas origens.

Por conta das próprias experiências, eles vêm e identificam problemas que outros fundadores não notaram. Eu falo que é um pragmatismo arrojado. Não é pensar pequeno, mas pensar de maneira muito concreta a solução para o negócio parar de pé. Não basta ter um produto que resolve um problema, alguém vai ter de pagar por ele
André Barrence, diretor do Google for Startups para América Latina

As 10 startups que receberam investimento do Google:

  • Conecta Tech: software que integra sistemas de gestão, CRM e marketplace às vendas online;
  • Fitinsur: serviço vendas e gestão de seguros, com a possibilidade de gerar de experiências personalizadas;
  • Infleet: plataforma para gerir frotas ao controlar das rotas à manutenção e o abastecimento;
  • Intreguei: startup de coleta e entrega de produtos, que conecta varejistas e marketplaces a rede de parceiros logísticos;
  • Logstore: software para integrar varejo físico e o digital;
  • Lovel: solução especializada na contratação de profissionais de tecnologia;
  • Metha Energia: plataforma que conecta consumidores residenciais a usinas de energia renováveis;
  • Shooju: serviço de gestão personalizada dos dados de empresas;
  • Turn2C: fornecedora de consórcios personalizados para auxiliar clientes a adquirir bens e serviços;
  • Zentek: startup que constrói soluções para aumentar a retenção e monetização da base de clientes de uma emrpesa.

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