Não humanos, influenciadores virtuais viram fenômeno e faturam com publis
Abinoan Santiago
Colaboração para Tilt, em Florianópolis
13/05/2024 04h05Atualizada em 14/05/2024 02h16
Eles ditam tendências de consumo, possuem milhões de seguidores nas redes sociais e já são contratados para divulgar marcas. Algo, contudo, os diferencia dos costumeiros influencers digitais que vemos a cada "arrasta para cima": eles não são humanos. Os influenciadores virtuais — personagens fictícios — têm ganhado cada vez mais o espaço dos humanos nas publis, sendo o Brasil um lugar de "cases" de sucesso mundial.
Exemplo disso é a Lu, do Magalu, influenciadora virtual mais popular no mundo, segundo dados da VirtualHumans.org, site estadunidense especializado no tema. Criada em 2003, a Lu estreou no mundo virtual em 2009. Ela tem mais de 30 milhões de seguidores, somando os fãs no Instagram, YouTube, Facebook e TikTok, com diversos posts patrocinados nas redes sociais.
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Sucesso semelhante, porém mais recente, vive o CB, influenciador virtual desde 2020 da Casas Bahia, concorrente varejista do Magalu. Ele possui 10 milhões de seguidores em suas plataformas.
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No top 10 dos mais populares no mundo, outra brasileira, a Any Malu, do Cartoon Network, também figura no ranking.
Para Nick Baklanov, especialista em marketing na HypeAuditor, plataforma internacional de análise de influência digital, o surgimento de influenciadores virtuais foi uma oportunidade recente enxergada por grandes marcas para contar histórias na internet com custo menor a longo prazo, dependendo da campanha publicitária.
Baklanov, contudo, pondera que personagens fictícios não são novidades. Eles sempre existiram. O que acontece atualmente, na verdade, é o uso deles para agregar valor no mundo virtual, para além da TV e da mídia impressa. É o caso do CB. O influenciador virtual é uma remodelagem do Baianinho, icônico mascote que apareceu em publicidades da Casas Bahia na TV por mais de 40 anos.
Isso é uma tendência. Os personagens virtuais conheceram as redes sociais e depois surgiram os influenciadores virtuais, uma versão 2.0 disso. Personagens fictícios já existiam antes da internet, mas graças às redes sociais eles têm uma nova plataforma para contar suas histórias. A mídia gostou e vários sites de notícias falam com entusiasmo sobre o surgimento de cada vez mais influenciadores virtuais no mundo.
Nick Baklanov
Como surgem os influenciadores virtuais?
De acordo com a HypeAuditor, existem quatro formas de criação de influenciadores virtuais.
Personagens CGI (sigla em inglês para "imagens geradas por computador"): criados por softwares de computador. Eles variam desde desenhos a animações.
Modelos 3D: são mais sofisticados com modelagem em 3D, podendo ser mais realistas do que os CGI.
Deepfakes: criados por IA (Inteligência artificial). São gerados por manipulação ou falsificação de vídeos a partir de criação de personagens realistas, mimetizando celebridades ou figuras públicas. Ou seja, é possível criar um influenciador virtual do Pelé, por exemplo.
Híbridos: são os avatares que combinam elementos virtuais e da vida real.
O modelo a ser usado vai depender do objetivo da empresa e do orçamento previsto para o serviço. Baklanov afirma que, "à medida que a tecnologia avança, a produção de personagens CGI de alta qualidade torna-se mais econômica", embora o custo ainda seja considerado alto.
No caso do CB, por exemplo, a animação é 3D e ganha forma com atores. Eles usam a ferramenta de captura de movimento (motion capture). Nela, um ator utiliza uma roupa especial com marcadores ou sensores e interpreta o personagem, gerando a animação no computador.
A tecnologia usada na criação da Lu não foi revelada pelo Magalu a Tilt.
O investimento, por outro lado, vale a pena devido a sua capacidade de ser um influenciador com possibilidade de agregar mais serviços do que um humano poderia oferecer.
"A capacidade de imbuir um influenciador virtual com uma personalidade distinta, aliada a um chatbot avançado com uma extensa base de dados sobre a marca e os seus produtos, síntese de texto para voz, tradução multilíngue e modulação de voz, apresenta novas oportunidades e vantagens", diz Baklanov.
De acordo com Cássio Braga, diretor criativo da Miagui, produtora que remodelou o Baianinho para o CB, a criação de um influenciador virtual varia entre R$ 15 mil a R$ 400 mil, no Brasil. O valor oscila de acordo com a complexidade e tecnologia empregada, isso sem contar a publicidade para colocar a campanha no ar a fim de tornar-se relevante.
[O influenciador virtual] não vai ser relevante de uma hora para outra, assim como tu não te tornas um influenciador humano do dia para noite. A relevância acontece baseada naquilo que tu colocas de esforço, de energia e no reconhecimento das pessoas nesse trabalho.
