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Criado no fim do século 19, por que carro elétrico está 'vingando' agora?

Gurgel Itaipu foi um carro elétrico produzido pela empresa nacional Imagem: Reprodução

De Tilt, em São Paulo

30/01/2024 04h00

Os primeiros carros elétricos surgiram por volta de 1880, mas a produção em série de veículos 100% elétricos é algo relativamente novo, com modelos comerciais disponibilizados em massa em meados de 2010.

O que aconteceu neste hiato de tempo?

Imagem de 1880 mostra carro elétrico idealizado pelo engenheiro britânico Thomas Parker Imagem: Reprodução

Primeiro, houve um processo de "superação" tecnológica dos carros a combustão em relação aos elétricos.

Depois, aumentou a consciência sobre a poluição e a noção de que combustíveis fósseis são finitos. Isso gerou a busca por alternativas, que levaram a desenvolvimentos para a "volta" do carro elétrico, justamente com a tecnologia que ajudou a popularizar os eletrônicos portáteis modernos: a bateria de íon de lítio.

Sucesso do carro a combustão

O carro a combustão saiu na frente, pois no início do século 20 o combustível era barato e seu uso era mais eficiente. Para movimentar um carro de 1.000 kg movido a bateria, você deveria ter uma bateria de 2.500 kg, exemplifica o professor de engenharia elétrica da UFRJ Edson Watanabe.

No início, os carros a combustão precisavam de manivela para a partida, mas com o tempo, a bateria de chumbo passou a ser usada. Ela servia para ativar o motor de arranque e ajudar na locomoção do carro.

O processo de fabricação em série também foi rapidamente implementado. Isso permitiu a massificação, além de uma rede extensa de abastecimento.

Apesar do sucesso dos carros a combustão, houve várias tentativas de carros elétricos. No Brasil, por exemplo, a Gurgel chegou a produzir modelos na década de 1970, mas posteriormente se concentrou em veículos a combustão.

À procura de alternativas

Em meados de 1970 começou um movimento contrário. A indústria passou a ter a noção de que o petróleo é um recurso não renovável e poluente.

A crise do petróleo também causou um aumento no preço do combustível fóssil em quase todo o mundo. Como resultado, o perfil de veículos foi mudando. Dos carros beberrões (os chamados "muscle cars" dos Estados Unidos), a indústria passou a fazer carros compactos e econômicos.

A situação foi tão drástica que até a Exxon, gigante do petróleo dos Estados Unidos, passou a investir em alternativas de energia. Na época, a companhia contratou especialistas para a construção de baterias mais eficientes para "alimentarem" carros no futuro.

Bateria de íon de lítio deu impulso

A bateria de íons de lítio foi inventada na década de 1970. A patente foi assinada por John B. Goodenough e M. Stanley Whittingham. Apesar disso, a massificação só ocorreu no início da década de 1990, com um projeto do engenheiro da Sony Akira Yoshino. Na época, a empresa passou a comercializar uma pilha recarregável para eletrônicos portáteis, como Discman e Walkman.

Posteriormente, a bateria de íon de lítio começou a aparecer em celulares, laptops e tablets. Em 2019, os três pioneiros receberam o prêmio Nobel de Química por criarem a tecnologia "fundacional para celulares, laptops e eletrônicos sem fio", além de "tornar possível um mundo sem combustível fóssil" e o "armazenamento de energia para fontes renováveis de energia".

Dois fatores fazem a bateria de íon de lítio ser tão especial: tem alta densidade de energia (ela aguenta cinco vezes mais carga que uma bateria de chumbo de mesmo tamanho) e a resistência (ela demora para se deteriorar).

As experiências de carros com bateria de íon de lítio foram ocorrendo aos poucos. O primeiro veículo a ter produção massificada foi o Toyota Prius que, na verdade, era um híbrido (tinha bateria e tanque de combustível), em 1997. No ano anterior, 1996, a GM lançou o EV-1, um veículo que foi comercializado em apenas alguns locais dos EUA.

Em 2006, surge a Tesla com a proposta de fazer um carro esportivo 100% elétrico e de luxo. O modelo Roadster, lançado em 2008, fazia de 0 a 100 km/h em dois segundos —curiosidade: Elon Musk mandou um desse para o espaço.

Elon Musk apresenta o Tesla Roadster Imagem: Tesla/Handout via Reuters

Uma junção de fatores auxiliou no sucesso atual do carro elétrico. "Novas tecnologias empregadas na construção de motores elétricos mais eficientes, semicondutores para construção de elementos de potência de gerenciamento, além de materiais nobres que permitiram criar baterias capazes de acumular grandes quantidades de energia", explica o professor de engenharia elétrica da FEI (Fundação Educacional Inaciana) e do IMT (Instituto Mauá de Tecnologia) Fabio Delatore.

Fabricantes japonesas, americanas e europeias saíram na frente no mercado automobilístico, e a China resolveu inserir o carro elétrico em sua estratégia nacional em meados de 2000. O objetivo da China era reduzir a poluição, a dependência de combustível fóssil e tentar liderar esta indústria, já que nos carros a combustão, os países previamente citados são dominantes.

Atualmente, o mercado chinês é o maior do mundo com 4,6 milhões de unidades vendidas em 2022. Por essa razão, fabricantes asiáticas —como BYD, GWM e Chery— estão de olho no mercado brasileiro, para ter um papel semelhante ao que Ford, Volkswagen e Fiat tiveram no passado. A BYD, inclusive, assumiu a fábrica da Ford em Camaçari, na Bahia, com a saída da montadora do mercado brasileiro.

Carro elétrico GWM Ora 03 custa a partir de R$ 150 mil Imagem: Divulgação

Praticamente, todas as grandes fabricantes contam com alguma opção 100% elétrica ou híbrida. Resta saber se os preços vão cair (um carro elétrico de entrada no Brasil custa pelo menos R$ 100 mil) e se o carregamento rápido vai se espalhar para além de grandes centros urbanos (enquanto encher o tanque de um carro a gasolina leva minutos, carregar completamente um carro pode levar horas).

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