RIP Twitter, Google virando réu: IA foi treta menor para Big Techs em 2023
As gigantes da tecnologia começaram 2023 com ondas de demissões, mas logo tiveram de entrar na corrida pela maior inovação das últimas décadas: a inteligência artificial (IA) generativa após o ChatGPT, um robô feito pela até então desconhecida OpenAI e capaz de criar conteúdo como um humano, ganhar os holofotes.
Apesar de lançarem novos produtos interessantes com IA, as Big Techs ganharam o noticiário mesmo quando as polêmicas correram soltas. Estão entre as tretas do ano problemas com a Justiça devido a práticas monopolistas, trapalhadas nos negócios, decisões controversas e grandes arrependimentos.
Ainda assim, elas continuam as empresas mais valiosas do mundo. Continuam dominando a Bolsa dos Estados Unidos, o que deve seguir acontecendo em 2024. O futuro, porém, não parece mais tão magnífico.
Microsoft: com IA e 'nuvem', um acerto
Foi a Big Tech que menos se envolveu em confusões. Os perrengues decorrem de questões relacionadas à OpenAI, com a qual a Microsoft possui um acordo comercial, e seu CEO, Sam Altman, que chegou a ser demitido, assumiu um cargo na Microsoft e depois foi readmitido. Tudo isso revelou a tensão no berço da IA generativa. A última do ano foi o processo aberto pelo jornal "New York Times", que reivindica pagamento pelos direitos autorais de seu conteúdo usado para treinar o ChatGPT. 2024 promete.
Além de rapidamente turbinar o buscador Bing com o ChatGPT, a empresa de Bill Gates inovou o pacote Office: o chatbot com inteligência artificial Copilot, que facilita as tarefas diárias no Excel, PowerPoint e outros.
E o mercado acreditou: impulsionada pela IA e pelo negócio da Azure Cloud (que cresceu junto com os sistemas robustos que rodam em nuvem), a empresa atingiu seu maior valor de mercado, chegando a cerca de US$ 2,8 trilhões. E ainda expandiu sua área de games, com a grande aquisição da Activision Blizzard, incorporada ao Xbox.
A empresa entra em 2024 como um canhão poderosíssimo, aproveitando tudo que a inteligência artificial tem a oferecer. João Luiz Piccioni Junior, CIO da fintech Empiricus
Google: o contra-ataque --e o processo de bilhões
À medida que a Microsoft inovou e avançou sobre um espaço tradicionalmente dominado pelo Google, a dona do buscador na internet mais usado no mundo se mexeu.
O Bard chegou um pouco atrasado, mas ficou mais avançado e preciso. Ainda mais com o novo modelo multimodal Gemini Pro. Treinado com áudio, imagem e texto ao mesmo tempo, ele resolve até exercício de física anotado em folha de papel. O "contra-ataque" incluiu ainda um arsenal de IA no Google Fotos, Gmail, Meets e Slides.
No entanto, o futuro da empresa pode ser decidido bem longe do mundo da tecnologia. O Google enfrenta o maior processo judicial contra monopólios nos EUA desde o caso Microsoft nos anos 1990. Ele é acusado de competição ilegal por pagar bilhões a empresas como Apple e Samsung para fazerem do Google o motor de busca padrão dos smartphones que fabricam.
A empresa perdeu ainda uma longa briga judicial contra a Epic Games. A criadora do game Fortnite argumentava que o Google faz de sua loja de aplicativos um monopólio. Além de pagar US$ 700 milhões, o Google precisará mudar a Play Store para absorver métodos de pagamentos alternativos e facilitar a instalação de apps de terceiros.
Apple: da 'iPhonedependência' ao Vision Pro
Ainda que tenha alcançado em 2023 a marca histórica de US$ 3 trilhões, o que a manteve no posto de empresa mais valiosa do mundo, a Apple luta para se reinventar e emplacar novos produtos de sucesso. A venda de Macs e iPads cai drasticamente ano a ano. Até o iPhone, que sempre vende mais ou menos dentro do esperado, já não é suficiente para manter o ritmo de crescimento em um mercado tão acirrado.
A empresa ousou pouco no iPhone 15, mas apresentou um produto totalmente novo: o Vision Pro, um óculos de realidade mista, pensado para ser um "computador vestível". Apesar do burburinho, a dúvida é se ele será relevância. O tamanho não ajuda. Ele pode chegar ao mercado já em fevereiro de 2024, por US$ 3.500 (R$ 17.000).