Cássio Braga
"Outras marcas nos procuram para um projeto como o do CB, só que não entendem o nível de comprometimento e de investimento que requer para conseguir chegar onde o personagem chegou. É um trabalho de anos com muito investimento para poder ter a relevância que o CB tem hoje", acrescenta Braga.
Virtual ou humano? Qual influenciador dá mais retorno
Um relatório da HypeAuditor aponta quatro vantagens no uso de influenciadores virtuais:
Personalização: eles se adequam esteticamente à necessidade da campanha sem que isso seja uma condicionante como seria em eventuais contratos com influenciadores humanos.
Econômico: após investimento a longo prazo para tornar o influenciador relevante, o custo-benefício supera a contratação de um influenciador humano.
Consistência: os influenciadores virtuais podem se manter com a mesma aparência etária por anos e sem o risco de desistência ou quebra de regularidade em campanhas por questões pessoais, caso fossem humanos.
Total controle: com os influenciadores virtuais, as empresas têm tudo em suas mãos: aparência, frequência e roteiro da peça — sem eventual interferência ou ajuste para se encaixar ao influenciador humano.
Por outro lado, existem desvantagens. Uma delas é o custo em casos de campanhas pontuais. Para uma única publicidade, o influenciador humano ainda sai mais em conta.
Se você tem uma marca sem recurso para investir a médio e longo prazo, eu acho que é muito mais fácil e barato contratar um influenciador humano. Você pode contratar um influenciador que já tem relevância naquele mercado. Um personagem virtual não é uma coisa que você cria e as pessoas possuem logo empatia.
Cássio Braga
A falta de empatia imediata com o público também é apontada por Nick Baklanov, da HaypeAuditor.
"A única desvantagem pode ser que o público não entenda por que a marca usa um influenciador virtual. Isso não deve ser um capricho dos profissionais de marketing de marcas que seguem tendências. Deve haver uma compreensão clara da necessidade de um mascote ou da cooperação com um influenciador virtual", diz.
Influência é a capacidade de impactar o comportamento de alguém. Acredito que os influenciadores humanos exercem maior influência [imediata] do que os influenciadores virtuais porque as pessoas ainda acham um desafio se relacionar com personagens virtuais.
Nick Baklanov
Da despesa a monetização: influenciadores virtuais já faturam
A longo prazo, a aposta do investimento pode ganhar um caminho inverso. De despesa, o influenciador virtual poderá ser uma fonte de receita às empresas.
Outras marcas passam a procurar as mascotes virtuais para surfar na audiência e engajamento proporcionados pela relevância deles nas redes sociais.
Não é incomum, por exemplo, ver a Lu e o CB fazerem publicidades em suas plataformas. Tanto o Magalu quanto a Casas Bahia confirmaram a Tilt que as campanhas que usam a imagem dos seus respectivos influenciadores virtuais já bancam o custo da produção tecnológica por trás.
"A gente não abre os valores, mas além do Magalu, a Lu faz publicidades remuneradas para outras marcas — desde que tenham sinergia com o Magalu e não fujam dos valores compartilhados pela companhia. Podemos dizer que com isso ela já consegue pagar os seus próprios lookinhos", diz Aline Izo, gerente de redes sociais do Magalu.
"Ele faz muito [post patrocinado], é o queridinho das marcas aqui para a gente. O CB, hoje, para a gente, além de ser essa 'brand persona', é um instrumento de monetização. Tem toda uma tecnologia, mas ela totalmente se paga e gera receita para a gente", afirma Amanda Assis, gerente executiva de marketing da Casas Bahia.
Situação semelhante acontece com Dilson, influenciador virtual da produtora Miagui. Ele tem mais de 40 mil seguidores somente no TikTok. No entanto, ele é independente, ou seja, não está atrelado a nenhuma marca. Em seu perfil há posts de jogos eletrônicos de aplicativos a supermercados.
"O Dilson tem um pouco das nossas convicções aprendidas ao longo dos anos, trabalhando com outros clientes e com outras marcas, mas agora de uma forma independente, onde a gente pode correr mais riscos", afirma Cássio Braga.
E não é apenas de publis que os influenciadores virtuais vivem. As varejistas ouvidas por Tilt apontam retorno em vendas, embora os números não sejam revelados.
"A Lu é uma marca. Ela é o Magalu. Então todo o seu storytelling tem como objetivo divulgar e construir assets do Magalu, mesmo que seja com publicidade. Ela tem o seu próprio botão de compra", diz Aline Izo, do Magalu
Amanda Assis, da Casas Bahia, complementa que, para além das vendas, o engajamento é um retorno.
"A gente tem hoje estratégias voltadas para promoções, para vendas e para marca, então [o retorno] depende muito do indicador que a gente vai olhar. Se é um engajamento, se é venda pura. Eu acredito nesse mix mesmo. O papel do engajamento é muito forte, então acaba vendendo muito também", afirma.
Um post de um influenciador virtual tem potencial três vezes maior do que de um influenciador humano, segundo a HypeAuditor.