Surgidos nos últimos meses, três grandes problemas devem ter desdobramentos no ano que vem:
- as vendas dos mais avançados modelos de Apple Watch, Series 9 e Ultra 2, foram interrompidas após a Masimo, empresa de tecnologia médica, acusar a Apple de roubar o sistema de oxímetro de pulso;
- varejistas processaram por monopólio após a Apple fechar acordo com Visa e Mastercard para dominar as transações por aproximação com o Apple Pay;
- a parceria para o cartão Apple Card com o banco Goldman Sachs está com os dias contados.
A Apple voltou a ser mais dependente do iPhone, como era anos atrás. O desafio agora é diminuir essa dependência do hardware e apostar mais em serviços, como iCloud, aplicativos da AppStore e assinaturas de streaming Junior Borneli, fundador da escola de inovação Startse
Meta: até logo, Metaverso; oi, Ray-Ban com IA
Após mais de 20 mil demissões e ajustes financeiros nos primeiros meses, Mark Zuckerberg disse que 2023 seria o "ano da eficiência" para a Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp. A empresa até acertou o rumo — não sem decisões controversas.
Uma das ações imediatas foi apostar mais em inteligência artificial. O modelo de IA generativa Llama 2 provou ser robusto e, por ser de código aberto, pode ser usado por desenvolvedores de graça para acelerar a inovação. O Metaverso, fixação de Zuckerberg, virou projeto de longo prazo. Nessa linha, vieram o headset de realidade mista Meta Quest 3 e uma linha de óculos inteligentes em parceria com a Ray-Ban.
Em meio a tudo isso, deu tempo de a Meta criar uma rede social para desfilar sobre a ruína do Twitter — o Threads foi sucesso de inscrições, mas não empolgou — e ser alvo de um processo bastante sério. A empresa é acusada por diversos estados norte-americanos de impulsionar a crise de saúde mental de jovens para passarem mais tempo em suas plataformas.
Foi a empresa que mais surpreendeu, pois teve um 2022 muito ruim. O maior desafio da empresa é sua dependência da receita de publicidade: 98% de todo o dinheiro da Meta vem do negócio de anúncios. Isso deve tirar um pouco do sono de Zuckerberg toda noite Junior Borneli
X: megalomania de Musk e a morte do passarinho
Mais que mudar de nome e logo, a X (ex-Twitter) passou por diversas transformações, muitas movidas por interesses pessoais do novo "dono da bola". O bilionário Elon Musk comprou sua rede social favorita à força, em outubro do ano passado, por US$ 44 bilhões (R$ 220 bi); hoje, estima-se que ela valha menos da metade disso.
Após este investimento maluco, Musk tem frustrado fãs do Twitter por alterar as regras do jogo:
- Impôs um limite de leitura por dia - de mil tweets para contas comuns
- Venda do selo de verificação, que custa até R$ 84 ao mês pelo programa X Premium (ex- Twitter Blue).
- Cobrança de US$ 1 ao ano de toda pessoa que quiser postar ou interagir - sem o pagamento, é possível apenas ler.
Grandes anunciantes estão abandonando a plataforma, devido à falta de moderação e incentivo ao discurso de ódio — o próprio Musk endossou um post antissemita. Com isso, morre não só o passarinho, mas parece que o X voa cada vez mais próximo do chão.
O que esperar do futuro?
O ano para as Big Techs foi de recuperar negócios, já que todas se viram inseridas na corrida pela inteligência artificial e precisaram se reinventar, enquanto enxugavam suas estruturas.
Apesar das polêmicas, processos e desvios de rota, o mercado está respondendo bem às novidades. "Acho que todas as big techs vão continuar se valorizando. São boas empresas que geram fluxo de caixa, entregam resultado para os acionistas, e são as mais investidas do mundo. Se não houver nenhum evento extremo, seguirão em alta", afirma João Luiz Piccioni Junior, CIO da fintech Empiricus.
O esforço evidente foi para criar aplicações realmente úteis. "Elas tiveram de se mexer em uma velocidade maior para manter a relevância e acabaram pisando em terrenos em que antes tomavam mais cuidado", explica Borneli.
E, em 2024, isso deve ocorrer com cada vez mais frequência.
Quando todo mundo está ganhando dinheiro, tá tranquilo. Mas quando um entra no terreno do outro, começa a ter confusão. E acho que no ano que vem a IA vai fazer um beliscar o prato do outro o tempo todo Junior Borneli
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